IPST revê capacidades para transplantes de medula

Caso de criança à espera de transplante de medula trouxe a público a falta de capacidade para operar de imediato quando é identificado um dador compatível. Coordenação Nacional de Transplantação revela ao Nascer do SOL que no final do mês de junho havia 219 doentes em lista de espera com dador identificado. Necessidades estão a…

O caso de David, um menino de seis anos à espera desde maio que seja agendado o transplante de medula no IPO de Lisboa após ter sido identificado um dador compatível, trouxe a público a falta de capacidade a nível nacional para avançar com estes procedimentos logo que surge a esperança de um dador. Depois de o Nascer do SOL contar na última edição a história de David, tornada pública pela mãe nas redes sociais, e de o IPO de Lisboa ter confirmado que apesar de estar a registar um aumento de 30% na transplantação este ano continua com lista de espera nesta área, o Instituto Português do Sangue e da Transplantação confirma que há mais doentes nesta situação e que neste momento está a reavaliar as necessidades junto das unidades.

Em resposta ao Nascer do SOL, o organismo onde funciona a  Coordenação Nacional da Transplantação indica que se encontra neste momento a consolidar os dados relativos aos doentes em lista de espera transplantação de progenitores hematopoiéticos a nível nacional.

Não havendo assim ainda um levantamento nacional, o IPST adianta que até ao momento recebeu dados de duas unidades, a que funciona no Centro Hospitalar Universitário de São João e a do IPO de Lisboa, onde se encontram 128 doentes em lista de espera para transplante de medula, 10 dos quais pediátricos. Apenas o IPO de Lisboa e o IPO do Porto fazem transplantes de medula em idade pediátrica e há, assim, além de David, pelo menos mais nove crianças a aguardar transplante em Lisboa.

Não sendo possível facultar o universo global de doentes com indicação para transplante de medula no país, o Instituto Português do Sangue e da Transplantação acrescenta que, até ao final do mês de junho, entre os doentes com indicação para transplante, havia 219 já com dador identificado. Deixa no entanto uma ressalva: «Importa referir que a transplantação de progenitores hematopoiéticos é um processo complexo que envolve diversas fases. Na fase de identificação do dador é aferida inicialmente compatibilidade dador-recetor. Seguem-se outras fases que envolvem a avaliação clínica do dador e confirmação da sua adequabilidade, preparação da colheita e a preparação do doente para transplantação».

Na semana passada, quando o caso de David veio a público, o Nascer do SOL tinha questionado o IPST sobre se tinha sido feita alguma recomendação ao Ministério da Saúde no sentido de aumentar a capacidade nacional para a realização de transplantes de medula. 

João Oliveira, presidente do conselho de administração do IPO de Lisboa, explicou na altura a este jornal que apesar de a Unidade de Transplantação de Medula (UTM) ter aumentado de sete para 12 quartos no ano passado, tem havido um aumento de indicações para transplante em situações em que anteriormente essa opção não se colocava, o que faz com que o aumento da capacidade ande atrás do aumento das necessidades de intervenção. «Todos percebemos a situação e se esta criança pudesse ter sido transplantada noutro sítio já teria sido», afirmou, acrescentando: «Tem de haver um planeamento a nível nacional, porque as necessidades estão a aumentar em diferentes áreas. Na área da transplantação, existe uma coordenação de transplantação e os serviços, por serem poucos, comunicam regularmente uns com os outros. Isto é algo que nenhum hospital pode resolver sozinho e em que o SNS tem de ser maior do que a soma das partes».

O IPST garante agora que essa auscultação e levantamento de necessidades está a ser feito: «A Coordenação Nacional da Transplantação encontra-se neste momento a reavaliar com as unidades de transplantação as necessidades nesta matéria».

Nas redes sociais, onde tornou pública a situação do filho, Bruna Villar deixou esta semana um agradecimento público à solidariedade e carinho demonstrado após a publicação da semana passada, em que relatou a situação do filho, diagnosticado com um linfoma linfoblástico das células T quando tinha dois anos. Doença que voltou agora aos seis. 

David recebeu a indicação para transplante de medula em março e, a 19 de maio, a família recebeu a notícia de que tinha sido identificado um dador compatível. Inicialmente recebeu a indicação de que a intervenção poderia ser feita em julho, depois em agosto e, quando Bruna Villar fez o apelo público, a previsão era de que a operação pudesse vir a acontecer apenas em setembro. Entretanto, David já fez um novo ciclo de quimioterapia, que o levou a ser hospitalizado, e essa é uma das preocupações da família. «Tinha feito seis ciclos de quimioterapia e está pronto para o transplante. Já fez o sétimo, se calhar vai ter de fazer o oitavo e o nono enquanto espera. São doses agressivas, o risco da doença voltar é grande e se voltar saímos da lista de transplantes. Aí não há nada a fazer. Não tenho de esperar por ouvir que não há nada a fazer», disse na semana passada ao Nascer do SOL a mãe. 

Esta semana, nas redes sociais,  Bruna Villar pediu também reserva. «Ainda estamos a aguardar respostas e, neste momento, devido ao cansaço, não pretendo falar para mais nenhum órgão de comunicação social», escreveu a mãe, que questionou publicamente por que motivo não existe uma unidade de transplantação dedicada a casos pediátricos no país. Ainda não há respostas, mas o levantamento de necessidades está a ser feito.

No ano passado, foram feitos em todo o país 498 transplantes de progenitores hematopoiéticos, 408 de células dos próprios doentes e 99 de dadores (familiares e não relacionados). Nas comparações europeias, a última um levantamento em serviços de 50 países publicada em 2020 na revista Nature, Portugal surgia abaixo da maioria dos países da Europa ocidental na taxa de transplantação por 10 milhões de habitantes, quer autólogos, quer alogénicos.