Não fique em casa

Há meses, quem diria que a solução de governabilidade estaria nas mãos de Rio? E, para já, está. Mesmo com uma vitória do PS

As previsões apontam para um domingo de sol, ainda que frio, como têm sido estes últimos e magníficos dias de um janeiro demasiado seco.

Já quase ninguém tem medo da covid-19, são mais os que têm a terceira dose da vacina do que os eleitores que habitualmente vão às urnas, as indicações das autoridades de saúde, jurídicas e políticas são para que mesmo os que estão infetados ou em isolamento o devem desrespeitar e ir às urnas depositar o seu voto.

As opções são muitas e cobrem todo o espetro político, da extrema esquerda à extrema direita, a campanha eleitoral foi esclarecedora – até os debates televisivos, num modelo inicialmente tão criticado, acabaram por permitir um melhor conhecimento dos líderes partidários e das propostas que vão defender no Governo e no Parlamento – e, segundo as sondagens (que desta vez defenderam-se chegando a registar impensáveis variações entre os principais partidos de cinco pontos percentuais de um dia para o outro e sem razão evidente) está tudo por decidir.

Por isso, quase dois anos depois do tristemente célebre ‘Fique em Casa’, e mesmo com todas as incongruências que possam apontar-se ao discurso das autoridades de Saúde e dos políticos (que, na verdade e em matéria de pandemia, tem estado sempre repleto de incongruências), a ordem agora é a contrária: não fique em casa, saia, vá votar, é um direito mas é também um dever cívico e o estado a que o país chegou não lhe permite a indiferença e se tiver de infetar-se ou reinfetar-se, pelos vistos e afinal, já não há drama.

Porque não é indiferente uma vitória de António Costa ou de Rui Rio – apesar de tanto se terem propalado as semelhanças entre ambos ou entre o modelo que defendem para a economia e para o país – e entre uma maioria parlamentar de esquerda ou de direita.

Há três meses, quando sentenciou que o chumbo do Orçamento do Estado para 2022 teria como consequência direta a dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições legislativas antecipadas, o Presidente Marcelo alertou os partidos de quem dependia ainda a sua aprovação – e particularmente o PS de António Costa, que foi quem mais forçou a crise política e encostou à parede PCP e BE – para a eventualidade de o cenário delas resultante poder ser idêntico ou até ser-lhes mais desfavorável na construção de uma solução de governo.

Na altura, Marcelo Rebelo de Sousa ainda tinha a esperança de que houvesse uma mudança de líder no PSD – mas Rui Rio far-lhe-ia a desfeita de conseguir a reeleição e ser ele o candidato dos sociais-democratas a primeiro-ministro.

E a verdade é que, depois de toda a azáfama que antecedeu a marcação de eleições por forma a poder satisfazer todos os calendários de uma hipotética alteração na liderança do principal partido da oposição, Marcelo acabou por recolher ao Palácio de Belém e aí permanecer com discrição tal que nem quando confinado esteve tanto tempo fora dos holofotes mediáticos.

O Presidente da República só foi chamado à liça na campanha eleitoral por António Costa, que invocou por mais do que uma vez o seu nome para apelar a que o eleitorado lhe desse uma maioria absoluta – disse o líder socialista que os portugueses não deviam ter medo de lhe dar uma maioria absoluta porque o Presidente da República, sendo quem é, jamais lhe permitiria pisar o risco.

Estranha estratégia esta a de Costa. Uma maioria absoluta reclama-se, exige-se mesmo. Não se tenta justificar e muito menos se mendiga. E não se faz depender de terceiros o que se pretende que seja um depósito de confiança total do eleitorado na sua pessoa.

Pior do que de pólvora seca, este tiro de António Costa foi daqueles que saiu pela culatra. Ou fez ricochete. De tal forma que, mais depressa do que perdeu o receio de expressamente pronunciar a palavra ‘absoluta’, qual cowboy que dispara mais rápido do que a própria sombra, voltou a afirmar a sua abertura ao diálogo com todos e mais alguns menos o Chega.

Ora, com Costa a ver a maioria absoluta por um canudo e sendo irrepetível nova geringonça, por mais que PCP e BE ainda sonhem com ela, não deixa de ser curioso que a solução de governabilidade mais previsível, pelo menos para já e até ver, esteja nas mãos de quem à partida era menos provável, ou seja, precisamente Rui Rio.

Seja o PSD ou o PS o partido mais votado no domingo.

A política tem destas coisas…

Não deixe de ir votar. 

Mas com todos os cuidados. 

Por todas as razões e mais esta: apesar de tudo, a covid continua a matar.