O mundo rendido ao inglês segundo Moita de deus

Lançado a 1 de fevereiro, Pax English – A Nossa Tribo é o mais recente livro de Rodrigo Moita de Deus, que escreve sobre a forma como as línguas moldaram países, regiões e conflitos.

O mundo rendido ao inglês segundo Moita de deus

Pax English – A Nossa Tribo é o título do mais recente livro de Rodrigo Moita de Deus, que sairá para as bancas a 1 de fevereiro. A obra pretende mostrar a forma como as línguas moldaram países, regiões e conflitos. E como podem voltar a fazê-lo no futuro.

Ao Nascer do SOL, Rodrigo Moita de Deus explica como surgiu a ideia. «Tem a ver com uma discussão à mesa que não ganhei e quando cheguei a casa decidi: vou escrever o livro». 

Discussão essa que se prendia com «a influência ou não da língua portuguesa no mundo». Por isso, o livro «defende que, quantos mais quilómetros de autoestrada construímos e quantos mais quilómetros de fibra ótica colocamos no mundo inteiro, mais línguas vão morrer. E, de facto, elas estão a morrer», acrescenta Rodrigo Moita de Deus, que não tem dúvidas de que um terço das línguas vai «morrer nas próximas décadas». Mas defende que essa tendência não é «obrigatoriamente má». Aliás, «é bom para a humanidade», porque «significa mais paz e mais entendimento entre os homens».

Pax English – A Nossa Tribo tenta então demonstrar o princípio da Torre de Babel. «A tendência será a eliminação de línguas. Se o Português vai ser uma das línguas que sobram no final é que é uma questão interessante. Não tenho a certeza que seja, vamos ver».

Para escrever este livro foram precisos cinco anos durante os quais o autor fez várias viagens. «As viagens servem quase de pretexto para contar cada um dos episódios que está no livro. Não fiz viagens de propósito por causa do livro, foi em trabalho. Mas, de facto, estava muito sensível à matéria», diz, acrescentando que não houve um único dia em que não trabalhasse nele. «E é muito engraçado depois quando vamos para o terreno e encontramos aquilo que normalmente só encontramos nos livros mas visto de outra forma», comenta, lembrando a própria definição de tribo que serve de arranque ao livro: «Em África a definição de tribo não tem nada a ver com política nem com etnia nem com cor da pele. Tem a ver com a língua que falamos», finaliza.

 

Prefácio do Presidente da República 

Marcelo Rebelo de Sousa aceitou o desafio do autor de prefaciar a obra. «O professor Marcelo é muito defensor da língua portuguesa», justifica Moita de Deus, salientando que tem com o atual chefe de Estado, com quem colabora, uma relação de amizade de há muitos anos. «Tenho uma grande admiração por ele e achei que ele ia achar graça ao livro e ao tema. E, de facto, achou tanta graça que resolveu discutir o tema do livro no prefácio, dizendo que não tinha obrigatoriamente razão. Esta troca de ideias é importante». conclui.

Marcelo Rebelo de Sousa, no prefácio, escreveu:

A presente obra deixa-nos uma tripla sensação, após uma leitura longa e atenta, que longo é o percurso do autor e convidativo à dispersão do leitor:

Sensação de já esperado.

Sensação de quase óbvio.

Sensação de provocação estimulante.

Sensação de já esperado naquilo que é o conhecido tropismo viandante de quem escreveu as linhas, ou, melhor, as interessantes páginas que se seguem.

Muito ao sabor do retrato habitual do português nómada, ele adora viajar, derrubar fronteiras, conhecer gentes e lugares, percorrer o mundo.

Logo, este seu périplo era – mais dia, menos dia – matéria-prima de excelência para essas evocações de um errante por gosto e até por saudável premeditação.

Deste lado, pois, nada de novo.

Ao mesmo tempo, sensação de quase óbvio.

Porque quem atravessa oceanos e continentes, inevitavelmente, confirma a evidência do inglês como língua franca universal.

Latim da globalização dos dois séculos derradeiros ou quase, para usar paralelo do começo da História (ou, se quisermos, da transição da Pré-História para a História no cosmos que seria o nosso).

Entender essa supremacia da língua inglesa, fruto do Império no qual o Sol se não punha e, sobretudo, da posterior afirmação da superpotência Estados Unidos da América – abre muitos caminhos, que o autor enuncia ou mesmo aprofunda.

O inglês presente noutras potências dos anos 80 ao presente.

Ou unificador de Estados subcontinentais. Ou ganhando peso numa integração europeia, nascida francófona. Ou revelando plasticidade particular para lidar com os novos e novíssimos meios de comunicação e com o digital. Ou revelando uma durabilidade ortográfica notável Ou fazendo ponte entre o escrito e o falado sem dramas insuperáveis E o argumentário poderia ser enriquecido sem cessar.

Mas a grande novidade desta digressão muito peculiar reside noutra sensação. A sensação de provocação estimulante.

A provocação que respeita à nossa língua. A língua portuguesa. No que já tem, também ela, de universal.

No que significa de liderança no hemisfério sul.

No que une todos os continentes e oceanos, como só o inglês e o castelhano logram averbar.

No que vai mais longe em inovação permanente, até por cruzamentos, de que os diferentes crioulos são expressivamente paradigmáticos.

No interminável debate acerca das ortografias, que promete manter vivos múltiplos modos de exprimir o mesmo português.

Por escrito, antes do mais.

Ora, esta provocação é estimulante, para não dizer muito estimulante.

Intima-nos a olhar mais, e mais detidamente, para a língua portuguesa.

A investir nela o que, nem sempre, temos investido. Em politicas públicas. Em projetos da chamada sociedade civil. Em mobilização cidadã.

A valorizar quem a estuda. Pessoas e instituições.

A acarinhar quem a cultiva. Nos mais variados planos.

A fazê-la chegar aos povos que foram, são e serão a sua razão de ser.

A pensar nela, pensando nos mais jovens. E no futuro ainda mais dilatado, de que são portadores.

E eis como a imparável imaginação de Rodrigo Moita de Deus nos ofereceu um roteiro das suas viagens.

Mais um guia do seu esperanto, nestes dias tão óbvio.

Mais um apelo instante para sermos universais cumulativamente no inglês que a realidade há muito nos impõe e no português que nós próprios, por nossa iniciativa, deveríamos fazer questão de alimentar.

Assim lido, este exercício meio de viagens, meio de divagações culturais, meio de chamadas de atenção tão evidentes quanto olvidadas este exercício, escrevia, promete proporcionar-nos uns bons serões de outono.

Com aquele acicatante otimismo de jovem que se recusa a envelhecer e tem por nome de guerra Rodrigo Moita de Deus.