Loures: Dois meses para o fim da PPP

Governo criou empresa pública para gerir hospital a partir de 19 de janeiro mas ainda não nomeou administração. Apesar de entidade se chamar Hospital de Loures, hospital manterá o nome Beatriz Ângelo.

Faltam dois meses para o fim da gestão em parceria público-privada do Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, a terceira PPP a ver o chegar o seu término no SNS esta legislatura. Esta semana, o futuro começou a ser clarificado: foi oficialmente criada a entidade pública empresarial para gerir o hospital que serve desde 2012 o concelho de Loures, com exceção de algumas freguesias, o concelho de Odivelas, o concelho de Sobral de Monte Agraço e ainda as freguesias de Malveira, Milharado, Santo Estêvão das Galés e Venda do Pinheiro do concelho de Mafra.

Apesar de a opção ter sido chamar à nova EPE Hospital de Loures, questionado pelo Nascer do SOL o gabinete de Marta Temido garantiu após a publicação do diploma que o hospital vai manter o nome de Beatriz Ângelo e que Hospital de Loures será apenas o nome de registo da entidade gestora.

Já sobre quando será nomeada a nova administração não foi dada resposta até ao fecho de edição. Outra questão sobre a qual o Ministério não respondeu foi sobre uma futura integração deste hospital no Centro Hospitalar Lisboa Norte, questão que o Nascer do SOL apurou estar em estudo na Administração Regional de Saúde de Lisboa.

Saída de profissionais 

A saída de pessoal dos quadros do Beatriz Ângelo para o Grupo Luz, que criou o hospital e equipas de raiz, é uma das preocupações que tem rodeado este processo. Fontes hospitalares ouvidas pelo Nascer do SOL afastam uma saída significativa de profissionais, sendo que nas negociações de transição de gestão que tem havido com a ARS, e que remontam a junho, antes do anúncio do fim da PPP, um dos pontos assentes é que o funcionamento pleno do hospital seja acautelado. Até ao momento, houve cerca de 40 pedidos de rescisão num universo de cerca de 2200 trabalhadores.

A nova administração, segundo o diploma publicado pelo Governo, poderá ser mais pequena do que o previsto nos estatutos nesta primeira fase e durante um ano terá por exemplo maior flexibilidade para contratualização, podendo recorrer com menos limites a ajustes diretos. A situação de congestionamento frequente das urgências é um dos nós críticos neste e noutros hospitais de periferia.

Em termos de recursos humanos, área de que se queixam outros hospitais de Lisboa, com a transição para a esfera pública, o Beatriz Ângelo passa a ter de oferecer as mesmas condições das demais EPE, contratos individuais de trabalho mediante a legislação aplicada aos profissionais de saúde. Na gestão em PPP, mesmo fazendo os hospitais parte do SNS, as entidades gestoras têm margem de manobra.

Num dos anúncios de recrutamento do Beatriz Ângelo em novembro de 2020, na altura de recrutamento de enfermeiros, podia ler-se que, além do salário, oferecia-se um plano de benefícios que incluía seguro de saúde para colaboradores, apoio no alojamento em Lisboa nos primeiro meses de integração para profissionais deslocados, apoio total ou parcial no pagamento de propinas da especialidade na Universidade Católica aos ‘top performers’ e acesso à Plataforma de Benefícios do Grupo Luz Saúde/Fidelidade que inclui um conjunto de descontos acordados para os seus colaboradores em diversas áreas.

O hospital que saiu do papel

O fim da PPP de Loures segue-se à integração na esfera pública do Hospital de Braga em setembro de 2020 e do Hospital de Vila Franca de Xira, em junho deste ano, estas duas PPP do grupo CUF.

Inaugurado em março de 2012, a construção do hospital de Loures arrancou em janeiro de 2010, depois de em 2009 um consórcio liderado pela então Espírito Santo Saúde ter ganho o concurso para a construção e gestão do hospital, que estava para ganhar forma há quase 30 anos.

A segunda vaga de hospitais PPP, lançada por José Sócrates em 2008, previa ainda a construção dos hospitais de Lisboa Oriental, Faro, Seixal, Évora, Vila Nova de Gaia e Póvoa de Varzim. No caso de Lisboa Oriental, o concurso para uma PPP de construção decorre mas os restantes já não avançaram neste modelo, estando quase todos por sair do papel. Na proposta de OE estava inscrito o início da construção dos hospitais de Lisboa Oriental, Seixal, Sintra e Alentejo (Évora) até 2023.

No caso do Hospital de Loures, o Governo anunciou no início de 2020 que não renovaria automaticamente o contrato de gestão «por não estarem reunidos todos os requisitos necessários para tal» e serem necessários ajustes na oferta clínica e foi depois anunciado o concurso para uma nova PPP. Os prazos foram derrapando e a transição para a esfera pública é «inevitável» dada a proximidade com o fim do contrato (18 de janeiro), não tendo havido acordo com a Luz Saúde para o prolongamento do atual contrato de gestão – a solução atingida no caso da PPP do Hospital de Cascais, da Lusíadas Saúde e cujo contrato foi recentemente prolongado por mais um ano. 

No diploma publicado esta semana em Diário da República, pode ler-se que o novo modelo de gestão do Hospital de Loures será reavalidado ao fim de três anos. O Nascer do SOL procurou perceber junto do Ministério da Saúde em que fase estava o lançamento da nova PPP e se tal fica afastado até lá, não tendo obtido igualmente resposta até à hora de fecho. 

Em março de 2020, a Unidade Técnica de Acompanhamento de Projetos (UTAP) do Ministério das Finanças deu parecer negativo a uma renovação automática do contrato, mas considerou haver uma existência clara de ‘value for money’ da parceria em relação a um cenário de internalização, recomendando então que fosse iniciado com caráter de urgência o processo tendente à estruturação e lançamento de uma nova PPP.

Segundo a avaliação desta entidade, entre 2012 e 2017, o período de seis anos analisado, a PPP de gestão no Hospital de Loures tinha permitido um poupança de 167,1 milhões de euros ao Estado face aos custos padrão da gestão pública. Uma conclusão idêntica à que tinha surgido aquando da avaliação pela UTAP das PPP de Vila Franca e Braga, tendo apurada uma poupança média anual face à gestão pública de 48 milhões de euros.

As PPP não entram nas comparações de benchmarking publicadas periodicamente pela Administração Central do Sistema de Saúde mas, no capítulo financeiro, a última publicação, de agosto, mostra que o Hospital de Braga, já com gestão pública, surge como o hospital com menores custos por doente padrão entre as unidades da mesma categoria no SNS. Ainda assim, tal como a maioria dos hospitais do SNS, registava em agosto resultados operacionais negativos, com rendimentos inferiores aos gastos. O Hospital de Vila Franca não tem ainda dados financeiros publicados nas plataformas de monitorização do Ministério.