Futebol. Injeções de Veríssimo não curam gripe da ave

A águia já não é águia e não mete medo a ninguém, perdendo pontos atrás de pontos; o Sporting ganhou ontem em Vizela por 2-0.

A águia real que encabeça o emblema do Benfica já de águia nada tem. É um ser híbrido qualquer, uma ave da qual ninguém sabe o nome, atacada por uma daquelas gripes que atacam aves mas que parece esconder por detrás uma doença muito mais grave e para a qual, neste momento, ninguém conhece a cura. Há duas época e meia que os encarnados se arrastam penosamente pelos sucessivos campeonatos, longe, longe da luta pelo título, sem capacidade competitiva para ombrear com FC Porto e Sporting, e fazendo figuras deprimentes nas restantes provas (ok, ok, mas já começa a ser difícil recordar a vitória frente ao Barcelona). Se Jorge Jesus pode ser apontado como o principal responsável pela devastação da(s) equipa(s), tão pobre e caótico foi o futebol que pôs em prática, há que reconhecer que, apesar do pouco tempo em que entrou para substituí-lo, Veríssimo não se fez notar. Percebe o crítico a dificuldade que caiu sobre os ombros de Rui Costa. Ver-se livre de um treinador que não fora escolha sua e que, pelos vistos, tinha os jogadores todos contra ele, foi uma das faces do problema com a qual até lidou com a maior lisura possível. Fica ainda por saber se a insurreição da classe operária não fragilizou o cargo de técnico da equipa principal. Afinal, descobriu-se que o ovo da serpente germinava um poder paralelo que pode, ou não, continuar estabelecido como uma espécie de COPCON dos tempos do Processo Revolucionário em Curso.

O empate caseiro com o Moreirense (1-1), a exibição mais uma vez confrangedora, mostra à saciedade que Nelson Veríssimo não parece ter nada de novo para dar a um conjunto moribundo. Para além de ter regressado ao sistema de quatro defesas, o que se vê? A mesma descrença, a mesma confusão táctica, a mesma incapacidade de criar jogo ofensivo a não ser à custa de pontapé para a frente e centros em barda para a grande-área do adversário, a mesma fragilidade defensiva que roça o ridículo. Já tínhamos dito aqui que, para o Benfica a época acabou. Mas quem veste a camisola que costumava ter uma águia orgulhosa no peito não pode passar o tempo que resta até Maio a arrastar-se pelos campos do país como o Navio Fantasma do Holandês Voador. Já da última vez que Veríssimo foi chamado ao leme da nau da Luz, dessa vez para substituir o dispensado Bruno Laje, que conseguira desperdiçar sete pontos de vantagem na corrida para o título, se notou que não conseguiu injectar nos jogadores pelo menos um pouco de orgulho e de garra, de tal forma que perderam a final da Taça de Portugal para o Braga de uma forma deprimente. Exigia-se-lhe agora, ainda por cima depois do afastamento do treinador do qual os jogadores não gostavam, que fosse, no mínimo, capaz de lhes puxar pela gana, trazendo à superfície alguma raiva contra o situacionismo que os levasse a superarem-se. Infelizmente para Veríssimo, ele traz consigo a imagem de um conformismo exasperante. Não se consegue evitar olhar para o banco do Benfica e desviá-lo daquele ar de embaraço que o jovem treinador traz consigo, como se, no fundo, soubesse que, apesar da confiança atribuída pela direcção até final da época, não é aquele o seu lugar. E, sinceramente, não é. Nem creio que alguma vez o venha a ser. E, assim, de fracasso em fracasso, o Benfica começou a transformar-se num cemitério de treinadores do qual nenhum sai vivo com uma história para contar.

Voando O leão pode ser bicho que não tem asas, mas os de Alvalade vão continuando a voar no campeonato depois da surpreendente derrota nos Açores frente ao Santa Clara. A sua diferença para os pobres vizinhos da Segunda Circular é tão profunda quanto se pôde ver em campo quando os dois se defrontaram no Estádio da Luz. Ontem foi a Vizela ultrapassar mais um obstáculo, vencendo por 2-0, com golos de Pote (28 minutos) e Daniel Bragança (42).

Quanto ao Belenenses SAD – FC Porto, terminou depois da hora de fecho desta edição.

No curto período de dois anos, o equilíbrio que (não) havia entre os dois rivais de Lisboa virou-se do avesso, invejando agora os encarnados a saúde desportiva dos verde-e-brancos. Sinal que a crise directiva que rebentou na Luz deixou muitas metásteses e que, provavelmente, continuará a marcar a competitividade (sobretudo a falta dela) da antiga águia que metia medo fronteiras dentro. O futuro não parece abrir-se alegremente na frente da tão recente presidência de Rui Costa. Mas também nunca as feridas estiveram tão expostas e nunca foi tão fácil apontar as lacunas de qualidade de um plantel desequilibrado demais. Encontrar o treinador certo vai obrigar a puxar pelas meninges.