Droga. Canábis está cada vez mais potente e sobe consumo de crack

É chamada a cocaína dos pobres. Relatório europeu sinaliza tendência preocupante, reportada em Portugal, Bélgica, Irlanda e Espanha.

A pandemia perturbou tratamentos relacionados com a dependência de droga mas, do lado da oferta, os dados europeus mostram que “o mercado de droga tem sido extraordinariamente resiliente”. A conclusão, que dificilmente se ouvirá por esta altura em relação a outros setores, é do Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência (EMCDDA), que ontem divulgou o relatório anual sobre tendências e evoluções nesta área. Como nota de preocupação, o aumento de consumo de crack, a chamada cocaína dos pobres.

A maior disponibilidade desta droga, cinco a dez vezes mais potente do que a cocaína em pó e habitualmente fumada, já tinha sido reportada em abril e foi declarada ao observatório por Portugal, Bélgica, Irlanda, Espanha e França, não sendo referidos números. Nota-se também um aumento das vendas de ansiolíticos e cocaína em quantidades mais pequenas, com uma mudança nos consumos nos períodos de maior confinamento, mas de pouca dura. “Em termos gerais, parece ter havido um menor interesse dos consumidores pelas drogas geralmente associadas a eventos recreativos, como a MDMA, e um maior interesse pelas drogas associadas ao consumo doméstico”, lê-se no relatório. “A análise de amostras de águas residuais, embora disponíveis apenas em algumas cidades, é aqui informativa. Os dados disponíveis sugerem que os níveis de consumo da maioria das drogas parecem, de um modo geral, ter sido mais baixos durante os confinamentos iniciais, mas parecem ter recuperado em seguida, quando o confinamento foi levantado”.

traficantes fintam restrições Segundo o organismo, observa-se uma diversificação das rotas de tráfico, com mais canábis e heroína a serem contrabandeadas por mar, “para escapar ao encerramento das fronteiras terrestres, conduzindo a grandes apreensões nos portos europeus”. O observatório admite que houve algumas alterações dos locais de partida de droga da América Latina para a Europa, mas “não foi evidente qualquer diminuição da oferta”. Além disso, serviram-se de aplicações de mensagens encriptadas, telefone e serviços de entregas para chegar aos clientes.

Aumentou, por outro lado, o cultivo doméstico de canábis – que agora em Portugal BE e IL pretendem legalizar. O diretor do observatório, Alexis Goosdee, admite no relatório que será vital fornecer informações sobre canábis aos decisores europeus, mas não se pronuncia sobre a questão da legalização. Há contudo algumas notas sobre a canábis no documento: continua a ser a droga mais experimentada na Europa e chega ao mercado cada vez mais forte. “A resina de canábis vendida na Europa é agora mais potente do que anteriormente, com um teor médio de THC entre 20 e 28%, quase o dobro do teor da canábis herbácea. Os produtos de canábis disponíveis na Europa incluem atualmente produtos com elevado teor de THC e novas formas de canábis no mercado ilícito, bem como uma gama de produtos que contêm extratos de canábis, mas com baixos níveis de THC, vendidos comercialmente”, adverte o observatório. Também a pureza da cocaína tem vindo a aumentar na última década e o número de pessoas que iniciam tratamento pela primeira vez aumentou nos últimos 5 anos. “Estes e outros indicadores indicam um potencial aumento dos problemas relacionados com a cocaína”, alerta o observatório.

Estima-se que cerca de 83 milhões, ou 28,9%, dos adultos (15-64 anos) na União Europeia tenham consumido drogas ilícitas pelo menos uma vez ao longo da vida. Portugal tem prevalências abaixo da média, mas estima-se que 1,2% da população adulta já tenha experimentado cocaína e 0,3% dos jovens entre os 15 e 34 tenham tido consumos no último ano analisado (2016). Um em cada dez adultos portugueses (11%) já experimentou MDMA, a mesma percentagem apurada em relação à canábis, com 8% dos adultos jovens a reportar consumo no último ano, 13% no caso de adolescentes em idade escolar.