Covid-19. Pico de infeções pode chegar mais tarde

Baltazar Nunes, epidemiologista do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, explicou ao i os cenários apresentados na reunião do Infarmed. Reforço da vacina nos maiores de 65 anos foi mais lento do que se estimava em dezembro e pode implicar maior carga de doença, mas maior impacto será nos serviços de saúde de primeira…

A variante Omicron tem mostrado menor severidade e a proteção conferida pelas vacinas contra internamento mantém-se até elevada, em particular depois da terceira dose. Foram algumas das conclusões deixadas pelos peritos ouvidos pelo Governo, Presidente da República e partidos na reunião do Infarmed, que no atual cenário defendem que há condições para aliviar restrições e reabrir escolas mantendo medidas gerais de proteção, uso de certificados em espaços públicos, arejamento de espaços fechados e eventos (desde que seja possível serem controlados) e com circuitos definidos.

As modelações sobre a evolução da pandemia apresentadas na reunião por Baltazar Nunes, do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA), admitem que o pico de casos possa verificar-se entre esta semana e a próxima, com os internamentos a subir ao longo de janeiro – num cenário em que se mantém maior eficácia vacinal, indo até aos 1300 doentes internados em enfermaria e 184 em UCI e, num cenário de menor proteção, 3700 doentes em enfermaria e 453 em UCI, o que já seria o dobro da atual capacidade reservada para a covid-19.

Como se atingirá o pico na próxima semana com as escolas a reabrir e os contactos a aumentar? Ao i, Baltazar Nunes ajuda a perceber os cenários, que como disse na reunião do Infarmed não são previsões mas modelações da evolução da pandemia com base em determinadas premissas. O que os investigadores estimaram, a partir da quadra festiva de 2020, é que no Natal tenha havido um aumento de 25% nos contactos na população e no Ano Novo, já com mais restrições, de 15%. Já na atual semana de contenção, o pressuposto é de que tenha havido uma redução de 30% nos contactos. E é de isso ser de facto assim e do impacto que venha a ter na transmissão que dependerá o momento de pico de infeções, sendo certo que com a reabertura de escolas se espera um novo recrudescimento de contágios mas com menos força que no período de festas. “A verificar-se uma redução de contactos de 30%, o RT passa a ser inferior a 1, e durante esta semana a incidência começa a diminuir. Quando voltamos às medidas anteriores às férias do Natal (inclui escolas abertas), o RT passa a ser superior a 1 e o número de casos voltará a aumentar, mas o máximo já foi observado atrás. Nesta fase, depois do levantamento das medidas pode haver um aumento do número de casos seguido de um plateau (planalto) e de uma descida dos casos no final do mês.”

Se a semana de contenção não tiver esse efeito, o que só se perceberá para a semana, o pico de infeções será atingido mais tarde, podendo vir a ocorrer apenas no final do mês, admite o investigador. “Se a redução for menor ou nula, o máximo de casos de infeção deixa de ser na primeira semana de janeiro e passa para mais tarde, podendo ir até ao final do mês de janeiro”, diz ao i.

Reforço da vacinação mais lento Uma outra premissa no modelo do INSA é de que 90% dos maiores de 65 anos teriam tido a dose de reforço até 17 de dezembro, sendo o reforço de vacinação a melhor medida de proteção nesta fase, disseram vários peritos no Infarmed.

Ontem na reunião do Infarmed o coronel Penha Gonçalves ajustou pela primeira vez os dados de cobertura vacinal à população apurada nos Censos, uma questão que o i já tinha suscitado junto da DGS dado que foi apurado um número maior de idosos do que indicavam as estimativas da população usadas até aqui antes de haver resultados censitários atualizados pelo INE. E atualmente só 83% dos idosos com mais de 65 anos têm o reforço, percentagem que baixa para 62% no grupo dos 60 anos – as projeções do INSA assumem que 90% dos sexagenários recebam a terceira dose no fim do mês. “O valor de 90% foi definido na altura em que fizemos os cenários pois era a nossa expectativa. Não alterámos este pressuposto para promover a necessidade de atingir uma cobertura vacinal com a dose de reforço mais elevada do que a atual. Mas sim, essa é uma limitação que poderá levar a um maior impacto desta onda nos vários indicadores de infeções e hospitalizações, no entanto a diferença não será suficiente para alterar as principais conclusões que retiramos destes cenários”, diz Baltazar Nunes. O alerta do INSA foi de que se espera em janeiro e fevereiro um impacto muito elevado nos serviços de saúde de primeira linha (SNS 24, Farmácias, laboratórios, cuidados de saúde primários e urgências hospitalares) e também no absentismo escolar e laboral. Estimam que o absentismo poderá abranger, consoante os cenários de menor ou maior proteção vacinal, 4% a 12% da população, assumindo que as pessoas isoladas, de quarentena ou ausentes (por exemplo em apoio à família) são, em cada momento, o triplo dos infetados. Dá 400 mil a 1,2 milhões de portugueses isolados ou sem poder comparecer ao trabalho/escola.

Projeta-se, em contrapartida, impacto moderado em UCI e na mortalidade, ontem mais de seis vezes inferior ao que se registava há um ano, mesmo com os diagnósticos em níveis recorde: com os quase 40 mil casos reportados ontem, o país tem uma incidência a 14 dias perto dos 2500 casos por 100 mil habitantes, com Lisboa já acima dos 3200, calculou o i.

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