Partidos criam as leis e fogem às restrições

O regulamento da CML sobre estacionamento na via pública prevê máximo de dois lugares para cada sede dos partidos. Mas têm mais. PS tem recorde de sete e PCP tem seis.

É caso para se dizer que os partidos ditam as regras, impõem as restrições, mas depois são os primeiros a dar o pior exemplo, fugindo ao seu cumprimento.

Na verdade é isso mesmo que se passa com o regulamento do estacionamento na via pública em Lisboa e os lugares reservados depois em frente às sedes dos maiores partidos políticos.

A Câmara de Lisboa (CML) não está a cumprir nem a fazer cumprir o regulamento que estabelece que cada partido deverá ter apenas direito a dois lugares de estacionamentos cedidos pela autarquia. Ao que o Nascer do SOL apurou, a maioria das sedes dos partidos com assento parlamentar tem mais do que os dois lugares de estacionamento atribuídos pela CML. E quanto à sede do PSD, a CML e o partido estarão em incumprimento pelo menos desde 2013.

O Regulamento Geral de Estacionamento e Paragem na Via Pública  (RGEPVP), de 22 de fevereiro de 2021 e assinado pelo Vereador da Mobilidade, Segurança, Economia e Inovação – Miguel Feliciano Gaspar –, visa «atualizar e uniformizar as normas vigentes em matéria de estacionamento na cidade de Lisboa». Estipula que «podem ser atribuídos lugares de estacionamento privativos» a partidos políticos «com o máximo de dois lugares (…) desde que não possuam estacionamento no próprio edifício». 

Regulamento anterior previa mínimo de dois lugares

Vem, portanto, atualizar o antigo documento de 2013 que, ao contrário desde, atribuía «o mínimo de 2 lugares» a cada partido, contudo igualmente ressalvando que só e apenas caso as sedes não possuíssem «estacionamento no próprio edifício».

O PSD e a Câmara entram então, assim, num duplo incumprimento. Em primeiro lugar porque, segundo estas normas, o PSD, pelo menos desde 2013, nunca deveria ter tido direito sequer a um lugar de estacionamento. Assim o é pois, conforme confirmado pelo Nascer do Sol junto da sede nacional do partido – localizada na Rua S. Caetano à Lapa–, o edifício possui internamente «pelo menos dois lugares de estacionamento». Logo, não deveria ter direito a tê-los na via pública pelo menos desde 2013.

Acrescentando a este incumprimento – que se verifica apenas no PSD, pois as outras sedes não possuem estacionamento dentro do edifício –, soma-se outro: o do PSD ter direito a quatro lugares na via pública. Segundo o regulamento de 2021, os partidos apenas têm direito a dois – e o PSD tem quatro quando, pelo exposto, não deveria ter nenhum.

E é exatamente neste segundo incumprimento que o PSD não está sozinho. Também o PS, PCP, CDS e BE fecharam os olhos perante o incumprimento da Câmara Municipal de Lisboa, prevaricando e utilizando mais do que os dois lugares a que, desde o início do ano, apenas têm direito.

PS com recorde de lugares

Os maiores prevaricadores são o Partido Socialista e o Partido Comunista Português – o que pode talvez ser explicado pelo facto de os socialistas serem maioritários no executivo camarário da capital e de contarem com os comunistas como ‘parceiros de ‘geringonça’ (viabilizando os orçamentos do Estado na Assmebleia da República) a nível nacional. 
Os primeiros, cujos lugares se localizam na Calçada Bento da Rocha Cabral – que ladeia a sede –, usufruem de sete lugares de estacionamento. Já os segundos, cuja sede se localiza na Rua Soeiro Pereira Gomes, usufruem de seis. 

Por sua vez, o CDS-PP, cujos lugares se encontram no Largo do Chão do Loureiro – que também ladeia a sede (no Largo do Caldas) –, também viola as regras usufruindo de quatro lugares. Por fim, o Bloco de Esquerda, cuja sede se situa na Rua do Palma, usufrui de três lugares. 

Nos restantes partidos com assento parlamentar – PAN, Chega, IL e PEV – não se regista qualquer irregularidade.
O que se verifica, então, é que os partidos criam situações de vantagens em relação aos particulares ou às empresas, pois não se autoimpõem às próprias leis que aprovam em Assembleia Municipal. Assim dando mais argumentos para um divórcio cadavez maior entre as organizações partidárias e a sociedade civil, como revelam os níveis de abstenção cada vez maiores nos atos eleitorais, uma tendência acentuada para um decréscimo da militância partidária e para a degradação da imagem dos partidos nos estudos de opinião.

Sem explicações

O Nascer do SOL tentou recolher reações tanto da CML como dos vários partidos relativamente ao incumprimento que se verifica em matéria de estacionamento na via pública, designadamente nas respectivas sedes, mas não conseguiu obter qualquer resposta da CML até à hora de fecho desta edição.

Já dos partidos, apenas obtivemos respostas do PS («Não comentamos, a não ser que nos limitamos a respeitar a sinalização existente») e do CDS («Não fomos notificados pela junta, não estávamos a par das alterações e aguardamos a notificação por parte da junta nesse sentido. Nós não somos agentes do parqueamento municipal»).