Benfica. A revolta da classe operária determinou o fim de Jesus

Jesus caiu. Já não é o treinador do Benfica. Em guerra aberta com os jogadores, por causa de Pizzi, obrigou Rui Costa a antecipar o divórcio.

A notícia espalhou-se, inevitável: acabou (diria eu que definitivamente) a relação entre o Benfica e Jorge Jesus. Durante a manhã de ontem, numa reunião entre os responsáveis pelo futebol do clube e o treinador, a decisão de porem fim ao contrato que durava até ao próximo defeso foi tomada, as contas saldadas, e Nelson Veríssimo, até agora treinador do Benfica B, vai assumir o cargo de técnico principal até ao final da época. A morte da sua mãe, na véspera, acabou por ser um toque de profunda tristeza no momento em que é, mais uma vez (substituiu Bruno Laje) chamado à responsabilidade de equilibrar um barco que tem adornado aflitivamente a ponto de estar à beira de se afundar numa maré vazia de títulos.

Num comunicado emitido no início da tarde, o Benfica assumiu a rotura: “O Sport Lisboa e Benfica informa que, de comum acordo entre as partes, Jorge Jesus já não é treinador do Benfica. A Sport Lisboa e Benfica SAD agradece a Jorge Jesus todo o trabalho desenvolvido ao longo do último ano e meio e deseja-lhe as maiores felicidades para o futuro. Mais acrescenta que cumprirá com todas as obrigações contratuais até ao término do vínculo laboral existente ou até que Jorge Jesus e a sua equipa técnica assumam novo compromisso profissional”. Seco e claro.

Confirmando que a saída foi tratada com toda a lisura necessária, o presidente Rui Costa surgiu em conferência de imprensa ao lado do próprio Jorge Jesus, e assinalou o momento com palavras contidas: “Não era este o desfecho que ambicionávamos, como é óbvio. Trabalhámos arduamente para chegar ao fim com os objetivos cumpridos, mas com a mesma frontalidade com que sempre estivemos juntos chegámos à conclusão que este dia acabou por ser o melhor para ambas as partes”. Jesus respondeu na mesma toada: “Para os interesses do Benfica, e para fazer o melhor para todos, achei que esta decisão foi a melhor. A minha vida vai continuar, trabalhando com amor e paixão. Tive a honra de ter voltado a esta casa e ter defendido os interesses do Benfica”. Um abraço entre ambos pôs fim a um dos momentos mais sinistros da história recente do clube. A pobreza, ou mesmo indigência, da exibição encarnada no Porto, para a Taça de Portugal, há uma semana, abalou definitivamente toda a estrutura benfiquista. O desfecho era, mais tarde ou mais cedo, incontornável. O treinador que Luís Filipe Vieira fora arrancar dos braços do Flamengo, ao Rio de Janeiro, perdera por completo não apenas o controlo sobre a equipa, mas também o controlo sobre a comunicação das manobras de bastidores que transmitiam para o exterior a sua vontade de sair. Os dias mais recentes foram de martírio para os adeptos. Exigiam medidas. Rui Costa tomou-as.

Revolta. A partir do momento em que se tornou motivo de especulação a intervenção feita por Pizzi no balneário da equipa, logo no final da dolorosa derrota com o FC Porto, criticando não apenas a atitude dos companheiros como as opções do treinador, a revolta instalou-se. Jesus, castigado, não assistiu aos acontecimentos que terão ficado sanados, temporariamente, pela intervenção de Luisão e de Rui Pedro Braz. Mas o veneno germinava no ovo da serpente.

O regresso ao treinos no Seixal serviu para que Jesus tomasse uma posição de força perante Pizzi que, recorde-se, é um dos capitães de equipa. Sentindo-se desautorizado pelo jogador, resolveu castigá-lo com ordens de se treinar à parte dos companheiros, ficando claro que não contava com ele para o jogo de amanhã, de novo no Porto, agora para o campeonato. Não esperaria, certamente, a revolta maciça da classe operária, que é como quem diz, dos jogadores em bloco, que o enfrentaram e, perante a punição a Pizzi, decidiram não avançarem para o treino que estava marcado, abandonando o centro do Seixal. O último fio que segurava Jesus ao Benfica fora cortado com violência. A situação era insustentável. E, perante o que sucedera, a direção de Rui Costa estava obrigada a optar por uma posição firme e inequívoca. Depois de ter perdido o apoio dos adeptos, que já haviam exigido de forma ou de outra a sua saída, Jesus via a equipa inteira tirar-lhe o tapete. Os resultados medíocres (independentemente da qualificação para a fase seguinte das Champions) e as exibições confrangedoras, contribuíram para que o presidente benfiquista assumisse que o treinador chegara ao fim da linha. Jesus e o Benfica não têm mais nada para dar um ao outro.