O estranho caso do desaparecimento de Noah comentado por ex-inspetor-chefe da PJ

“A possibilidade de encontrá-lo com vida perdia força gradualmente”, afirmou Carlos Anjos, antigo inspetor-chefe da Polícia Judiciária.

Noah, o menino de dois anos desaparecido desde a madrugada de quarta-feira em Proença-a-Velha – no concelho de Idanha-a-Nova -, foi encontrado com vida numa zona de mato e estará gravemente ferido.

“Apesar de dizerem que o menino é muito desenvolvido, é pequeno e, colocando o cenário hipotético de que se encontrou durante mais de 30 horas sem comer ou beber água, e ainda que a esperança fosse a última a morrer, a possibilidade de encontrá-lo com vida perdia força gradualmente”, afirmou Carlos Anjos, antigo inspetor-chefe da Polícia Judiciária.

“Nada daquilo que se tem dito sobre o caso faz sentido”, defendeu, dando como exemplo que “a casa da família está protegida por arame farpado alto", mas que "a porta que dava acesso ao exterior estaria destrancada”.

Por outro lado, o ex-inspetor não acredita que a criança estivesse familiarizada com o terreno. “Estavam naquela casa há apenas três meses”, sublinhou. “É ainda menos normal pensarmos que uma criança acorda, veste-se, calça-se e sai para a rua às 5h”, pois “no máximo calçaria uns chinelos e sairia como está vestida”, acrescentou.

A hipótese de as provas terem sido 'plantadas'

Tendo em conta o calções, a galocha e a fralda que surgiram durante as buscas, o dirigente suspeita de que as provas tivessem sido plantadas. “Por exemplo, uma criança desta idade não despiria a t-shirt nem colocaria pedras por cima da mesma. Isso fazem os adultos”, frisou.

“E é ainda mais inverosímil que, no riacho, que leva uma quantidade de água considerável, apareçam as peças de roupa e calçado”, comentou, acrescentou que há vários cenários a considerar, como por exemplo: "O de que a criança não desapareceu voluntariamente e que alguém quer confundir a polícia”, na medida em que “tudo foi achado pelos civis e nunca pelas autoridades que estão no local “têm muito mais treino”.

“Este caso intriga-me porque, até agora, a narrativa que nos foi contada, do ponto de vista da normalidade, não faz sentido”, explicou, acrescentando que “há algumas situações que nos levam a pensar no caso da Valentina, a tentação é estabelecer pontos, mas este não se revelou igual”, ainda que existam “pontos de ligação entre ambos”. “Há questões que têm de ser pensadas”, salientou.

Recompensa de 500 euros

“Nós, portugueses, não temos o hábito de pagar uma recompensa por uma situação destas. Mas, por exemplo, o pai é do Uruguai e, lá, é normal oferecer-se dinheiro por pessoas que desaparecem”, disse, sublinhando que tal facto não lhe faz confusão. “Podemos falar da quantia que foi oferecida pela vida do menino, enquanto a ação em si é uma questão cultural”, reiterou.

A versão da família

Os pais do pequeno Noah foram interrogados – tendo sido o progenitor ouvido duas vezes – pela Polícia Judiciária (PJ) e ambos relataram a mesma versão dos factos: Noah terá desaparecido de casa, entre as 5h30 – hora a que o homem, trabalhador agrícola, terá ido para o campo – e as 8h, de quarta-feira, quando a mãe terá acordado. Não havia sinal do menino nem da cadela Melina.

“Se tivesse um caso semelhante em mãos e as testemunhas me apresentassem uma narrativa igual, seria um grande incómodo porque é algo que dificilmente acontece”, explicou Carlos Anjos, dizendo que, tanto a a progenitora como a criança estariam a descansar quando se deu o desaparecimento e, por isso, ter-se-ão deitado com a presença de Noah e acordado com a sua ausência.

“Não sabemos nada: a hora do desaparecimento, se saiu com a cadela, etc. Todos esses dados fizeram-nos falta”, frisou, analisando o trabalho levado a cabo pela GNR e pela PJ. “No caso da primeira, mesmo com o tempo a escassear, enquanto havia uma possibilidade de encontrar a criança com vida, tinha de se acreditar”.

No entanto, “a PJ labora noutro princípio e é obrigatório: até prova em contrário, toda a gente é suspeita e podíamos ter estado perante um caso de homicídio premeditado, homicídio acidental, rapto… Estes cenários têm de estar em cima da mesa e os pais têm de entender”, até porque “na investigação criminal, partimos do pior cenário – a criança foi assassinada – e, a partir daí, esperamos que se revele o contrário”, explicou ainda.