Não é civismo, é seguidismo!

Gouveia e Melo emocionou-se com a salva de palmas com que foi recebido no centro de vacinação de Alcabideche

O vice-almirante Gouveia e Melo veio  dizer ao país, nesta semana, que não tem ambições políticas – a sua dedicação à causa pública continuará a ser de farda e não de fato – e elogiar o povo português pela «lição de civismo» que está a dar ao mundo com a adesão ao programa de vacinação por ele coordenado. Incluindo os jovens entre os 12 e os 15 anos, que assim permitiram que Portugal lidere os rankings mundiais da vacinação contra a covid-19 e possa atingir dentro de dias a almejada fasquia dos 85% de vacinados.

Também Marcelo Rebelo de Sousa saiu a terreiro, ao lado do coordenador da task force, a confessar-se «orgulhoso» pelo trabalho desenvolvido por Gouveia e Melo (que condecorou com a grã cruz da Ordem Militar de Avis «pela sua carreira militar») e sua equipa, pelas autoridades de saúde e pela adesão da população à vacinação de modo a tornar possível o abandono em breve do uso obrigatório de máscara na via pública – lembrando que foi dos primeiros a pô-la e será «o último a tirá-la».

Neste fim de semana, em Portimão, num congresso do qual pouco mais se espera do que a mobilização dos socialistas para a campanha autárquica a arrancar e umas ‘bicadas’ ao Presidente Marcelo (sobretudo pelo veto da lei, aprovada com os votos das bancadas socialista e comunista, que perdoava meia dúzia de câmaras – e respetivos presidentes – incumpridoras das regras de apoio à economia local), António Costa por certo também não deixará de exaltar a capacidade de resistência dos portugueses à pandemia e a todos os seus tão críticos efeitos (sobretudo na saúde pública e na economia) e a extraordinária resposta dos cidadãos nacionais aos apelos para a vacinação, bem como a preparação para o PRR que trará ao país as necessárias mudanças estruturais.

António Costa está no seu oásis político, num deserto de oposição, tanto interna como externa.

Sem alternativa, o povo conforma-se, submete-se, cala e não bufa. A exigência inexiste.

Ao contrário do que os mais altos responsáveis políticos e militares vão assinalando, a nossa cultura não é de civismo ativo coisa nenhuma, mas de reativo seguidismo ou, em linguagem mais ilustrativa ou popular, de Maria-vai-com-as-outras, que é como diz todos em carneirada.

Basta atentarmos em exemplos tão quotidianos como o que se passa nas lojas dos centros comerciais ou nos restaurantes, bares e afins.

Para onde vão os portugueses? Se há fila numa loja é para lá que vão logo, porque de certeza que é a que está na moda ou quem tem os artigos mais desejados. De outro modo, não havia fila. E se há fila é porque vale a pena.

A mesma coisa nos restaurantes. Ninguém entra em restaurantes vazios ou às moscas, mas todos aguardam tempos a fio por um lugar no restaurante mais cobiçado e procurado. Às vezes não é porque é bom, é simplesmente porque está na moda. Ou porque tem fila, porque, se tem fila, é porque vale a pena.

Já nos idos anos em que não havia autoestradas, ou eram raras, a paragem obrigatória era sempre onde estavam estacionados os camiões – os camionistas eram os melhores críticos gastronómicos nacionais e onde havia vários camiões parados era porque ali se comia bem e em conta. Mais uma vez, é porque valia a pena.

A mesma coisa na noite: alguém procura ou quer entrar nos bares ou discotecas sem ninguém? Mais uma vez, basta haver um aglomerado ou uma fila um pouco maior para atrair mais uns quantos. Porque onde está gente é o que está a dar.

Na política passa-se exatamente o mesmo fenómeno. Veja-se o exemplo de Mário Soares. É, e será até ver, o recordista em votos em eleições presidenciais. Mesmo o Presidente de todos os afetos, beijoqueiro e ‘selfista’ ficou muito longe do resultado do recandidato em 1991 e contrapeso de Cavaco Silva. Mas o mesmo Mário Soares, anos mais tarde (em 2006), mancomunado com José Sócrates e avançando contra o seu camarada Manuel Alegre, teve um resultado desastroso e castigador contra… Cavaco.

Enfim, modas ou carneirada.

Em tudo. 

E se num dia é uma, no dia seguinte bem pode ser outra.

Tanto se generaliza o medo das vacinas, como tempos depois se fazem filas para a sua toma.

Aliás, nada melhor do que haver uns quantos fura filas ou batoteiros a fugirem às regras para obter a vacina mais cedo para começar a corrida dos outros todos. Até a impoluta Ana Gomes confessou ter conseguido uma vacina (neste caso a da gripe) através de uma amiga que lha trouxe do estrangeiro.

Qual civismo qual quê?

Seguidismo e carneirada é o que é. 

E todos a ver quem consegue chegar mais na frente.