Semana 2 da crise: O que se segue

Partidos começam a ser recebidos às 14h deste sábado, por ordem crescente de deputados. Conselho de Estado é na quarta-feira. Sexta-feira deve ser o último plenário na AR. Orçamento em abril no cenário mais rápido. 

Semana 2 da crise: O que se segue

O que está previsto para este fim de semana?

De acordo com o artigo 133.º da Constituição, o Presidente da República só pode dissolver a Assembleia da República ouvindo os partidos nela representados e o Conselho de Estado. O caminho foi anunciado pelo Presidente em caso de chumbo do OE e Marcelo Rebelo de Sousa não dá sinais de desvios: os partidos são recebidos em Belém este sábado, entre as 14h30 e as 20h30, por ordem crescente de representação parlamentar. Segue-se na quarta-feira, às 17h, a reunião do Conselho do Estado. A partir daqui, o Presidente da República pode fazer publicar em Diário da República o decreto de dissolução da AR. Quando estiver publicado, fica dissolvido o Parlamento, que mantém apenas em funcionamento a Comissão Permanente da Assembleia da República. Note-se que em conferência de líderes, já depois de o presidente da Assembleia da República, agendou os plenários da próxima semana, que vão ter lugar na terça-feira, na quinta-feira e na sexta-feira. A votação do diploma que legaliza a eutanásia é um dos atos previstos para o plenário de sexta-feira e a questão foi colocada a Marcelo, que aceitou que o diploma seguisse para Belém, o que dá alguma ideia dos timings. O plenário de sexta-feira deverá ser o último. Em 2004, quando Jorge Sampaio dissolveu o Parlamento, o decreto de dissolução foi assinado a 22 de dezembro e publicado no mesmo dia. Na altura já se sabia quando seriam as eleições, cuja data tem de aparecer no decreto, pelo que até lá deve ser anunciada – na altura foram marcadas para 20 de fevereiro de 2005, 60 dias depois.

Quando podem ser as eleições?

Não havendo alterações, no calendário mais apertado, o Parlamento é dissolvido segunda-feira, 8 de novembro. De acordo com a lei eleitoral, as eleições legislativas podem ser convocadas com uma antecedência mínima de 55 dias, o que significa que podem ser marcadas a partir de 2 de janeiro. O ministro da Economia defendeu ontem eleições «o mais rapidamente possível» para minimizar o impacto na economia. Aqui, as contas são mais à direita: mais uma vez, de acordo com a lei eleitoral, as listas candidatas a eleições têm de ser apresentadas 41 dias antes do escrutínio, o que implicaria que fossem apresentadas, no cenário de eleições em janeiro, em dezembro. Entretanto já há movimentações para antecipar o congresso do PSD para 17, 18 e 19 de dezembro. Nas datas em que está previsto em janeiro, implicaria que Rangel, no cenário de ser eleito nas diretas de 4 de dezembro, não teria a palavra final nas listas do partido.

O que acontece entretanto?

O Governo garantiu que não se demitirá e disse que está disponível para governar em duodécimos – o que de uma forma ou outra terá de fazer. Em caso de demissão, as eleições não poderiam ser marcadas mais rapidamente. Além da questão orçamental, com a dissolução da AR, não pode aprovar matérias que dependam do Parlamento, como projetos de lei. Pode no entanto aprovar portarias e decretos-lei, tendo o Presidente da República veto sobre os mesmos. Uma das questões que tem sido suscitada é se será levado ao Parlamento ainda um Orçamento retificativo que acautele a programação do PRR no próximo ano, isto porque com o país em duodécimos só pode ser executada em cada mês 1/12 do Orçamento deste ano. O Ministério das Finanças já indicou que caso o Governo gira o país em duodécimos, mas consiga executar o PRR, as previsões apontam um crescimento do PIB de 5,1% em 2022, menos quatro décimas do que os 5,5% previstos na proposta de OE – algo que o Conselho de Finanças Públicas tinha apontado ser já a margem mais otimista nas previsões para o próximo ano (ver pp. 12-13).

Que medidas do OE podem avançar?

As que tiverem cabimento orçamental na lógica dos duodécimos e não dependerem de projetos-lei, podendo ser executadas por decreto. A dissolução do Parlamento não inviabiliza assim por completo por exemplo o aumento do salário mínimo ou o aumento de 0,9% para toda a Função Pública, mas teria de haver dinheiro ou redução de despesa noutras áreas – por exemplo não haver necessidade de medidas adicionais da covid-19 que representaram gastos este ano pode dar margem adicional. Excluindo medidas financiadas pelo PRR, o impacto de novas medidas a implementar no próximo ano de acordo com a proposta de OE era de 619 milhões de euros (0,3% do PIB), sendo metade respeitante aos gastos previstos com o aumento da massa salarial na Administração Pública e a maioria fatia do bolo os 225 milhões de euros para aumentar os vencimentos dos funcionários públicos em 0,9%. Já o aumento das pensões mais baixas, na versão inicial colocada pelo Governo no Orçamento, teria um impacto de 76 milhões de euros na despesa. Mas, nas negociações com os partidos à esquerda, o Governo dispôs-se a aumentar as pensões em 10 euros não apenas nas reformas até aos 658 euros mas até aos 1097 euros e já em janeiro, o que teria um impacto superior. «Um aumento de 0,9% para os funcionários públicos, as promoções e descongelamento de carreiras tornam-se praticamente impossíveis de concretizar. Também seria praticamente impossível o aumento extraordinário de pensões. As mudanças de escalão de IRS, que poderia ter impacto positivo em alguns agregados familiares, também não seriam concretizadas», defendeu durante a semana ao jornal i Francisca Guedes de Oliveira, economista especialista em Finanças Públicas. 

Para a professora da Católica Porto Business School, o maior impacto poderá ser, no entanto, no investimento público, que se previa ser 31,5% superior em 2022. No caso de fundos afetos ao Programa de Recuperação e Resiliência, com o qual o Governo espera investimentos de 3,2 mil milhões de euros, Francisca Guedes de Oliveira admite que uma solução poderá ser a antecipação de verbas que substituam a comparticipação nacional. «Como a maioria dos projetos do PRR são plurianuais, pode haver algum adiamento da comparticipação nacional mas pode não por em causa os projetos. De facto uma parte substancial pode avançar nem que se faça uma antecipação de parte dos fundos que depois seria reembolsada com a comparticipação nacional». 

Há ainda um outro ponto: de acordo com a lei de Enquadramento Orçamental, neste período manter-se ia em vigor o decreto-lei de execução orçamental, que o Governo não aprovou nos últimos dois anos, sendo um dos diplomas que poderá aprovar agora. De acordo ainda com a lei, durante o período transitório em que se mantém em vigor a lei do Orçamento do Estado do ano anterior o Governo pode emitir dívida pública fundada, conceder empréstimos e realizar outras operações ativas de crédito – até ao limite de um duodécimo do montante máximo autorizado pela lei do OE em cada mês em que a mesma vigore transitoriamente – e conceder garantias pessoais, nos termos previstos na respetiva legislação.

E à margem do OE?

Por exemplo o decreto-lei que define o novo estatuto do SNS, que o Governo aprovou na semana passada, foi colocado em discussão pública no dia da votação do Orçamento do Estado até 16 de novembro. Também poderia ser aprovado, embora a sua concretização implique audições e negociações com as estruturas sindicais, conforme anunciou o Governo. E no limite pudesse ser vetada em Belém. O diploma dá passos para a concretização da dedicação plena no SNS, embora não determine a majoração salarial em causa, que iria ser discutida com sindicatos, estabelece um novo regime de trabalho extraordinário no SNS e avança com a criação de uma direção executiva para o SNS. Entre as responsabilidades, coordenar a resposta assistencial das diferentes unidades e elaborar e implementar um plano de estratégico para o SNS. Mas a forma de trabalho, nomeação, etc, depende de diploma próprio, pelo que dificilmente ficaria fechado.

Quando haverá OE?

Se as eleições forem em janeiro, o processo de aprovação do Orçamento do Estado terá ainda de ser precedido da formação do Governo, algo que pode levar mais ou menos tempo consoante os resultados do escrutínio. Após dar entrada na Assembleia da República, a votação da proposta de OE é votada no prazo de 50 dias. Assim, por exemplo se a proposta de OE der entrada na AR entre o final de fevereiro e início de março, poderá haver Orçamento aprovado em abril. Antes será difícil.