O que fazer com estátuas caídas?

Desde tentativas de memorializar a experiência negra, até homenagens a Johnny Cash, não faltam possibilidades.  

Mais de uma centena de monumentos aos confederados, que lutaram contra o Governo americano para manter a escravatura, foram removidos só em 2020, entre enormes protestos contra o racismo sistémico nos Estados Unidos. Mas ainda sobram uns 700 e  fica a questão do que fazer com eles. E um pouco por todo o país, escultores preparam os seus escopros, ansiosos por pegar em mármore ou bronze, para reimaginar o espaço público americano. 

No caso do Capitólio, de onde poderão ser retiradas todas as estátuas de pessoas que voluntariamente serviram a Confederação, bem como defensores da escravatura, segregação e supremacia branca (ver texto ao lado), já há ideias sobre o que vem a seguir.

O National Statuary Hall, onde cada estado americano pode colocar duas estátuas, receberá do Arkansas, por exemplo, o ‘homem de negro’, Johnny Cash, figura lendária da música country, bem como a jornalista Daisy Bates, companheira de Martin Luther King na liderança do movimento pelos direitos civis. Irão tomar o lugar de Uriah Milton Rose, um advogado que apoiou a Confederação, bem como do governador James Paul Clarke. O próprio bisneto, Clarke Tucker, hoje senador estadual, votou pela remoção da estátua, devido às suas políticas racistas.

Já o busto de Roger B. Taney – o juiz do Supremo Tribunal que escreveu a infame decisão do caso Dred Scott v Sanford, em 1857, que negou o acesso a cidadania a afrodescendentes, fossem libertos ou escravos, impedindo-os de recorrer à justiça – deverá ser trocado pelo de Thurgood Marshall, primeiro juiz negro do Supremo Tribunal. 

No resto do país, procuram-se soluções diferentes. «Se tiveste quase 1800 memoriais e estátuas confederadas, posso garantir-te, não tens nem perto de 1800 memoriais e estátuas de heróis negros e da experiência negra», notou Anne Bailey, professora de História na Universidade de Binghamton, à Times. «Não dá para ter estes memoriais a mais». 

Se a tendência geral na estatuária sempre foi de imortalizar figuras, os novos artistas em cena tentam captar a esperiência de povos. Um exemplo é a obra ‘Rumors of War’, de 2019, uma estátua equestre em bronze, de um homem negro, de rastas, ténis da Nike e calças de ganga rasgadas, numa pose desafiante, semelhante às de tantas estátuas confederadas.

Mesmo a retirada de uma estátua pode funcionar como uma espécie de instalação artística. É esse o argumento de  Alex Criqui, que se lembrou de projetar imagens de George Floyd sobre a estátua do general confederadoRobert E. Lee, em Richmond, durante os protestos pela sua remoção.

«O monumento de Lee foi especificamente criado como símbolo de supremacia branca», disse à National Geographic Criqui, cuja obra virou viral. «Ao colocar a imagem de um homem negro na estátua, criamos algo que ninguém em Richmond poderia ter visualizado antes. Começou como um capricho, quase uma partida. Mas queriamos ser parte desta conversa importante».