Detentores de cargos públicos obrigados a revelarem se são maçons

Ao contrário do que foi noticiado, pertencentes ao Opus Dei não terão que se expôr: por chocar com a liberdade religiosa prevista na Constituição.

O Parlamento aprovou a lei que obriga qualquer titular de cargos políticos ou altos cargos públicos à “declaração da filiação, participação ou desempenho de quaisquer funções em quaisquer entidades de natureza associativa” nos três anos anteriores a assumir o cargo. A proposta, do PSD, foi votada favoravelmente pelo BE, PCP, CDS-PP e PAN e desfavoravelmente pelo PS.

Em termos práticos, esta lei obrigará a que qualquer titular de alto cargo público ou político declare as associações a que pertence, sejam estas o Grupo de Folclórico da Corredoura ou a Maçonaria. Não contempla, contudo – e ao contrário do que do que chegou a ser noticiado –, o Opus Dei. Por duas razões: em primeiro lugar, o Opus Dei não tem natureza associativa (trata-se, sim, de uma entidade regulada pela concordata ente Portugal e a Santa Sé); em segundo lugar, mesmo que tivesse, ficaria excluída por questões constitucionais: “Ninguém pode ser perguntado por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou prática religiosa”. Igualmente não obrigados à declaração estarão aqueles que pertencerem a associações de orientação sexual – como a International Lesbian and Gay Associaton (ILGA) – ou relacionadas com saúde– como é o caso dos Alcoólicos Anónimos. Poderão, ainda assim, facultativamente fazê-lo: “Revelar dados constitucionalmente protegidos como sejam os relativos à saúde, orientação sexual, filiação sindical ou convicções religiosas ou políticas” deverá passar a ser “meramente facultativo” – lê-se no diploma a que o i teve acesso. São estas as subtis – mas relevantes – diferenças do diploma de Março de 2021 para o aprovado esta semana em Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados.

Caso seja promulgada, cargos como Presidente da República, presidente da Assembleia da República, primeiro-ministro, deputados – nacionais e europeus –, membros do Governo, autarcas, membros de Conselho de Estado, gestores públicos, juízes do TC e do Tribunal de Contas, magistrados ou provedores de Justiça – entre outros – passarão a ser escrutinados neste sentido. Convém ainda notar que esta ideia de obrigação de total transparência quanto à natureza associativa de altos quadros públicos não é inédita, pois o Sistema de Informação da República Portuguesa já obriga parte dos seus profissionais a tal.

Esta lei, agora embandeirada pelo PSD, deu entrada no Parlamento através do PAN em Dezembro de 2019. Logo na altura, o PSD manifestara-se a favor das suas intenções mas contra os seus termos. À época, o PAN propunha que quem pertencesse a associações “discretas” deveria, facultativamente, declará-lo: o objetivo era o de fazer uma espécie de pressão moral. Recetivo à lei, o PSD procurou musculá-la e, após esta ter baixado às comissões sem votação plenária, apresentou uma proposta de alteração que não só obrigava à declaração – deixando de ser facultativa – como a pressupunha a todas as associações e não apenas às “discretas”. Escusado será dizer que, a partir do momento em que o PSD entrou em campo e deu vigor à proposta, o espaço público foi tomado pelo assunto. E se, por um lado, o PSD assumia uma posição de “quem não deve não teme”, por outro, Adelino Maltez afirmava que jamais os maçons se iriam declarar como tal e que a Assembleia da República se tratava do “maior templo da maçonaria em Portugal”. Se promulgada, esta lei tratar-se-á, indubitavelmente, de uma das maiores vitórias políticas de Rio desde que preside o partido.