Paulo Mota Pinto. “O Chega só existe porque o PS trouxe o PCP e o BE para o Governo”

Paulo Mota Pinto, filho do antigo líder do PSD e vice-primeiro-ministro do único Governo de Bloco Central, exclui a repetição desta solução. 

Filho de Carlos Alberto da Mota Pinto, o jurista, professor e político prematuramente desaparecido (foi fundador do PSD e chegou a ser vice-primeiro-ministro), Paulo Mota Pinto é candidato do PSD à Assembleia da República, pelo círculo eleitoral de Leiria. Diz que o PSD é ‘a única solução’ e que acordos políticos só depois das eleições mas afasta um Governo de Bloco Central.

Qual é a sua opinião sobre um eventual ‘bloco central’ no Governo?

O bloco central, no seu sentido verdadeiro, que é uma coligação entre o PSD e o PS, está fora de questão. É uma solução excecional, de último recurso, que só deve ser utilizada em hipóteses de salvação nacional. No entanto, o PSD tem uma estratégia de dialogar com todas as forças políticas, porque entendo que essa é que corresponde à melhor interpretação do interesse nacional. Portanto, o PSD não exclui, nem pode excluir à partida, a possibilidade de acordos com quaisquer forças políticas que sirvam o interesse nacional. Acordos pontuais, evidentemente. Isso não é mais do que uma interpretação correta do interesse nacional, e é isso que os portugueses querem.

Falou em cenários de salvação nacional… como quais?

Necessidade de pedido de assistência financeira, uma catástrofe… só mesmo em casos desses.

Portanto, não fica aqui de fora qualquer possibilidade de diálogo…

Com nenhum partido. Embora evidentemente haja partidos mais próximos de nós, como o CDS-PP, ou à esquerda, o PS, e outros que estão mais afastados… Há um partido com o qual nós excluímos fazer acordos, que é o Chega, por uma questão de extremismo, e nós rejeitamos essas posições. Enquanto não se moderar…

Então a palavra-chave seria ‘moderar’… quer dizer, dialoga com todas as forças, mas quando fala do Chega parece haver alguma hesitação…

Também dialogamos com o Chega, desde que cumpra essa condição de se moderar.

Mas essa condição já vem sendo posta há algum tempo. Até agora, não se moderou, a seu ver?

Não. A posição do PSD é que, até agora, não se verificou.

Num eventual bloco central… o seu pai, em 1983, foi vice-PM. Também gostaria de ser uma espécie de vice-vice-PM?

Não tenho essa ambição. Estou aqui a dar o meu contributo para o partido, e espero poder dar para o país, mas não tenho nenhuma motivação desse género. Parece-me até que os paralelos históricos não são corretos. Na altura verificou-se uma dessas situações de necessidade de salvação nacional. Não me move nenhuma motivação desse tipo, e discordo do paralelo.

Também se tem falado, em termos de coligações, de uma eventual ‘nova’ Aliança Democrática, uma coligação com o CDS-PP. Qual é a sua opinião? O que mudou desde aqueles tempos da AD?

Cada partido apresentar-se sozinho, com o seu programa, com os seus candidatos eleitorais, é a solução natural. Excecional é a existência de uma coligação pré-eleitoral. O PSD decidiu ir sozinho a eleições, e houve vários fatores que pesaram nesse sentido, como o seu posicionamento político, que deverá ser um posicionamento chegado à sua direita, mas social-democrata.

A situação do CDS-PP foi também um fator, de certa forma… também a prestação para os tempos, que os portugueses já entendem que a alternativa ao PS, hoje, é, claramente, o PSD. Esse campo não-socialista tenderá a votar no PSD se quer afastar do poder os socialistas. Isso não exclui a possibilidade, como aconteceu, por exemplo, em 2011, de haver uma coligação pós-eleitoral, mas isso é algo que, depois das eleições, logo se verá.

Em que situação? O que pode levar a isso?

Não quero estar a antecipar cenários. Depende da votação que o CDS-PP tiver, e de um conjunto de fatores, que não podemos antecipar na votação relativa do PSD e do PS, por quanto é que o PSD ganha…

Mas falou de uma ‘situação’ do CDS-PP… isso de alguma forma afeta as conversas entre os dois partidos?

É público que o CDS-PP viveu um período turbulento recentemente, e, ao contrário do PSD, não fez uma clarificação junto dos seus militantes. Isso tem vantagens e tem custos. Referia-me a isso, e não tanto às sondagens. Vamos ver, mas é como disse: nesta altura, cada um deve pedalar na sua bicicleta. Depois da meta, logo se vê.

Mas aí não entra mais na posição de Paulo Rangel, que preferia que cada partido se apresentasse individualmente para as eleições?

Eu não vou comentar nem interpretar agora a posição do Dr. Paulo Rangel. Os militantes já falaram sobre a estratégia que preferiam, e não vou agora analisar a estratégia que era do Dr. Paulo Rangel.

Diz que Rui Rio ‘dialoga com todos’…

Porque é isso que corresponde à interpretação do interesse nacional. 

Mas este detalhe, e foi uma das críticas nas diretas, não poderá minar a posição de Rui Rio como líder da oposição? Tem sido criticado em algumas ocasiões por dar a mão demasiadas vezes a António Costa…

Em primeiro lugar, a 30 de janeiro, não vamos eleger o líder da oposição, mas sim o primeiro-ministro. O que importa agora é saber quem é que os portugueses preferem para liderar o Governo. O que está em causa é isso.

Mas pode-se temer que, sendo eleito, vá ‘dar a mão’ ao PS…

Discordo dessa interpretação. Acho que, justamente, esta atitude de abertura leal, em nome do interesse nacional, com várias forças políticas, corresponde à ideia de que nós pomos o interesse nacional acima do interesse partidário e acima do interesse estreito da oposição. Na minha opinião, os portugueses sabem reconhecer isso. Ser oposição não é gritar mais alto, ser estridente e dizer que não a tudo.

É saber interpretar o interesse nacional e fazer propostas, e isso implica abertura ao diálogo. É, aliás, assim em todos os países. É um índice de subdesenvolvimento político a ideia de que se deve rejeitar o diálogo com outras forças políticos e que é líder da oposição quem fizer mais barulho.

Mas havia quem criticasse que se votava demasiadas vezes lado a lado com o Governo…

Eu rejeito essas críticas. Os militantes também já rejeitaram.

Que efeito deixaram as eleições diretas no PSD, interna e externamente?

Externamente, as eleições internas acabaram por ser um momento de galvanização do partido. Evidentemente, há sempre, antes das eleições e do seu resultado, um momento de divisão, também. Vendo isto de uma perspetiva antecipada, ex ante, não era prudente fazer eleições. Agora, temos de extrair o melhor da realização das eleições e do seu resultado, e ao menos elas representaram um momento de afirmação e de galvanização, que agora se seguirá, penso eu, no congresso. O balanço global pode vir a ser positivo.

Dada a reeleição de Rui Rio como presidente…

Eu fui apoiante do Dr. Rui Rio e acho que a clarificação que o partido fez tem, sem dúvida, aspetos positivos, também na frente externa. Foi dada a palavra aos militantes, que escolheram o projeto que querem que seja levado a eleições. Atribuíram um novo mandato ao atual presidente, desde logo para as próximas eleições.

Como reage às acusações de que Rui Rio estaria a retirar das listas de deputados aqueles que se lhe opuseram nas diretas?

As listas de deputados foram aprovadas por 71% dos votos no Conselho Nacional, com uma votação muito expressiva, penso que não tem sido sempre assim. Há renovação, e penso que os portugueses esperam isso. Renovação, mas que não foi, sobretudo, pelo critério de quem apoiou ou não apoiou o presidente do partido. Há pessoas nas listas que não apoiaram desta vez, ou na eleição anterior, ou sequer nunca o apoiaram. Há até presidentes de comissões políticas distritais que não o apoiaram nesta eleição.

Discordo dessa ideia de ‘limpeza’, mas quando tempos deputados que estão há 12 anos, 16 anos, alguns até há mais tempo, 20, até 40 anos. Como é que alguém, se atreve, nesse caso, a falar em ‘saneamento’, ‘purga’, ou ‘limpeza’… quando é simplesmente renovação? Em 80 deputados, mais ou menos, 28 não continuam. Isto é uma limpeza? Eu acho que não é.

Portanto o lado escolhido nas eleições internas não foi um critério na escolha para as listas?

Há um conjunto de critérios que foram anunciados pelo Dr. Rui Rio, entre eles competência, e também lealdade, mas não lealdade pessoal. É lealdade à estratégia que foi definida. Mas até diria que o principal critério foi o da renovação e competência.

Mas falou em lealdade. Então aceita que seria natural que o Dr. Rui Rio quisesse manter consigo aqueles que o apoiaram.

Esse é também um critério, mas não foi o critério decisivo. Se fosse assim, as listas não tinham sido apoiadas por 71% dos votos. Em 80 deputados, houve 28 que saem, houve mais que não acompanharam o Dr. Rui Rio.

Sobre os critérios para a escolha dos candidatos e o modelo de formação das listas… e em especial a sua, com a sua ligação a Coimbra… não sente que ‘caiu de paraquedas’ no círculo eleitoral de Leiria, apesar de ter algumas ligações a Pombal?

Em relação ao modelo, foi o modelo estatutário com critérios políticos, que acho perfeitamente aceitável. Em relação à minha situação pessoal específica, sou presidente da Assembleia Municipal de Pombal, não são ‘algumas ligações’. Sou presidente da Assembleia Municipal de um dos municípios mais relevantes do distrito, e daí vem a minha ligação, que é, aliás, uma ligação familiar.

Há pouco falou do meu pai. Não se pode dizer que não tenha ligação a Leiria, embora não tenha nascido nem residido lá. Não me considero, de forma nenhuma, ‘paraquedista’. Aliás, penso que, neste caso, o PSD não tem nas suas listas nenhum, ou, pelo menos, quase nenhum candidato nessa situação. Não me revejo nessa qualificação.

Mas far-lhe-ia alguma diferença se concorresse pelo círculo de Coimbra?

O que a Constituição diz é que os deputados representam todo o país, não representam só os círculos eleitorais. Já fui deputado por Coimbra, já fui deputado por Lisboa, agora serei deputado por Leiria, onde também tenho ligação. Não me considero de forma nenhuma estranho a esse distrito, e espero conseguir representá-lo o melhor possível.

O Parlamento ‘coloriu-se’ um pouco mais depois da sua saída, com novos partidos a surgir. E há quem falr da fuga de militantes do PSD para partidos como o Chega e a IL. Tem a preocupação, nestas eleições, de ver essa fuga aumentar?

Não. O PSD é o grande partido do espaço não-socialista. Representa, só por si, bem mais do que três vezes a soma de todos esses outros partidos. Se somar todos, são menos de um terço do PSD. 

Mas a representação dos partidos novos tem vindo a aumentar…

Volto a repetir: se somar todos os outros, são, claramente, menos de um terço do PSD. Portanto, não há esse receio. Claro que este fenómeno já tinha acontecido à esquerda. Ele é tão imputável ao PSD, como é imputável ao CDS-PP, como é imputável a outros fatores políticos, como o surgimento de movimentos extremistas. E veja que não é só à direita.

Veja que também surgiu o PAN, que no espetro não está propriamente à direita do PSD. Portanto, não é algo que tenha a ver especificamente com o posicionamento político, ou que possa ser responsabilidade da estratégia do PSD. A estratégia do PSD é o posicionamento ao centro, porque é aí que está a grande maioria dos votos. Portanto tem uma razão eleitoral, e estratégica. Mas também por uma razão política, porque essa é a vocação do PSD.

O PSD não foi fundado como um grande partido de direita, um partido liberal, ou outra coisa, mas como um partido social-democrata. Claro que a social-democracia é diferente daquilo que era há 40 anos. Tem de ser reinterpretada, atualizada, mas esse posicionamento ao centro é que é o posicionamento correto. Portanto, rejeito a responsabilização dessa estratégia pelo surgimento de partidos à direita. A prova disso é que isso também existiu à esquerda, e existe no centro.

Então o que está por trás do surgimento destes novos partidos, à esquerda e à direita?

Há várias conclusões. Há claramente um cansaço com o espetro partidário atual, que tem a ver até com um cansaço com o próprio sistema, e as pessoas procuram alternativas. Os partidos estruturantes do sistema é que têm de responder a isso, renovando-se.

Por exemplo, não se enquistando nos seus quadros e nos seus dirigentes, mas abrindo-se aos seus votantes, chamando novas pessoas para a política, trazendo ar novo, isso é um ponto importante. Mas também há outras formas de fazer política, mais diretamente, com as redes sociais, por exemplo. Há um conjunto de fatores. Sem dúvida que essa realidade é um desafio para os partidos estruturantes do sistema, um dos quais é o PSD – agora, isso não é devido à sua estratégia política.

Mas acha que se têm adaptado bem a esses desafios?

Sim. O PSD nos últimos anos tem feito uma recuperação sustentada muito relevante, que ficou claro nas eleições autárquicos. Se virmos os últimos mandatos… o PSD recuperou os dois governos regionais, só tinha um das regiões autónomas. Recuperou 30 e tal câmaras, e aí é que se vê… porque esses pequenos partidos não têm representação camarária.

Mas também, ainda são jovens.

Sim, mas não têm praticamente eleitos locais. São, normalmente, partidos muito alimentados de cima para baixo, ou através só de quadros, ou de acesso à comunicação social, mas menos partidos de bases. Correm o risco de desaparecer mais facilmente, assim como apareceram.

Portanto, são voláteis?

Sim, já temos alguns exemplos…

Não acha que nos próximos anos esse fenómeno dos partidos pequenos vai crescer e o Parlamento dividir-se ainda mais?

Há partidos à nossa direita que estão mais afetados por isso do que nós, como é o caso do CDS-PP. À esquerda também aconteceu. O PCP tem vindo num decréscimo contínuo, mas o BE tem tido votações altas, votações baixas… surgiu o PAN, ao centro…

O senhor é apontado para a presidência da Assembleia da República, caso haja uma maioria à direita…

Sobre essa questão, entendo que não faz nenhum sentido essa especulação. Porque agora estamos focados é nas eleições, e isso é uma matéria que se decide depois das eleições.

Mas há sempre alguma discussão prévia…

Não, entendo que não faz sentido. Isso é uma matéria que depende dos resultados eleitorais, de um conjunto de cenários, da vontade das pessoas. É uma especulação destituída de qualquer sentido, pelo menos neste momento.
Não faria sentido os eleitores terem, pelo menos, uma ideia de quem poderá ser o próximo presidente da AR?
Isso depende de vários fatores, e não há propriamente candidato a esse lugar.

Mas não acaba por ser uma discussão prévia às eleições?

Desculpe, mas qual era a questão que me queria pôr?

Queria saber se veria com bons olhos esse cargo.

Eu candidato-me para tentar ajudar o partido e o país. Entendo que o país precisa de uma alternativa, e que o projeto do PSD é que pode corporizar essa alternativa. Decisões depois das eleições, teremos de ver de acordo com a realidade eleitoral e parlamentar, não é nada que possa antecipar.

Mas foi assunto de discussão com Rui Rio?

Foram discutidos muitos cenários. Enquanto se fazem listas são discutidos muitos cenários, mas especificamente esse, entendo que não faz sentido neste momento.

Ainda acerca dessa questão, que desafios lhe parece que o surgimento de novos partidos no hemiciclo apresenta para a presidência do Parlamento, e para a sua organização?

A meu ver, a renovação dos representantes dos portugueses no Parlamento, como aconteceu nas listas do PSD, mas também de alguma forma através de novos partidos, é um aspeto positivo. Tudo o que sejam iniciativas que possam levar os portugueses a rever-se mais acentuadamente nos seus representantes é positivo. A Assembleia da República é a assembleia representativa de todos os portugueses, portanto é importante que as pessoas se revejam nos seus representantes. Isso pode-se fazer através da renovação das listas, ou através do surgimento de novas forças, também.

Em Portugal há uma tradição acentuada e antiga de crítica parlamentar, de antiparlamentarismo, que eu acho negativa. Tem a ver com a falta de cultura democrática muito antiga e muito enraizada. Mas penso que aos poucos se está a esbater, e gostava que isso desaparecesse.

Como se pode fazer desaparecer?

Há um conjunto de iniciativas, que têm a ver também com a qualidade dos representantes. É algo que, neste momento, não se pode antecipar, nem quero. É importante haver esforços para valorizar a assembleia representativa de todos portugueses, e é nesse sentido, também, que eu assumo este dever, como presidente do congresso [nacional do PSD], de não rejeitar, pela segunda vez, uma candidatura a deputado.

A sua pergunta foi se os novos partidos podem contribuir para essa valorização do Parlamento… Tal como a renovação das listas, sim, eventualmente. Mas também podem ter um lado negativo, que é, muitas vezes, de aumentar a discussão política apenas por motivações partidárias, a contraposição de interesses dos partidos que não têm a ver com o interesse nacional… isso tem muito a ver com a prática partidária e parlamentar.

O surgimento de novos partidos no Parlamento pode pôr em causa a ‘dominância’ do PS e do PSD na política nacional, pós-25 de Abril?

O sistema tem tido dois partidos estruturantes, o Partido Socialista, e o Partido Social Democrata. E eu penso que isso é positivo. O sistema partidário português tem-se mostrado resiliente, ao contrário do que aconteceu noutros países, mas que depois também acabam por recuperar essa resiliência. Olhemos para Espanha, houve alterações, mas depois voltou, de alguma forma.

Em Portugal tem havido resiliência, mas também com evolução. Por exemplo, surgiu um partido novo à esquerda, o Bloco de Esquerda, surgiu um partido à direita… o que é importante é o papel estruturante dos dois principais partidos, é uma questão de estabilidade do sistema. Neste momento, é claro que a alternativa a um Governo liderado pelo Dr. António Costa, e pelo Partido Socialista, só pode ser um Governo do PSD.

Individualmente… sem coligações?

Já respondi a essa pergunta… depende do cenário eleitoral. Pode haver negociações pós-eleitorais, por exemplo, com o CDS-PP, mas veremos.

Falou-me em Espanha, e, por lá, há um grande elefante na sala que cada vez cresce mais, chamado VOX. Olhando para lá, receia que esse crescimento possa cruzar a fronteira?

Penso que, em Espanha, o crescimento da extrema direita tem a ver com fatores específicos desse país. Os nacionalismos de algumas regiões, e também não ter havido um corte total com um passado autoritário, uma transição, esse corte foi progressivo, não foi um corte abrupto. Em Portugal, há vários fatores que explicam o Chega.

Quais, pode dar algum exemplo?

Olhe, há um fator que raras vezes é referido, que é o facto de o Partido Socialista ter trazido para a esfera do Governo o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda, a extrema-esquerda. Isso fez, por contraposição, surgir uma oposição mais extremista. Não era por acaso que o Dr. Mário Soares sempre rejeitou essa incorporação na esfera do Governo da extrema-esquerda. Porque sabia que podia surgir uma reação na extrema-direita.

Aliás, também não é por acaso que já vários analistas referiram que, objetivamente, o principal aliado, a principal convergência objetiva do nosso sistema atualmente, é, claramente, entre o Chega e o Partido Socialista. A quem é que convém que o Chega tenha uma grande votação? Ao Partido Socialista.

Isto é uma análise de convergência puramente objetiva, mas é verdade. É claro que o Partido Socialista está interessado nisso, porque prejudicará – enquanto o Chega não se moderar – as possibilidades de um Governo alternativo.

Mas então, diria que o surgimento do Chega é um estilo de ‘reação’ à Geringonça?

Este é um dos fatores. Há outros, que têm a ver com a situação social, com o facto de persistirem dificuldades relevantes, o facto de o país não se desenvolver com força e perder postos. Com o facto de não gerar suficiente riqueza e bem-estar para os seus cidadãos. E insatisfação com o sistema, a falta de resultado das políticas que são anunciadas. Também há alguns escândalos… e isso tudo são fatores que alimentam o Chega. No fundo, são fatores que correspondem a disfunções do nosso sistema.

Disfunções que começaram com o Partido Socialista… ou já viriam de trás?

O Partido Socialista liderou o Governo de Portugal, nos últimos 20 anos, claramente, a maioria do tempo. Talvez 13 anos em 20, não sei a conta exata. Mas é o partido, então depois de fazer uma coligação à esquerda, que se quer apresentar como um partido do regime, e há até alguns que falariam até num perigo de mexicanização. Isso apenas não é assim porque há uma alternativa, que é o PSD.

Agora, a dose maior de responsabilidade tem de ser imputada a quem tem liderado o Governo ao longo dos últimos anos. Porque é que o Chega não surgiu durante 40 anos, e surge durante o Governo do Partido Socialista com apoio comunista e do Bloco de Esquerda? Porquê, e neste momento?

Sobre o ‘raspanete’ de Marcelo Rebelo de Sousa a Rui Rio sobre o comentário a propósito da detenção de João Rendeiro. É uma resposta sensata do PR?

Eu entendo, primeiro, que esse comentário foi mal interpretado, e, segundo, entendo que não é papel do Presidente da República andar a dar ‘raspanetes’ aos líderes partidários. Também entendo que essa afirmação do Presidente da República não deve ser interpretada nesse sentido.

Então qual seria a interpretação correta?

Enfim, perguntaram-lhe sobre essa associação, e ele disse que seria ’falta de noção’, mas não disse que era isso que o Dr. Rui Rio teria querido dizer. Se fosse isso, a meu ver, basear-se-ia numa errada interpretação.

Então essa interpretação é de quem ouviu as palavras de Marcelo Rebelo de Sousa e decidiu interpretar assim?

Eu não posso agora comentar mais alargadamente as posições. Comentando esse tweet, penso que foi mal interpretado, e penso que não é função do Presidente da República dar ‘raspanetes’ aos líderes partidários, mas também entendo que não é essa a interpretação correta das afirmações do Presidente da República. Foi mais uma posição de defesa da Polícia Judiciária e das instituições.

Sobre as eleições legislativas. Hipoteticamente, de volta ao Parlamento, quais são as suas principais ideias e projetos?

Não posso antecipar. Não quero antecipar, porque isso depende muito – já foi assim nas últimas legislaturas em que lá estive – dos resultados eleitorais e da conjuntura política do momento.

Mas, com certeza tem projetos.

Espero poder ajudar o PSD a ganhar as eleições e protagonizar um projeto político, quer assumindo Governo, quer como um partido maioritário na Assembleia da República. Agora, em que papel concreto, não lhe posso dizer, porque isso depende de um conjunto de fatores que nós não adivinhamos.

No caso oposto, assumindo que há uma maioria absoluta para o PS, ou um novo acordo à esquerda, que futuro prevê para o país?

Bem, os portugueses já perceberam que estes acordos à esquerda para preservação no poder do Partido Socialista implicam um preço, que tem custos sérios para o país, a prazo. Custos de crescimento económico, em matéria de desenvolvimento, de criação de riqueza, e até em matéria de políticas sociais, porque sem riqueza não há políticas sociais. E depois, também, custos de estabilidade, porque acabamos por ver que esta situação também não é estável.

Não é só o problema de falta de eficácia e falta de produção de riqueza, mas também falta de estabilidade. Portanto, estou convencido que os portugueses perceberão que esse não é um caminho viável para o país. O que vemos é que o país está numa trajetória de perda sucessiva de posições, por exemplo, no PIB per capita, na União Europeia. Estamos a ser ultrapassados pelos países de Leste.

Penso que é necessária uma inversão de políticas, mais amigáveis das empresas, do crescimento económico e da criação de riqueza, e, portanto, também das políticas sociais, porque libertam mais meios para as políticas sociais. Penso que os portugueses já perceberam isso, e querem uma mudança, e vão tê-la no próximo dia 30.

Essa mudança passa por pelo PSD?

Passa por um Governo liderado pelo PSD. É tão simples quanto isto: quem quer mudar, deve votar pelo PSD, porque se votar por outro partido, qualquer que ele seja… se votar no PS, é porque o quer manter no Governo, se votar noutros partidos, o risco é de que isso, indiretamente, contribua para a manutenção do Partido Socialista, porque não haverá reforço da alternativa.

Isso não terá um efeito bola de neve… levando a que as pessoas não votem nos partidos ‘pequenos’ com esse receio?

Isso eu não sei. Penso que há uma vontade de mudança, e espero que ela exista, porque acho que o país precisa de mudança.

Esteve vários anos no Tribunal Constitucional e está fortemente ligado a Coimbra. Como reage à polémica em torno da transferência do TC para a cidade, e ao parecer que disse ser um ‘grave desprestígio’?

Essa proposta do PSD não se referia só ao TC, referia-se também ao Supremo Tribunal Administrativo. Em segundo lugar, a meu ver, a atitude do PS de bloquear essa proposta é lamentável. É contrária às afirmações e ao programa do PS, e até às palavras do próprio primeiro-ministro. E, depois, foi um bloqueio não assumido, porque, no fundo, esta lei precisava de maioria absoluta para passar, e o PS assegurou-se que ela não existiria, mas não assumiu oficialmente a posição. É também algo que desprestigia a política.

Temos palavras bonitas, de favorecer a desconcentração, a descentralização, mas depois, na prática, não é assim. Portanto, espero que o PSD possa fazer, de novo, essa proposta. O PSD está disponível para dialogar sobre essa proposta, e sobre levar outras instituições para outras cidades. Entendo que o país é um país excessivamente centralizado. Precisa de desconcentrar serviços, isso é um fator de criação de riqueza, ao contrário do que outros pensam, para todo o país, porque a concentração em Lisboa é um fator de empobrecimento, ao contrário do que se pensa muitas vezes.

Quanto à tomada de posição sobre essa matéria dos juízes do TC, a única coisa que tenho a dizer é que o TC é objeto dessa decisão. Essa decisão não é uma decisão que seja tomada pelo TC. O TC é objeto e não sujeito dessa decisão, portanto entendo que nem sequer se deveria ter pronunciado sobre essa matéria, muito menos nesses termos.

Essa diferença entre as palavras bonitas e as ações… como se explica que seja um discurso que se mantenha?

Mantém-se, muitas vezes, pela falta de accountability dos políticos. Pela falta de responsividade, de resposta, aos eleitores. Não são responsáveis perante os eleitores.

Mas eu penso que, hoje em dia, há outros mecanismos, diferentes, de acesso ao eleitorado, e isso tende a expandir-se. É um problema sistemático que temos. O PSD propõe uma revisão do sistema eleitoral, e revisão constitucional, também, que se inicie o diálogo para tentar melhorar essa aproximação. Propõe uma reforma do sistema eleitoral, com círculos eleitorais mais pequenos, a limitação do número de mandatos dos deputados, que já tem levado à prática.

O tema da regionalização foi recentemente debatido, e fala-se num referendo em 2024. Como vê esta possibilidade?

Eu sou um defensor da regionalização. Entendo que, ao contrário do que se pensa, é um fator de criação de riqueza. Tem é de ser bem estruturado. Portugal é um dos países mais centralizados da Europa. Não é o facto de haver regiões administrativas com órgãos políticos que põe em causa a unidade do Estado ou a unidade nacional.

Pelo contrário, pode ser um fator de desenvolvimento das nossas regiões, para acentuar essa grande diferença que há de PIB per capita, de riqueza, por exemplo, entre Lisboa, e o resto do país. A Constituição prevê que deve haver uma lei sobre as regiões, e um referendo. Ao não haver revisão constitucional nessa matéria, esses passos terão de ser dados, e, felizmente, a matéria voltou à ordem do dia.

Concorda com a data de 2024 para a realização do referendo?

Eu não gosto de apontar um ano. Não faço essas estratégias a longo prazo, dessas pessoas que cenarizam a longo prazo, daqui a três ou quatro anos… Não gosto disso. Tanto pode ser uma colocação na agenda como pode ser uma tentativa de adiar. Temos de ver, vários responsáveis políticos falaram dessa data, mas temos de ver depois das eleições.