O Alves dos Reis do Estado Novo

Por João Cerqueira Escritor Num recente encontro de forças reaccionárias e saudosistas, um obscuro historiador chamado Nuno Palma, com o banal currículo de professor associado no Departamento de Economia da Universidade de Manchester, investigador do ICS da Universidade de Lisboa, investigador afiliado do CEPR e outras tretas, ousou afirmar que o Estado Novo aproximou o…

Por João Cerqueira

Escritor

Num recente encontro de forças reaccionárias e saudosistas, um obscuro historiador chamado Nuno Palma, com o banal currículo de professor associado no Departamento de Economia da Universidade de Manchester, investigador do ICS da Universidade de Lisboa, investigador afiliado do CEPR e outras tretas, ousou afirmar que o Estado Novo aproximou o país da Europa, reduziu o analfabetismo e a mortalidade infantil. Em suma, após imensos prodígios o Estado Novo desenvolveu Portugal. É certo que também disse que o Estado Novo era uma ditadura, mas foi para disfarçar os seus reais intentos de falsificação e branqueamento da História.

Se há quem negue o Holocausto nazi, também há quem invente coisas. Uns inventam genocídios na União Soviética, na China, na Coreia do Norte e noutros países comunistas, o senhor Palma inventa um paraíso durante o Estado Novo. Para lá da falta de ética, é uma questão de mau gosto.

Como seria de esperar, vários democratas, entre os quais genuínos historiadores, reagiram contra esta despudorada apologia do Fascismo e deram uma lição ao senhor Palma. Sem grande esforço, mas com imenso donaire, terçaram armas contra o seu chorrilho de mentiras, desmentiram-no, envergonharam-no e, por fim, calaram-no. Felizmente, a nossa robusta democracia possui guardiões que zelam pela verdade histórica impedindo que o povo seja confundido; e sempre que aparece algum senhor Palma é imediatamente desfeiteado. Tratou-se de um gesto nobre, mas poderiam até nem se dignar responder-lhe pois está na internet e nas redes sociais que o Estado Novo só trouxe desgraça a Portugal. Ou seja, a verdade à distância de um clique.

No entanto, o acto do senhor Palma revela uma possibilidade sinistra que deveria preocupar todos os democratas, antifascistas, defensores da verdade, pessoas de bem e bons chefes de família.

Imagine-se que daqui a 50 anos aparece outro Alves dos Reis da História e, num novo encontro de forças reaccionárias, começa a debitar aleivosias do seguinte calibre:

«entre 2005 e 2011, o governo socialista de José Sócrates, ao contrário do Estado Novo, empobreceu e atrasou Portugal num processo de degradação política, financeira e moral que culminou numa bancarrota, um pedido de auxílio internacional, a vinda de uma Troika que ditou condições humilhantes ao país para lhe emprestar dinheiro e, três anos depois, a prisão desse ex-primeiro ministro.»

Ora, como se pode ver na internet e nas redes sociais não foi bem assim que as coisas se passaram. A verdade histórica impõe que se diga que houve um tal Passos Coelho que planeou tudo isto, que o seu partido forçou a vinda da Troika, e que magistrados, polícias reaccionários e antigos Pides prenderam injustamente o Dr. Sócrates.

Como se vê, estes Alves dos Reis são muito perigosos. A psiquiatria considera que estas pessoas padecem de um transtorno delirante que os leva a acreditar em algo que não existe e a distorcer a realidade. No caso do senhor Palma, parece tratar-se de um delírio de tipo erotomaníaco que o leva a crer que o Estado Novo, ou talvez a governanta de Salazar, está apaixonada por ele. Como tal, para corresponder a essa paixão insana, fantasia prodígios sobre o regime.

 O que é uma pena, porque enquanto manipula os dados relativos ao Estado Novo, não consegue ver os dados actuais que, esses sim, mostram Portugal prestes a tornar-se no país mais rico e desenvolvido da UE.

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