Pedofilia: uma contabilidade!

Na realidade, quando ouvi os resultados do relatório levantaram-se-me mais dúvidas do que eu alguma vez pudesse imaginar. Lembrei-me imediatamente de uma frase do Papa Francisco: faz mais barulho uma árvore a cair do que uma floresta a crescer.

Provavelmente algumas pessoas quererão conhecer a minha opinião sobre o relatório apresentado em França sobre os abusos sexuais de crianças por parte do clero. 

É justo que não fuja às questões que estão na ordem do dia. A minha primeira tentação seria de assobiar para o lado e começar a falar sobre a chuva e as noites frias. Não irei fazer isto, mas tentarei expressar o que tenho dentro do coração a partir do meu pensamento.

Devo dizer que eu não penso nada sobre esta questão! Eu, na realidade, tenho mais dúvidas do que certezas e fico admirado com a quantidade de certezas que entrevejo nos artigos de jornal e nas redes sociais sobre uma questão tão complexa como é esta.

Na realidade, quando ouvi os resultados do relatório levantaram-se-me mais dúvidas do que eu alguma vez pudesse imaginar. Lembrei-me imediatamente de uma frase do Papa Francisco: faz mais barulho uma árvore a cair do que uma floresta a crescer.

Porque me lembrei eu desta frase?

Vejamos os números, porque, esses, não enganam!!!

O número de abusadores que aparecem no relatório é de 3200, o que, segundo as minhas contas, significa, num universo de 115 mil padres, uma percentagem de 2,5 por cento, ou seja, há uma floresta 97,5 por cento da totalidade dos padres destes últimos setenta anos que viveram tranquilamente o seu ministério.

Vou ser mais especifico, agora sem uma linguagem figurativa: na realidade, 97,5 por cento dos padres franceses serviram as suas paróquias, serviram as crianças e amaram as suas famílias. Entregaram a sua vida por elas e cumpriram o seu compromisso para com o povo de Deus.

Agora apareceu-me uma outra dúvida: dos 3200 abusadores franceses, qual é o número de clérigos, ou seja, para além de padres, quantos homens ou mulheres casados que estão incluídos neste número?

Uma outra dúvida diz respeito ao número de crianças abusadas, que é brutal: 312 mil crianças!

É um número brutal, se pensarmos numa média de cem crianças por cada abusador. É um número absolutamente monstruoso, se pensarmos que estes homens e mulheres entregaram a sua vida para servir e, como diz Santo Agostinho no seu sermão sobre os pastores, mataram as ovelhas para se servirem delas.

Há muitos anos que não tenho a necessidade de usar o programa de tratamento de dados – SPSS – para analisar estatisticamente a realidade, mas penso que seria do interesse comum da Igreja, mas também da Opinião Pública, conhecer o que, realmente, se passou durante estes setenta anos na Igreja francesa. Seria conveniente confrontar os dados que emergem do relatório com os dados da sociedade em geral, no que se refere ao abuso sexual de menores, isto é, qual é a dimensão do abuso sexual de menores na sociedade francesa.

Não quero estar num estado de negação, mas penso que é de mor importância responder a estas e a muitas outras questões que se nos apresentam. O que aconteceu, na realidade, na Igreja Francesa e, ao mesmo tempo, na Igreja no seu todo, na gestão dos casos de abuso sexual de menores e de abuso sexual de crianças. 

Não sou negacionista, mas a vida tem-me obrigado a questionar os dados e, também, a questionar as abordagens que são realizadas dentro da própria Igreja. Não posso, nem devo, ser ingénuo quanto aos dados que nos são revelados como absolutos. Não posso, nem devo, ser ingénuo quanto à gestão dos casos de abusos dentro da própria Igreja. 

Fará exactamente, em janeiro de 2022, vinte anos, desde que rebentou o caso da Igreja Americana e, até ao momento, temos sentido vagas em todos os países do mundo. Talvez seja chegado o tempo de se fazer um relatório, não de França, não da Irlanda, não da Alemanha, mas de todo o mundo, para que não continuemos a agonizar com estas vagas de choque todos os anos.