Da “derrota pessoal” de Costa ao falhanço da Geringonça. O que dizem do Orçamento além-fronteiras

O chumbo do Orçamento do Estado para 2022 – o segundo desde o 25 de Abril e o primeiro que poderá levar à dissolução da Assembleia da República – não é notícia apenas em Portugal.

Da “derrota pessoal” de Costa ao falhanço da Geringonça. O que dizem do Orçamento além-fronteiras

A proposta do Governo para o Orçamento do Estado para 2022 (OE2022) foi, esta quarta-feira, chumbada na votação na generalidade. O documento recebeu votos contra do PSD, Bloco de Esquerda, PCP, CDS-PP, Chega, IL e Os Verdes. O PS votou a favor enquanto as deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues e o PAN se abstiveram.

E o chumbo do OE 2022 – o segundo desde o 25 de Abril e o primeiro que poderá levar à dissolução da Assembleia da República – não é notícia apenas em Portugal. De sublinhar que, até hoje, o primeiro e único chumbo de um orçamento no Portugal democrático aconteceu em 1978, numa altura em que o país tinha recorrido pela primeira vez ao Fundo Monetário Internacional.

Na vizinha Espanha, “a oposição que em bloco tombou os pressupostos do socialista Costa e abriu a porta a eleições antecipadas em Portugal” foi manchete no site do El País. A publicação destacou ainda a “consciência tranquila” que o primeiro-ministro apresentou e o facto de ter levado os votos contra da esquerda como uma “derrota pessoal”.

“Nasci à esquerda, fui criado à esquerda e a esquerda é a minha família. Acredito que tem o essencial para construir o futuro e não está condenada”, foi uma das citações de António Costa destacada pelo El País.

Já o também espanhol El Mundo conta que “a esquerda abandonou António Costa” e justifica esse abandono com o falhanço da ‘Geringonça’, criada após a vitória de Pedro Passos Coelho (PSD) nas legislativas de 2015. “Segundo esse acordo, [entre o PS, BE e PCP] Costa comprometia-se, entre outras coisas, a aumentar o salário mínimo, recuperar o salário dos funcionários ou baixar o preço dos transportes públicos, algumas demandas dos seus novos parceiros de Governo e, em troca, estes davam-lhe o seu apoio”, explica.

O El Mundo prossegue explicando que os portugueses voltaram às urnas em 2019 e deram a vitória ao Partido Socialista, que viria “a governar sozinho adotando acordos pontuais com os partidos de esquerda”. As mais recentes eleições autárquicas, a 26 de setembro, foram também uma das razões que o jornal espanhol apontou para o “abandono da esquerda” e destaca que o facto de os sociais-democratas terem ganho as câmaras municipais de Lisboa e Coimbra.

Além do ‘falhanço da Geringonça’, o El Mundo sublinha ainda que a proposta do Orçamento do Estado, na ótica do PCP e do Bloco de Esquerda, não cumpre as promessas de Costa.

Já o francês France 24, destaca que Costa perdeu “o apoio de alguns partidos mais pequenos de esquerda, que votaram com a oposição contra o seu Orçamento” e refere que o primeiro-ministro, “que lidera governos com minoria desde 2015 mas tem enfrentado oposição crescente dos seus aliados, prometeu antes da votação que não irá renunciar”.

E cita uma frase do chefe de Governo: “A última coisa que o país precisa nestas circunstâncias é de uma crise política”.

Na Alemanha, o DW diz que “é a primeira vez que um orçamento é rejeitado em Portugal desde a transição do país para a democracia em 1974” e que este chumbo “põe fim a seis anos de estabilidade do primeiro-ministro António Costa e dos seus parceiros de esquerda”.

Em Itália, o La Repubblica diz que “os comunistas e o Bloco de Esquerda rejeitaram o primeiro-ministro socialista” e que agora “o Presidente da República, Rebelo de Sousa, está pronto para dissolver a Assembleia da República”. Num artigo, de acesso pago, o jornal italiano também refere a formação da ‘geringonça’ e que o país “está a um passo da crise política”.

Um pouco mais longe, no Brasil, o jornal ‘O Globo’, também num artigo de acesso pago, enaltece António Costa, o “político habilidoso, inventor da Geringonça, a coalizão das esquerdas de Portugal, um exemplo de resistência à extrema-direita na Europa”.

“Governante experiente, liderou aliados sem descartar ajuda pontual de rivais durante seis anos, período no qual o país experimentou estabilidade política pós-crise económica e virou um eldorado para os brasileiros. Reeleito em 2019, era para ser o primeiro-ministro a mais tempo no poder sem passar por grandes crises. Até hoje, quando viu o seu Orçamento de Estado (OE) para 2022 ser rejeitado no Parlamento com votos dos ex-parceiros”, sublinha o artigo.