O vírus não faz pausa

A oportunidade de vacinar nas semanas de pausa letiva não foi bem aproveitada. Uma gestão otimizada, tinha permitido vacinar os mais velhos com a 3.ª dose de reforço, em simultâneo com mais dias de Casa Aberta para crianças e profissionais da comunidade escolar. 

Por Vânia Mesquita Machado, pediatra

Priorizar é sinónimo de escolher o mais importante, quando há muito por fazer. Simplifica a vida, e ajuda a obter melhores resultados.

Em plena subida de pico pandémico a coincidir com a campanha eleitoral, o vírus não faz pausa para reflexão.
Importa o debate de ideias, para decidir conscientemente quem nos vai governar nos próximos anos? Sem dúvida.
Em causa o futuro de todos, a depender também da evolução da onda pandémica.

Como Pediatra, observo com preocupação o aumento exponencial de casos de infeções covid em crianças, expectável pela reabertura escolar, mas cujo desfecho ninguém pode prever com exatidão.

Em pandemia, já aprendemos que só agir em tempo útil permite evitar doença grave e mortalidade. 

Os decisores têm de ser pró-ativos: consoante factos, agilizarem meios para conseguir fins, tendo em conta o superior interesse de todos. 

A pressa é inimiga da perfeição. Não se equacionam medidas intempestivas ou imprudentes mas as adequadas à realidade, tal como o vírus, em constante mutação.

Peritos em Imunologia e Saúde Pública já se pronunciaram sobre a importância da vacinação incidir mais na faixa etária pediátrica, onde o vírus predomina.

Com a polémica a dificultar o processo de vacinação, foram vacinadas até agora mais de 300.000 crianças. 
Não é um sucesso, pois são elegíveis nesta idade mais de 600.000 crianças. 

Sem uma ampla cobertura vacinal, é impossível travar a velocidade da infeção em idade pediátrica, cujas consequências poderão ser graves. 

A oportunidade de vacinar nas semanas de pausa letiva não foi bem aproveitada. Uma gestão otimizada, tinha permitido vacinar os mais velhos com a 3.ª dose de reforço, em simultâneo com mais dias de Casa Aberta para crianças e profissionais da comunidade escolar. 

Águas passadas não movem moinhos. 

Urge reorganizar a vacinação nas crianças com auto agendamentos abertos, o mais rapidamente possível. Esta é também a opinião do gabinete de crise da Ordem dos Médicos, sendo importante reduzir o intervalo entre tomas.
Quem está na área da Saúde, não compreende o motivo desta espera.

É eleitoralista? Não sou política, mas não vejo nenhum partido preocupado com este assunto. Excluindo os de índole negacionista, intuo algum receio de descida nas sondagens. 

Que adianta incentivar os pais a vacinar os filhos, se não o podem fazer a curto prazo?

Como Pediatra e Mãe, estou também apreensiva com o Ensino. 

Se há um ano por esta altura, escrevi um artigo a pedir o encerramento urgente das escolas, felizmente hoje as circunstâncias são outras.

Nos adolescentes, maioritariamente com esquema vacinal completo, o 1.º período decorreu com mais normalidade.
Estas primeiras semanas foram bastante menos produtivas, mas as escolas foram funcionando para os mais velhos, sem necessidade de isolamento em caso de surto na turma, exceto se teste positivo. 

Não o ideal, mas o possível.

Fechar escolas atualmente só deve ser considerado em caso de situação calamitosa.

O ensino online não é inclusivo. Quem mais perde são os alunos do ensino público,sem as mesmas ferramentas que os do privado para garantir alguns frutos da aprendizagem não presencial (sempre poucos).

O período de eleições não deve interferir com a tomada de decisões importantes.

A transmissibilidade incide agora maioritariamente nos mais novos e ser pró-ativo exige a revisão do processo vacinal sem perder tempo, para não aumentar ainda mais os prejuízos psicológicos e a nível da aprendizagem.

A saúde de todos não pode aguardar pelo resultado da votação das legislativas.