Quando fechamos a porta a alguém antes do início de uma negociação, estamos a colocar-nos nas mãos daqueles com quem aceitamos negociar. Neste caso, ao fechar a porta ao Chega, o PSD colocou-se nas mãos do PS.
Os dois candidatos à liderança do PSD já disseram que não farão coligações pré ou pós-eleitorais com o Chega.
Mais: que não negociarão com o Chega um apoio parlamentar.
Ora, uma das regras da política é nunca dizer nunca.
Quando fechamos a porta a alguém antes do início de uma negociação, estamos a colocar-nos nas mãos daqueles com quem aceitamos negociar.
Neste caso, ao fechar a porta ao Chega, o PSD colocou-se nas mãos do PS.
Percebe-se que o PSD não quisesse fazer uma coligação pré-eleitoral com o Chega.
São dois partidos demasiado diferentes para se poderem juntar numa frente comum.
Mas não se percebe que tenha fechado a porta ao Chega caso não consiga uma maioria absoluta - hipótese altamente improvável.
Percebe-se que o PSD dissesse que o único voto útil é nele, para tentar evitar a dispersão de votos por outros partidos da direita.
Percebe-se mesmo que fizesse do Chega um dos adversários principais, porque é o partido que lhe poderá roubar mais eleitores.
Percebe-se isso tudo.
Mas não se percebe que diga que nunca fará acordos com o Chega, antes mesmo de saber qual será a futura composição do Parlamento.
O Chega, segundo todas as sondagens indicam, será o maior partido da direita a seguir ao PSD.
Significa isto que haverá 0% de hipóteses de formar uma maioria à direita sem o Chega.
Ora, recusando-se a dialogar com Ventura, o PSD, se ganhar as eleições, só poderá formar Governo com o apoio do PS.
E isto era exatamente o que o eleitorado da direita não queria que acontecesse.
O objetivo da direita para estas eleições era afastar os socialistas da área do poder.
Mas, perante este quadro, qualquer que seja o resultado eleitoral o PS continuará sempre ligado ao poder.
Continuará no poder se ganhar as eleições; e continuará na área do poder se for o PSD a vencê-las, pois será determinante para a viabilização do Governo.
A recusa de um acordo com o Chega por parte de Rio e Rangel levanta ainda outra questão.
No debate do Orçamento, António Costa dizia que sempre tinha defendido a inclusão do PCP e do BE no ‘arco da governação’, porque era inaceitável que à partida uma faixa de portugueses fosse estigmatizada e não pudesse estar representada no Governo.
Ora, o mesmo argumento serve para o Chega: será legítimo marginalizar o conjunto de eleitores que ele representa?
É evidente que no Chega haverá muita gente pouco recomendável.
Mas são portugueses.
Que têm direito à sua opinião.
Deve dizer-se que André Ventura não está isento de responsabilidades na situação criada.
Ao subir a parada exigindo três ou quatro ministros para apoiar o Governo, pôs a fasquia a uma altura tal que na prática inviabilizou um acordo.
E a ameaça de fazer cair o Governo dos Açores foi um enorme erro.
É claro que não é agradável ouvir diariamente ataques e insultos por parte de um partido com o qual se tem uma coligação.
E é isto que acontece desde há muitos meses: os dirigentes do PSD no continente fazem coro com a esquerda na diabolização do Chega.
Não é correto.
Mas o Chega tem de se apresentar como um partido capaz de contribuir para a solução e não apenas para o problema.
Querer deitar um Governo abaixo um ano depois de o ter viabilizado faz do Chega um partido pouco confiável, com o qual não é possível fazer acordos estáveis.
E isto pode ser-lhe fatal.
Acabo como comecei. Ao trancarem a porta ao Chega, Rui Rio e Rangel, caso sejam primeiros-ministros, condenaram-se a negociar o apoio do Partido Socialista.
Ou seja: em vez de serem alternativa ao PS, serão muleta ou aliados do PS.
Nesta medida, ao contrário do que a direita sonhava, estas eleições não poderão ser um virar de página.
Não poderão ser o momento da passagem de um Governo com uma lógica de esquerda para outro com uma lógica de direita.
O PSD ficou de mãos atadas.
Ao recusarem um acordo com o Chega, Rio e Rangel incorreram exatamente no mesmo erro que cometeu António Costa quando disse que nunca negociaria o Orçamento com a direita - e acabou encurralado.
As famosas ‘reformas estruturais’, de que a direita tanto fala, ficarão bloqueadas por mais uns bons anos.