Vacinados e não vacinados: uma nova forma de discriminação

O objetivo primordial das vacinas é proteger quem as toma. E o das escolas é proteger e cuidar dos seus alunos. Não vamos deixar que o vírus nos baralhe

No final do dia em que o meu filho mais velho completou 12 anos, eram 2 horas da manhã quando recebi uma mensagem a marcar a vacinação para dali a quatro dias. A pressão que houve para os mais novos se vacinarem faz-me alguma confusão. Desde os cartazes a acenarem com a liberdade para ir a concertos e jantares – como se a decisão de tomar uma vacina devesse passar por aí – ou os centros de vacinação com direito a DJ, parecem baralhar as prioridades. Mas a verdade é que surtiu efeito. Mais de 85% dos mais jovens já têm a primeira dose da vacina. Resta saber quais serão as verdadeiras consequências para os 15% que não a tomaram.

Numa altura em que se fala de discriminação de tudo e de todos, ninguém parece ter problemas em discriminar quem, por alguma razão, não está vacinado. Se está vacinado pode almoçar dentro do restaurante, se não está tem de almoçar fora; se está vacinado pode ir para o hotel, se não está tem de fazer teste. Embora o contágio de pessoas vacinadas seja menor, estas não estão livres de ser contagiadas e contagiar. No entanto, para ir jantar, ir a eventos ou passar um fim de semana fora só o não vacinado tem de provar estar livre de covid, mas já o vacinado entra sem problema. 

Face a este cenário tinha alguma curiosidade de saber como iriam passar-se as coisas nas escolas. Se haveria ‘represálias’ para os não vacinados ou se os procedimentos seriam os mesmos. Felizmente até agora parece não haver diferenciação, exceto no que toca à falta de sensibilidade e bom-senso de alguns docentes.

A vacina não é obrigatória, não é requisito para ir à escola, depende da decisão – naturalmente informada e ponderada – dos pais. Ou simplesmente do timing. Alguns jovens estarão mais desenvolvidos do que outros, uns ainda não terão ido ao médico, alguns pais poderão ter mais receio, outros acham que não vale a pena vacinar os filhos se para a maioria das crianças a doença não representa risco, outros preferem esperar, etc. Mas a decisão caberá sempre aos pais, tal como cabe a cada um de nós ser ou não vacinado. E não deverá ser alvo de crítica ou escrutínio.

Acontece que, em algumas escolas isso não se tem verificado e há professores que têm feito um levantamento informal de quem está vacinado e feito críticas desadequadas a quem não está. Referindo-se até aos não vacinados como se representassem um perigo para a comunidade escolar. Ora isto é absolutamente condenável, impróprio e pode até ser constrangedor e perturbador para os mais novos. Sabemos como é fácil haver descriminação entre os jovens pelas razões mais simples. Porque é mais alto ou mais baixo, mais gordo ou mais magro, mais rápido ou mais lento, mais claro ou mais escuro. Dizer a uma criança que representa perigo para os outros e referir-se a ela quase como se referiam aos leprosos em tempos idos é absolutamente impensável. Não vale a pena arranjarmos mais um motivo de clivagem. O objetivo primordial das vacinas é proteger quem as toma. E o das escolas é proteger e cuidar dos seus alunos. Não vamos deixar que o vírus nos baralhe.