Porquê votar?

Eu voto. Não porque veja um candidato que me enche as medidas. Mas porque amo Portugal e o seu futuro. Estimo a democracia portuguesa.

Por Pedro Ramos

Nova Iorque, janeiro 2022

 

Queridas Filhas,

 

«Democracy is the government of the people, by the people, for the people

Abraham Lincoln

 

«Uma das desvantagens de não participar em Política é ser governado pelos nossos inferiores»

Platão 

 

«Democracy is the worst form of government, except for all the others that have been tried»

Winston Churchill

 

«Pessoalmente chamo a um governo que pode ser removido sem violência ‘Democracia’, aos outros ‘Tirania’»

Karl Popper

 

«Politicians and diapers must be changed often, and for the same reason»

Mark Twain

 

Acabo de fechar o envelope com o meu voto para as eleições no meu Portugal. Emigrantes como eu apenas elegem 4 deputados. Muito pouco. Mas não diminui o meu entusiasmo e gosto em votar. Durante séculos e séculos muitos dos nossos antepassados por esse mundo não tiveram voz no governo do seu País. Em muitos países isso ainda hoje sucede. Noutros, eleições ocorrem, mas com resultados condicionados desde o início. Eleições livres são algo frágil. As democracias da antiguidade em Roma e Atenas caíram. Hoje em dia muitos propõem que a Democracia poderá não ser a melhor forma de governo, apontando o exemplo da China e de outros governos asiáticos.

Este tesouro frágil que herdamos custou caro aos nossos antepassados. Muito sangue foi derramado, muitas perseguições e sonhos perdidos e demasiadas famílias destroçadas. Valeu a pena?

Não faltam exemplos de problemas com democracias. Incompetência, corrupção, orientação de curto prazo seguindo o ciclo eleitoral, tirania dos aparelhos partidários… Há sem duvida custos em aceitar uma democracia. Mas qualquer instituição humana tem falhas. Não há humanos perfeitos e isso amplifica-se em qualquer organização humana. A democracia assegura que regularmente o poder, todo ele, volta aos votantes para ajuizarem qual o melhor trilho a percorrer para a frente. Isso leva a correções de rumo regulares. Como nos lembra Mark Twain, os políticos, tal como as fraldas, precisam de ser mudados com frequência. Sem o voto popular regular, isso torna-se muito difícil, especialmente com políticos e líderes de caráter forte e carismático.

A vida quotidiana tende a adormecer-nos das bênçãos que recebemos todos os dias. Segurança, saúde, liberdade, participação cívica, confiança nas instituições, até mesmo o oxigénio que respiramos. Só pensamos nessas bênçãos quando nos faltam. Seria um grande erro pensar que as teremos sempre. Muitos são os exemplos de sociedades e civilizações que colapsaram depois de estarem no topo. 

Por isso todos temos a responsabilidade de participar na democracia. Sentiremos a sua falta se a perdermos. Participamos como votante. Mas também como cidadão. Servindo o país e os nosso concidadãos naquilo que for preciso. A minha responsabilidade é deixar uma melhor sociedade, economia e democracia para vocês e os vossos filhos. Espero que vocês continuem esta tradição familiar.

Sempre me impressionou aqui nos Estados Unidos as filas de centenas de metros já às seis da manhã para votar. Isto sabendo que as eleições são sempre em dia de trabalho aqui (terça-feira). Que patriotismo e sentido cívico! Impressionam-me também as muitas pessoas que conheço que consideram um privilégio servir o seu país quando chamados pelo Presidente dos EUA (independentemente do partido). A grande maioria serve sem pedir qualquer compensação financeira (pois também assim o podem). Exemplos destes dão-me muita esperança para o futuro das democracias por todo o mundo.

Nas últimas décadas os governos têm aumentado a sua esfera de intervenção dramaticamente. Não só na economia como também em organizações intergovernamentais e mesmo em matéria de conteúdos/ideologias de educação e políticas familiares como o aborto e eutanásia. Por outro lado, o governo da União Europeia é composto por comissários europeus que não são eleitos. O Parlamento Europeu tem muito pouco poder. Tudo isto torna excessivamente complexo escolher em quem votar e enfraquece o processo democrático. Dificilmente um candidato se alinhará com tudo em que acreditamos. Apesar disso, depois de eleitos os políticos frequentemente sentem-se autorizados a prosseguirem 100% o seu programa e opiniões. Como sociedade temos que refletir como prevenir esta perca da voz do cidadão em tantas matérias. Penso que uma conceção mais minimalista do papel do governo na sociedade assim como um aumento do número de referendos seria importante para fortalecer o processo democrático.

Apesar disso eu voto. Não porque veja um candidato que me enche as medidas. Mas porque amo Portugal e o seu futuro. Estimo a democracia portuguesa. E acredito que a participação de todos na vida pública aumenta a probabilidade de os melhores dias da nossa bonita história ainda estarem pela frente. Construídos por vocês e pelas gerações que se seguirão.