A situação política em Portugal soou-me a uma música familiar, mas andei uns tempos até chegar lá. Depois, fui ver a letra da música e descobri que José Barata-Moura é um visionário e que a sua canção não podia ser mais atual. Atentemos então na descoberta de Barata-Moura.
‘Vamos falar de animais e de como eles são
Do periquito, do gato e do cão
E outros mais também virão
Talvez uma girafa um macaco ou um leão
É o fungágá
fungágá da bicharada
É o fungágá
fungágá da bicharada
É o fungágá
Vamos todos aprender como vive a bicharada, cão cardume e uma manada
Vamos ver não tarda nada
Quem é que afinal tem a voz bem afinada
É o fungágá
fungágá da bicharada
É o fungágá
fungágá da bicharada
Hummmmmm hmmmmm 🙂
Vamos também descobrir os amigos bestiais
Bem diferentes dos habituais
E vamos rir até não poder mais
Com as palhaçadas dos amigos animais’.
Se o leitor fizer um pequeno esforço, perceberá, facilmente, que em vez do periquito, gato, cão e demais bicharada, se colocar o nome de alguns políticos da nossa praça, concluirá que o fungágá da bicharada está instalado na vida política portuguesa. Não vejo outra forma de definir a atual situação.
Há um ministro que, no espaço de poucos meses, conseguiu a verdadeira bicharada de dizer tudo e o seu contrário, com o maior à-vontade deste mundo. Recordemos a diretiva enviada pelo seu Ministério aos três ramos das Forças Armadas sobre o uso de uma linguagem mais inclusiva e menos discriminatória nas comunicações públicas e nos documentos oficiais. João Gomes Cravinho começou, em meados de setembro, por não atribuir a «a mínima relevância» ao caso, para uns tempos depois, a 2 de outubro, mandar rasgar o documento. Escreveu o JN, citando fontes do Ministério: «Por carecer de aprovação superior e por se tratar de um documento de trabalho que não evidencia um estado de maturação adequado, devem considerar-se anulados os referidos ofícios». Extraordinário! Um documento que saiu do seu Ministério e que começou por ser um «faits divers», termina de forma abrupta depois da contestação dos militares e do ‘sururu’ provocado pela comunicação social.
Depois foi a rábula da substituição do chefe de Estado-Maior da Armada, António Mendes Calado, que foi chamado ao gabinete de João Cravinho onde lhe foi comunicado que seria destituído do cargo para dar lugar a Gouveia e Melo. Quando percebeu que não tinha competências para tal decisão, embrulhou-se em explicações completamente estapafúrdias. Mais um fungágá da bicharada. Agora, como cereja em cima do bolo, há a história dos militares envolvidos no tráfego de diamantes e que o ministro entendeu que não seria suficientemente grave para comunicar ao Presidente da República, o Comandante Supremo das Forças Armadas, nem tão pouco, ao que se diz, embora ninguém acredite, ao primeiro-ministro. Para pôr mais bichos na cantiga, João Cravinho começou por dizer que comunicou, mal soube, em finais de 2019, às Nações Unidas que tropas portuguesas estavam a ser investigadas. Mas não é que as Nações Unidas revelaram agora que só esta semana souberam pela imprensa da história?
Não creio que se ganhe grande coisa em despedir um ministro a dois meses do final do seu mandato. Mas que tudo isto é maus demais, ninguém duvida. Voltando à música de Barata-Moura, e se juntarmos a palhaçada vivida no PSD e no CDS? E o que dizer do AUTOvoucher, onde um secretário de Estado se viu obrigado a explicar tudo o que tinha explicado no dia anterior? Nem é preciso falar no PAN para este verdadeiro jardim zoológico ficar completo.
vitor.rainho@sol.pt