E assobiam para o lado?

Carne, peixe, leite, pão, ovos, transportes, portagens, por aí fora – os preços estão ou vão começar a subir rapidamente.

Desde setembro, quando ultrapassou a barreira dos 4%, que a taxa de inflação na Alemanha tem vindo a bater máximos históricos, tendo atingido 4,6% em outubro – só com paralelo nos primeiros anos da última década do século passado (4,3% em 1993) – e influenciando negativamente a inflação na zona euro, agora também já acima dos quatro pontos percentuais.

Os preços dos combustíveis e os constrangimentos nas cadeias de distribuição, assim como o agravamento do IVA, explicam a subida de preços na Alemanha, e consequentemente na Europa, que, apesar de causar apreensão, continua a ser encarada por Bruxelas (sobretudo pelo Banco Central Europeu) como um fenómeno transitório ou temporário.

Por cá, os preços começaram a subir – alguns mascarados pela diminuição das doses (nos congelados as embalagens mantêm o preço mas reduzem o peso ou quantidade) – e já se anunciam agravamentos muito significativos para o futuro próximo: veja-se o exemplo do papel, que, por encerramento de fábricas no norte da Europa durante a pandemia e aumento da procura (exponencial com as encomendas online e a proibição dos sacos ou invólucros de plástico), vai disparar entre 40% a 100%.

Ora, quando o custo das matérias-primas dispara é inevitável o aumento dos preços no consumidor. Seja o papel, seja o algodão, que também já vai por aí acima (impactando em todo o setor têxtil).

E quando este aumento das matérias-primas surge associado ao aumento dos combustíveis e da energia, que ainda mais agravam os custos de produção e de distribuição, é fatal como o destino.

Veja-se o que se passa, por outro lado, no setor automóvel. Da falta de chips à escassez de veículos para venda ou aluguer foi um fósforo. E o drama acentua-se agora com os atrasos nas reparações de usados por falta de peças de origem – as entregas de peças encomendadas estão a demorar semanas e a colocar pressão sobre as marcas. Sendo que esses atrasos, tanto na entrega de viaturas (de meses) como na entrega de peças para reparação de usados (semanas) estão a colocar pressão sobre stands e oficinas das marcas, sem trabalho para quadros de pessoal adequados à procura do mercado mas não a esta falta de resposta por parte da oferta.

Observe-se também o que está a passar-se no setor das bebidas alcoólicas – sobretudo depois da reabertura da noite ter originado um consumo desenfreado e nunca visto: a procura claramente a esgotar a oferta. E o reflexo é o que se sabe.

Carne, peixe, leite, pão, ovos, transportes, portagens, por aí fora – os preços estão ou vão começar a subir rapidamente.

As grandes distribuidoras alimentares garantem que não vai haver prateleiras vazias. Nem vão faltar aparelhos elétricos, dos mais básicos aos tecnologicamente mais desenvolvidos. Ora ainda bem.

Mas as noites também já estão mais frias e mais frias hão de ficar. E voltamos ao preço da energia e às deficiências de isolamento térmico das casas em Portugal. E não só das casas mas também dos locais de trabalho e sobretudo das escolas ou estabelecimentos de ensino.

E a gripe também aí está e faltam médicos de família e as urgências estão cheias e os hospitais não têm condições de dar resposta a tanta procura e os clínicos demitem-se das respetivas direções e coordenações por não aguentarem mais.

Enquanto isso, estão a chegar as primeiras tranches do Plano de Recuperação e Resiliência, que tem prazos e metas a cumprir – ainda que as empresas, sobretudo as mais pequenas e as médias, estejam a ver a bazuca por um canudo. 

Enquanto isso, o primeiro-ministro e mais um muito significativo rol de ministros e secretários de Estado demonstram francas melhorias na pronúncia e fluidez do seu inglês, desdobrando-se em propaganda no caríssimo palco da Web Summit.

Enquanto isso, os parceiros de geringonça acusam o abraço do urso e desesperam com as eleições agora já com data marcada.

Enquanto isso, os principais protagonistas da oposição, à direita do PS, estão entretidos com as suas querelas internas e com datas: a das eleições propriamente dita, a das diretas internas mais a do congresso, a da aprovação das listas de deputados… enfim, é o que os move, entre contagens de espingardas e a satisfação das clientelas.

Enquanto isso, António Costa vai preparando já o novo orçamento, aquele que será aprovado pela nova Assembleia da República, a tal que terá bancadas bem mais pequenas na sua ala mais à esquerda (PCP e BE) e bem maiores na ala mais à direita (IL e Chega).

O resto, como diria Guterres, é fazer as contas.

E quando andam todos a assobiar para o lado…