As ‘bases’ de Rio…

Após ganhar a votação interna, seria expectável que Rio tirasse do bolso um discurso com grandeza de alma, procurando unir o partido…

Foi um Rui Rio cheio de si, azedo, agitado e tonitruante que festejou a vitória nas diretas do PSD, e agradeceu ‘às bases’ que o reelegeram contra a maioria dos ‘notáveis’ do aparelho, reunida à volta de Paulo Rangel.

Após ganhar a votação interna – longe de conseguir levar ‘o adversário ao tapete’ –, seria expectável que Rio tirasse do bolso um discurso com grandeza de alma, procurando unir o partido, em larga medida zangado e desiludido com ele, e mobilizá-lo para as legislativas de janeiro.

Mas não. Rio fez questão em insistir nos remoques, com destinatários óbvios, e em mergulhar num pouco estimável populismo, como se tivesse as ‘bases’ sentadas na primeira fila, afinal ocupada pelos indefetíveis que lhe sobraram, com relevo para um dos caciques que mais tem contribuído no terreno para lhe angariar votos.

Rio prometeu duas garrafas de champanhe para celebrar. A segunda deve tê-la oferecido a António Costa, que lutou nos bastidores para que ele não caísse, com Ferro Rodrigues e Augusto Santos Silva arvorados em porta-vozes de ocasião. Finalmente, houve uma sondagem desfavorável a Rangel, divulgada nas vésperas das diretas, que, se não foi uma ‘encomenda’, bem o pareceu.

O resultado, como aqui escrevemos, foi um partido com uma risca ao meio. Para António Costa era isto que lhe faltava à direita, antes de dedicar-se ao ‘estado de calamidade’ e ao PRR, como ‘receitas’ natalícias para obter ganhos em janeiro.

Seria um milagre se Rio, mesmo picado’, se revelasse uma alternativa nestes dois meses que nos separam das eleições, quando tal não aconteceu durante os quatro anos em que ‘esperou sentado’ pela implosão do governo.

À esquerda, sem a ‘geringonça’, as coisas parecem igualmente complicadas.

Do PCP ao Bloco e ao PAN, cada um com as suas idiossincrasias, já se percebeu que o eixo central do discurso de campanha será agitar o ‘papão’ do chamado bloco central, acrescentando-lhe os perigos do Chega e dos liberais da IL.

Mas já é uma novidade sentir a extrema esquerda preocupada com a extrema direita, temendo que o seu provável crescimento seja o seu afundamento.

Ventura e Cotrim Figueiredo poderão não trazer nada de muito novo, mas, no extremo oposto, que poderá esperar-se de partidos anti-euro e anti-Nato, admiradores confessos de ditaduras que, em pleno século XXI, mantém cativos milhões de seres humanos?

A ‘geringonça’ foi útil para salvar António Costa em 2015. Serviu, também, para colocar fanáticos na órbita do poder. Desgraçadamente, o país recuou e os números não enganam. Portugal está na cauda do pelotão europeu, ultrapassado pelos membros recém-chegados ao clube de Bruxelas.

Façam-se as contas: comparativamente, abrandou o ritmo de competitividade em vários itens, desde o digital à inovação. Em contrapartida, Portugal desceu três lugares no Índice de Perceção da Corrupção de 2020, publicado pela Transparência Internacional, colocando-se no 33.º lugar, com a pontuação mais baixa de sempre. 

De acordo com esse relatório, Portugal situa-se hoje «bastante abaixo dos valores médios da Europa ocidental e da União Europeia», num índice que continua a ser liderado pela Dinamarca e Nova Zelândia. Ou seja, a Justiça fica no banco dos réus…

Em matéria de rendimento, os portugueses não estão melhor. Segundo o Fórum para a Competitividade, Portugal baixou de um rendimento de 84% da média europeia, em 2000, para apenas 74% em 2018. Foi ultrapassado pela Estónia, Lituânia, Eslováquia, Eslovénia, República Checa e Malta, em termos de rendimento por habitante, o que contraria o discurso com o qual se quer infantilizar as populações ao estilo de que somos, por tudo e por nada ‘os melhores do mundo’… 

Aliás, no debate sobre o OE, Rui Rio, já acossado por Rangel, lembrou-se que era ainda oposição e apontou o facto de Portugal ter sido ultrapassado no PIB per capita, lamentando que «países da antiga União Soviética, países pobres que estão connosco na União Europeia há pouco tempo» tenham conseguido o que parecia improvável. 

Face a este panorama, um líder da oposição deveria apresentar-se com um projeto convincente, para devolver o crescimento ao país e travar o seu empobrecimento, bem como a espiral de impostos. Ou seja: ser alternativa a um governo desgastado. 

Infelizmente, Rio está mais empenhado em proteger-se, mediante um séquito de acólitos obedientes, do que interessado em obter uma maioria e ‘encostar’ os socialistas ‘às cordas’… 
Se lograr em janeiro, uma coligação com Costa, formal ou informal, Rio já se dará por feliz. Será um bloco central de conveniências na partilha do poder.