Saúde digital: à distância de um clique

O caminho da saúde digital é longo. Já se iniciou, mas há ainda muito a percorrer. Uma coisa é certa,  já não existe margem para recuo, nem para falhar.

por Dora Montenegro Ramos
Economista

Temos assistido a uma autêntica revolução tecnológica na nossa sociedade, mudança essa que nos entra em casa, no trabalho, na nossa comunidade, enfim, em todo o tipo de formas como nos relacionamos.  A tecnologia veio alterar a nossa vida. Hoje, quase todos nós somos consumidores exagerados do e-commerce.  O digital veio para ficar, em todas as áreas, nas mais diversas situações, até naquelas onde a presença física era sinónimo de imprescindibilidade. Característica esta que se enquadra na área da saúde, concretamente no relacionamento do profissional de saúde vs. utente.

Como em todas as áreas, haverá certamente algumas que são mais morosas na adaptação das novas realidades. As resistências enraízam-se mais quando falamos da nossa saúde, da saúde dos nossos próximos. O mundo digital pode não inspirar tanta certeza nesta matéria e as renitências são um caminho de dois sentidos: quer o profissional de saúde quer o utente demoram a confiar e a concretizar a mudança. Mas, neste mundo composto de mudança, quando as alterações são forçadas e repentinas, o ser humano tende a moldar-se e a adaptar-se. Foi o que aconteceu neste mundo atual, desde que surgiu a pandemia inerente à covid-19. 

A pandemia acelerou o futuro. Parece uma frase publicitária de quem quer menorizar os efeitos catastróficos do SARS-CoV 2, mas o confinamento, o isolamento e as novas regras de saúde pública ditaram esta revolução digital, uma verdadeira transformação.

Muito rapidamente empresas tecnológicas apostaram no desenvolvimento de novas aplicações, novos softwares. Algumas áreas da saúde, passaram a estar dependentes de um clique, de uma página net, ou de uma simples app. Com um telefone, telemóvel, tablet ou computador, os cuidados de saúde chegam até nós, entram em nossas casas, a qualquer hora do dia.

Todas têm um denominador comum: serviços que podem ser realizados integralmente e com a mesma qualidade, de forma remota.

Ao contrário de muitos outros setores cruciais da nossa sociedade, a saúde está envolta de uma nuvem conservadora. Pelo menos no que diz respeito ao relacionamento que existe entre profissional vs. utente. A evolução tecnológica preconizada na investigação e tratamento de doenças ou até mesmo a transformação de instrumentos complementares de diagnóstico, contrasta com o conservadorismo do relacionamento pessoal de quem trata e de quem é tratado.  Mas houve evolução. Nos últimos tempos, fruto dos condicionantes, uma evolução forçada, mas eficaz. Até mesmo nos serviços de telemedicina. Estes serviços de assistência médica prestada de forma online, com uma eficácia semelhante à presencial.

E porque é que foi forçada? Porque o mundo mudou. Essencialmente porque mudou a forma de relacionamento interpessoal. A pandemia trouxe novas regras e duras restrições e a tecnologia aproveitou estes factos para revolucionar a sociedade. E agora não há recuos, não há voltar atrás: ‘A arte aguça o engenho’.

O efeito da pandemia fez com que a saúde online ganhasse terreno.  As teleconsultas predominaram e surgiram como alternativa ao adiamento das consultas tradicionais. A telemedicina veio para ficar e está a ganhar adeptos. Nestes tempos de incerteza, esta transformação digital trouxe novamente a possibilidade de utentes e profissionais de saúde poderem comunicar, mantendo proximidade e regularidade, permitindo ganhar tempo a ambas as partes, promovendo ganhos em saúde. Já para não falar do alívio da pressão verificada no Serviço Nacional de Saúde.

Mas há mais exemplos de sucesso nesta matéria. Para além das teleconsultas, destaco também a eficiência na área do acompanhamento de utentes em recuperação. Vejam este exemplo: remotamente há utentes que recebem em casa consultas de fisiatria, terapia ocupacional ou fisioterapia, monitorizando exercícios à distância e evoluindo com o ensino e adaptação. Tudo à distância de um clique.

Podia dar mais exemplos, tais como a hospitalização domiciliária ou o acompanhamento da recuperação pós-cirúrgica em várias valências ou especialidades, que trazem níveis de redução de custos assinaláveis. Podia elencar aqui um sem número de apps ou softwares que apoiam os profissionais de saúde ou são utilizados pelos utentes nesta revolução tecnológica. Neste seguimento destaco o papel de relevo que o Ministério da Saúde tem dado nesta área, com uma excelente articulação entre a ACSS (Administração Central do Sistema de Saúde) e SPMS (Serviços Partilhados do Ministério da Saúde), no desenvolvimento de ferramentas e meios rapidamente aplicáveis nas instituições de saúde.

O caminho da saúde digital é longo. Já se iniciou, mas há ainda muito a percorrer. Uma coisa é certa, já não existe margem para recuo, nem para falhar. Os malefícios da pandemia, geraram outros benefícios que não podem ser desperdiçados. É o abrir a porta da saúde digital, por forma