PSD. “Interesse nacional”: a chiclete mais mascada de Portugal

Rio e Rangel falam de ‘interesse nacional’ para justificar posições completamente opostas. Marcelo também o invoca, mas para explicar que este não se deve subjugar à vontade partidária.

Dando seguimento ao apelo que havia feito na sexta-feira à noite em entrevista à SIC, Rui Rio enviou ontem uma carta aos militantes do PSD a convidá-los a refletir acerca do adiamento das diretas do PSD para depois das legislativas.

A razão? O “interesse nacional” – curiosamente a mesma que Paulo Rangel invoca para antecipar o Congresso e que Marcelo invoca para não ceder aos interesses de um e outro.

Na missiva, a direção do PSD considera, “face às circunstâncias que o país está a viver” e aos “objetivos do PSD”, “totalmente desajustado” realizar eleições internas no próximo dia 4 de dezembro. “Os portugueses esperam do PSD uma alternativa clara e credível ao PS. Não esperam um PSD virado para uma disputa interna, enquanto o PS e o Governo vão fazendo livremente a sua campanha, aproveitando as nossas divisões eleitorais”.

Assim, “em nome do interesse nacional e do nosso próprio partido, temos de estar unidos e totalmente focados no combate com os nossos verdadeiros adversários” – lê-se no documento.

Interesse nacional esse que Paulo Rangel considera ser totalmente o oposto. Segundo o eurodeputado e adversário de Rio, o interesse da nação é, sim, antecipar o Congresso Nacional do PSD porque este contribuirá para a viabilização de “um calendário de eleições legislativas rápido, com as várias forças políticas, incluindo as mais representativas, em plenas e iguais condições políticas, de legitimidade, formais e operacionais para oferecerem aos portugueses as suas melhores equipas e projetos, com a clareza de alternativas que uma democracia saudável merece”.

Para a ala “rangelista”, “a garantia do regular funcionamento das instituições e processos democráticos internos do PSD, enquanto partido pilar do sistema democrático, é também crucial para a defesa da democracia e consequentemente do interesse nacional”. Ou seja, tanto Rio como Rangel defendem que o PSD deve ir forte e credibilizado a eleições.

Contudo, se o primeiro acredita que eleições internas antes das legislativas prejudicarão essa credibilidade, já o segundo defende que as eleições internas irão potenciá-la.

Sem surpresa para ninguém, um outro antigo social-democrata ilustre junta-se à discussão, oferecendo uma espécie de ‘terceira-via’. “O interesse nacional vale mais do que o interesse, que também é muito legítimo, da vida interna de várias instituições, como os partidos”, disse o Presidente da República aos jornalistas, em Vila Real. É assim, então, ‘mascada’ a três sabores a mesma pastilha elástica, que, de boca em boca, vai-se esticando de tal forma que serve para qualquer posição sobre o mesmo assunto.

Rangel deverá conseguir antecipar Congresso Ao cair da tarde de domingo, o presidente da mesa do Conselho Nacional, Paulo Mota Pinto, anunciara a convocação de um Conselho Nacional extraordinário para 6 de novembro, próximo sábado, em Aveiro.

O Conselho terá sido convocado pelas duas alas e realizar-se-á dois dias depois da data em que se prevê que Marcelo agende eleições. Este Conselho Nacional foi, oficialmente, convocado para analisar a “situação política decorrente da reprovação do Orçamento do Estado”. Na prática, todavia, discutir-se-á a eventual proposta de Rio – adiar as diretas para depois das legislativas – e de Rangel – antecipar o congresso para os dias 17, 18 e 19 de dezembro. Um puxa de um lado, o outro puxa do outro.

Apesar de os militantes irem a Conselho após terem sido convidados a refletir a favor da atual direção, é bastante provável que seja a oposição a levar a melhor – conseguindo, então, antecipar o Congresso. Basta “fazer as contas”: se os 68 conselheiros nacionais que acompanharam Rangel na marcação deste Conselho Nacional extraordinário votarem a favor da antecipação do congresso, a sua proposta levará a melhor sobre a de Rio.

Numa frase só, Rangel tem a maioria do Conselho Nacional (como aliás ficou provado em conselho ordinário aquando da marcação da data das diretas para 4 de dezembro). Entre estas 68 assinaturas, contam figuras como Luís Filipe Menezes e Rui Machete.

Note-se que o calendário interno do PSD é fundamental para as contas legislativas. Rangel, mesmo vencendo dia 4 de dezembro, só poderá ser ‘candidato a primeiro-ministro’ se, por um lado, conseguir antecipar o Congresso para 17, 18 e 19 de dezembro e, por outro, Marcelo marcar as eleições para dia 30 de janeiro (todos os partidos, à exceção do IL, pedem a 16). Se o Congresso do PSD não for antecipado (improvável) e a data de eleições a 16 de janeiro se confirmar, estes entrarão em conflitos, ao ficarem agendados para o mesmo fim de semana.

‘Chicanização’ de Rio O atual presidente do PSD foi amplamente criticado devido à mensagem que pedia aos militantes para refletirem acerca do adiamentos das eleições internas. A posição de Rio foi comparada à de Francisco Rodrigues dos Santos, seu homólogo no CDS. Também Pedro Rodrigues, deputado do PSD, falou em “manobras de secretaria”.