Produtores têm de abater animais com apoios de há 20 anos devido à gripe das aves

Proibição de importação de Hong Kong não é o que mais preocupa o setor, habituado a lidar com a resposta à gripe aviária, que é um risco sobretudo para as produções. É sobretudo que a população perceba que o consumo é seguro e que as medidas pedidas a quem tem aves tenham apoios ajustados –…

A gripe das aves está a fazer alguns estragos nas exportações portuguesas de aves, nomeadamente na carne de frango. O mais recente caso vai para Hong Kong que proibiu a importação de frango – e derivados, incluindo ovos – de Lisboa, após terem sido detetados focos de gripe aviária.

Segundo o Centro para a Segurança Alimentar da região administrativa especial chinesa, a decisão tem como objetivo “proteger a saúde pública”, na sequência de uma notificação da Organização Mundial de Saúde Animal, obrigatória nestes casos. Hong Kong, que em 1997 viveu os primeiros casos de transmissão do vírus H5N1 a humanos, tem das abordagens mais cautelosas e já tinha, aliás, suspendido também a importação de frango de Santarém, em janeiro, e de Leiria, em dezembro, depois de terem sido registados surtos de gripe aviária H5N1. Além disso, tem interdita a importação de carne de aves de algumas zonas da Alemanha, Suécia, França, Polónia ou Coreia do Sul, países onde também foram detetados casos em aves.

Pedro Ribeiro, secretário-geral da Federação Portuguesa das Associações Avícolas (Fepasa), começa por salientar que esta suspensão está, antes de mais, prevista na lei.  “As regras que estão em vigor para esta doença para uma questão de sanidade animal preveem que os países possam, preventivamente, adotar este tipo de medidas”, começa por explicar ao i. Assim, a decisão tomada por Hong Kong “é uma situação que está prevista nas regras internacionais e, portanto, não tem nada de extraordinário”, acrescenta o responsável, lembrando que foi apenas suspensa a importação nos locais em questão e não no país inteiro. 

Pedro Ribeiro considera que o impacto no setor desta decisão não é extraordinário, “uma vez que não é um dos nossos principais destinos de exportação”. No entanto, há uma situação com a qual se mostra preocupado, que é “o efeito colateral que isso poderá ter, nomeadamente na opinião pública portuguesa. Isto porque é necessário salvaguardar que não há nenhum risco de transmissão da doença aos humanos através dos produtos. Seja de ovos ou carne. Não existe nenhuma evidência que isso possa acontecer”, diz, acrescentando que “existe um pequeno risco – e é mesmo pequeno porque há poucos casos mas já existiram – da transmissão de animais vivos infetados, do contacto com animais vivos”. E, portanto,  as pessoas que contactam com aves vivas, essas deverão ter algumas precauções, nomeadamente se estiverem em zonas de risco”, alerta.

Não foi apenas Hong Kong que suspendeu esta importação. Segundo o secretário-geral da Fepasa, já o fizeram também Singapura, Japão, Marrocos, Israel, Coreia e Rússia. “Não são grandes importadores”, embora dentro destes haja dois que se destacam: Israel para os ovos e Marrocos para os pintainhos para criação, animais vivos, diz Pedro Ribeiro. “Era um mercado relativamente importante e até nos preocupa um bocadinho. Os outros é relativo”.

E dá números: os valores de exportação para o conjunto dos oito países que impuseram restrições  às importações de Portugal representaram, em 2021, 8,4 milhões de euros em exportações, dos quais 6,85 milhões pertencem à Rússia.

Países europeus são os principais clientes Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística, enviados ao i, no total, Portugal exportou, em 2020, só em carne de frango, 11.875.852 quilos, o correspondente a 16.334.219 euros. A maior fatia vai para  os galos e galinhas, não cortados em pedaços, frescos ou refrigerados, num valor global de 7.288.206, vendas de 10.916.976 euros.

E os valores preliminares de 2021 mostram uma grande subida face ao ano anterior: Portugal terá exportado 19.593.773 quilos de carne de frango, num valor global de 28.111.204 euros, quase o dobro do ano anterior. O principal mercado é Espanha, Seguem-se países como França, Guiné, Polónia ou Luxemburgo. Na lista, Hong Kong aparece praticamente em último lugar, com os dados de 2020 a apontarem para apenas 720 quilos e 1.880 euros.  

O responsável acrescenta também que os principais mercados portugueses são “essencialmente os países europeus” como é o caso de França, Espanha, Alemanha ou Inglaterra, mas também alguns  africanos como Congo, República Centro Africana. E, aqui, não há problemas: “Nenhum destes mercados que cancelou é dos nossos principais mercados de exportação”. Na Europa, a limitação de circulação de mercadorias coloca-se apenas em casos excecionais e praticamente todos os países da UE têm tido casos pontuais de aves com H5N1.

Doença, produtores e prejuízos A esta altura são outras as contas feitas pelos produtores. Ao i, Pedro Ribeiro explica que esta é uma doença muito contagiosa para os animais e que tem medidas de segurança “muito rígidas”. “De imediato, quando aparece um caso, é decretada uma zona de 3km à volta desse foco, que é uma zona de restrição. E depois mais 7km – ou seja, até um raio de 10km ao redor desse foco – uma zona de vigilância”, explica. Isso significa então que todas as explorações com aves que tiverem nesses círculos vão ser rastreadas, “os animais vão ter que ser analisados para ver se há mais algum caso e, se não houver, tudo bem, ficam de quarentena”. E mesmo aqui existem depois algumas restrições às movimentações, “só com declarações especiais e sob vigilância mas não há problema”.

Já nas explorações em que é detetado algum caso, “todos os animais dessa exploração têm de ser abatidos”. E claro, há prejuízos. Um dos problemas mais graves, explica Pedro Ribeiro, prende-se com o despacho que está em vigor para indemnizar os proprietários pelos animais que têm de abater. Isto porque é um despacho do ano 2000. “E, portanto, os animais estão a ser pagos pelos preços do ano 2000. Um despacho com 22 anos e que até agora ainda não foi revisto. E isso é uma situação altamente preocupante para as empresas que vão ter que abater os animais, se receberem os preços de há 22 anos, o prejuízo que isto vai dar”, alerta, garantindo que o Ministério da Agricultura está a par da situação.
Além disso, o responsável destaca ainda o prejuízo relacionado com a interrupção da produção. “Não é tanto só a questão do preço dos animais abatidos, é a questão que terem de interromper os fornecimentos aos seus clientes, interromper a sua normal atividade e depois terem que repor todos os efetivos e esperar que eles cresçam outra vez e que retomem a produção”, lembra.