Boris Johnson de rastos

Os britânicos souberam que o rebelde folião que elegeram primeiro-ministro deu festa atrás de festa em pleno confinamento e não gostaram. Johnson afunda-se nas sondagens e as revelações continuam.

Boris Johnson de rastos

Subitamente, Boris Johnson deu pela sua carreira política moribunda. Após anos de maquinações e combates na retaguarda dos conservadores, seria esperado que estivesse a desfrutar de um estado de graça, do estatuto de vencedor da batalha do Brexit. No entanto, se ter como primeiro-ministro um rebelde bem-humorado, disposto a quebrar quaisquer regras para enfrentar a Europa podia agradar a muitos britânicos, não acharam tanta piada quando este foi acusado de violar as restrições contra a covid-19 que o seu próprio Governo aprovara.

Que o círculo próximo do Johnson vivia um ambiente folião no n º10 de Downing Street, enquanto o resto do Reino Unido estava confinado, seria uma notícia que há uns meses não surpreenderia ninguém. Afinal, o primeiro-ministro britânico não se afirmou sempre como bon vivant? Não era sabido que fazia questão de não levar nada demasiado a sério – mostrando-se algo desajeitado, expondo-se a gaffes, rindo e abananando bandeirinhas para as câmaras quando ficou preso numa tirolesa, em pleno Victoria Park, nos Jogos Olímpicos de Londres de 2012, dando origem a inúmeros vídeos virais ou despenteando o seu cabelo antes de debates – para se esquivar às críticas? Porque é que haveria de levar a sério regras contra a covid-19 e coibir-se de passar um bom bocado? 

A grande surpresa foi a reação visceral do público britânico. A ideia que ministros, secretários de Estado, funcionários e assessores passaram um bom bocado, enquanto tantos britânicos sofriam, se sentiam sozinhos, perdiam entes queridos e não podiam ir ao funeral – a própria rainha Isabel II viu-se obrigada a sentar-se sozinha, no velório do marido, o duque de Edimburgo Filipe, para cumprir as regras contra a covid-19, emocionando os britânicos – parece ter sido demais. Uma sondagem recente da YouGov mostra que 62% dos britânicos querem que Johnson se demita, incluindo 38% dos eleitores conservadores. Agora, o escândalo virou caso de polícia, tendo sido lançada uma investigação à festas durante confinamento em Downing Street e Whitehall, centro administrativo do Reino Unido, esta semana. E 74% dos britânicos concordam com a decisão da comissária da polícia metropolitana de Londres, Cressida Dick, em investigar o Governo de Johnson. 

Escândalo em curso

Entretanto, a imprensa britânica entretém-se a ir desenrolando o novelo das festas fura-confinamento do Governo britânico. Há sempre uma festa nova a surgir, numa torrente constante de manchetes que não deixa ninguém esquecer o caso, para desespero de Johnson. Quem estará tão habilmente a vazar informação à imprensa também é alvo de especulação. Sendo certo que é gente do seu círculo próximo, possivelmente ligada aos seus rivais dentro do partido conservador – como o seu ministro das Finanças, Rishi Sunak,ou a ministra dos Negócios Estrangeiros, Liz Truss -, que já fazem campanha nos bastidores, antevendo estar para breve a queda do primeiro-ministro. 

A lista de festas em 2020 é longa. Entre os principais escândalos está um convívio no jardim, a 15 de maio, de que o Guardian obteve uma foto – na imprensa britânica é notado que, pelo ângulo de que foi tirada, o fotografo parece estar numa sala utilizada pela equipa do ministro das Finanças. Estavam presentes cerca de vinte pessoas, incluindo Carrie Symonds, a então noiva de Johnson, com quem este conversa animadamente na foto, tendo o Governo tentado justificar o encontro como sendo uma reunião de trabalho. 

Dias depois, a 20 de maio, veio a grande festa de Downing Street, para qual foram convidadas uma centena de pessoas, tendo sido instruídas pelo próprio secretário privado de Johnson, Martin Reynolds, a «aproveitar ao máximo este tempo maravilhoso», pedindo-lhes que «tragam as vossas próprias bebidas», mostra o email obtido pela ITV. A 19 de junho haveria uma festa de aniversário surpresa para Johnson, organizada pela sua esposa, juntando-se umas trinta pessoas dentro de casa, com direito a  bolo e tudo, após se cantar os parabéns ao primeiro-ministro, avançou o canal britânico.

Haveria bastantes mais convívios em 2020, bem como em 2021. Foi o ano passado que ocorreu uma das festas que mais chocou os britânicos, na véspera do funeral do duque de Edimburgo, quando o país estava oficialmente de luto, avançou o Daily Telegraph. Soube-se que houve música, garrafas de vinho levadas para Downing Street dentro de uma pasta, obrigando o próprio primeiro-ministro a pedir desculpa à rainha Isabel II.