Dielmar: ‘Ir até à última para minimizar impactos’

Empresa histórica na região declarou insolvência mas os problemas eram conhecidos. Presidente da autarquia local diz que o possível ‘está a ser feito’. Uma das soluções passa por colocar os 300 funcionários em risco noutros setores, numa região que tem falta de mão de obra.

Depois de 56 anos de atividade, a Dielmar – uma das maiores empresas da região de Castelo Branco, sediada em Alcains, e uma das referências nacionais no setor das confeções – fechou portas, declarando insolvência. Para trás, ficam quase seis décadas de história e um problema maior por resolver: o destino dos 300 colaboradores.

A bomba – que na verdade não foi uma surpresa assim tão grande – caiu há cerca de uma semana e a administração da empresa têxtil apressou-se a justificá-la: «Infelizmente, após ter ultrapassado várias crises durante 56 anos, a Dielmar sucumbiu à pandemia da covid-19, contaminada por um conjunto de situações que foram letais, pois esta crise atacou, globalmente, o que de melhor sustentava a sua atividade: o convívio social, os eventos e casamentos, com a elegância, o glamour da alfaiataria por medida e a personalização em que nos especializamos, e o trabalho profissional no escritório que eram a base fundamental do negócio», justifica a empresa que tem Ana Paula Rafael à cabeça do conselho de administração. E acrescentou que a crise pandémica «alterou radicalmente o negócio da Dielmar, que viu encerrar por decreto e em todo o mundo, desde 19 de março de 2020 e durante mais de um ano todas as lojas dos seus clientes e as suas próprias lojas e, consequentemente, o seu negócio».

Mas terá sido apenas problema da pandemia? É que o Governo discorda. E explica que a empresa «se debate, há vários anos, com graves problemas financeiros, apresentando muitas dificuldades a nível comercial e registando quebras significativas do seu volume de vendas», disse o ministério da Economia, em comunicado.

De acordo com o gabinete de Siza Vieira, «esta situação é anterior à crise provocada pela pandemia, tendo-se prolongado pelos últimos 10 anos». E enumera que durante esta última década várias entidades públicas injetaram um valor aproximado de cinco milhões de euros na empresa, tendo também garantido mais de três milhões de euros de dívida. «O recurso a estes montantes pressupunha a realização de um conjunto de medidas necessárias à reestruturação, sendo que a maioria destas medidas não foram aplicadas pela administração da Dielmar.  Acresce que a empresa regista uma dívida à banca de montante total de cerca de 6.142.000,00», diz ainda o Governo acrescentando que durante uma década, várias entidades públicas injetaram cerca de cinco milhões de euros na empresa, tendo ainda garantido mais três milhões de euros de dívida, que pressupunham «a realização de um conjunto de medidas necessárias à reestruturação, sendo que a maioria destas medidas não foram aplicadas pela administração da Dielmar».

‘É trágico, principalmente para estas 300 pessoas’

Ao Nascer do SOL, José Augusto Alves, presidente da Câmara de Castelo Branco garante que a autarquia tem estado a acompanhar a situação em conjunto com a administração da Dielmar e com membros do Governo. «Não esperávamos que fosse assim de rompante e desta forma e isso é lamentável, é trágico, principalmente para estas 300 pessoas, 300 famílias, que ficam numa situação como se costuma dizer, sem chão», começa por dizer José Augusto Alves, garantindo que a câmara está «preocupada» com a situação destes trabalhadores.
E prometeu: «Quero dizer-lhe com toda a franqueza que estamos já a tentar que haja aqui algumas pontes de entendimento. Temos que ver que estas pessoas são mão de obra especializada, de uma área de excelência como é a confeção». E elogia o percurso da empresa de Alcains: «A marca Dielmar é uma marca de referência nacional e internacional. Não é por acaso que já vestiu várias personalidades do nosso país, incluindo também desportistas. Isso também é uma marca a ter em conta. Tem um peso no mercado extraordinário, um peso no consumidor extraordinário, um peso no cliente extraordinário». 

Por isso, agora o que é preciso é «manter estas pessoas, com esta qualidade e com esta eficiência, com estas competências que eventualmente possam ser aproveitadas também na mesma área».

Mas, caso não seja possível, a autarquia de Castelo Branco está a tentar ver se consegue colocar esses trabalhadores noutras áreas. «Temos uma mão de obra escassa em várias áreas aqui na região. Há escassez de mão de obra. Temos muitas empresas instaladas em Castelo Branco e no concelho e, como tal, podem elas ser aproveitadas, desde que o queiram, porque tem que haver um relacionamento em ambas as partes, quer das pessoas quer das empresas, para que haja aqui o aproveitamento noutras áreas», diz o edil ao nosso jornal. 

Garantindo que a câmara «está do lado da solução», José Augusto Alves não tem dúvidas: «Até aqui era a administração, agora é o tempo do Governo, o tempo do presidente da Câmara, o tempo da Câmara Municipal. E é assim que as coisas se devem fazer de uma forma formal e institucional».
Mas qual será a solução? «Estão várias em cima da mesa», referiu, acrescentando que é preciso que sejam vistos «vários caminhos para esta situação que, nefastamente, prejudica as pessoa, o concelho, a região e todo o país seja resolvida. É ir até à ultima para minimizar os impactos».

No final desta semana o Juízo de Comércio do Fundão, do Tribunal Judicial da Comarca de Castelo Branco, declarou a insolvência da Sociedade Industrial de Confeções Dielmar, S.A. O tribunal nomeou para administrador da insolvência João Francisco Baptista de Maurício. A juíza Laura Abriel fixou o prazo para a reclamação de créditos em 30 dias e designou a data de 26 de outubro para a realização da reunião de assembleia de credores de apreciação do relatório.

Críticas e preocupações e novas esperanças

São várias as empresas e associações do setor que se mostram preocupadas com a situação da empresa. Não apenas pelos trabalhadores em causa como também pelo facto de este poder ser um problema que poderá ser comum ao têxtil.

Ao Nascer do SOL, Ana Palmeira de Oliveira, presidente da Associação Empresarial da Beira Baixa explica que a insolvência da Dielmar «significa que esta empresa, que é uma empresa que tem uma marca no território, nesta região, que está numa situação realmente complicada ao nível da gestão». No entanto, uma vez que insolvência não significa necessariamente encerramento, ainda pode haver uma luz ao fundo do túnel. 
Mas, caso não exista, a região tem outras soluções. «A região precisa de mão de obra», diz Ana Palmeira de Almeida, acrescentando que «para estas pessoas não tem de ser necessariamente uma situação de entrar no desemprego sem recuperação da vida ativa», até porque, caso queiram, poderão colocar-se noutros setores. «Se as pessoas não são aproveitadas na mesma área, no mesmo setor, há um conhecimento técnico que elas têm que se perde ou que não é aproveitado». No entanto, «a região tem um conjunto de indústrias e de novos setores emergentes que estão muito bem vivos, estão energéticos».

Enquanto associação, a AEBB está a fazer um trabalho «sério e fundo» do levantamento do tecido empresarial para ver as necessidades de mão de obra e de formação.
Apesar de assumir que a insolvência da Dielmar «tem este impacto na região que é empobrecer o tecido empresarial», a presidente da associação não tem dúvidas que «há setores emergentes que estão em crescimento» e que poderão ser uma oportunidade para estas pessoas.

Já César Araújo, presidente da Associação Nacional das Indústrias de Vestuário e Confeção (ANIVEC), defende que a falência da empresa «é uma pena». E justifica: «é uma empresa com 56 anos de atividade que muito deu a este país, quer em exportações, em questões sociais». 

Para já, não se sabe o que acontecerá com a empresa. Os trabalhadores manifestam-se esta segunda-feira frente à Câmara Municipal mas parecem surgir novas esperanças. Segundo o jornal local A Reconquista, o vereador Carlos Almeida da Câmara de Castelo Branco ter conhecimento da existência de um «investidor de peso» interessado na Dielmar.

«Na reunião privada do executivo municipal albicastrense que teve lugar neste dia, comuniquei ao presidente do município e restantes vereadores presentes nesta reunião que na quinta-feira, dia 5, fui contactado por um importante escritório de advogados com sede em Lisboa que me deram conhecimento da existência desse investidor, um interesse sério de alguém com peso no setor», disse o vereador à publicação.