Canadá. EUA querem ação contra camionistas

Com a fronteira entre os dois países bloqueada houve estragos económicos. Boa parte do financiamento dos protestos veio de americanos.

Depois de paralisar Ottawa, deixando residentes com os nervos à flor da pele devido ao constante buzinão, impedidos de se deslocar e a lidar com recorrentes atos de vandalismo, o ‘comboio da liberdade’, um protesto de camionistas contra a exigência de certificados de vacinação contra a covid-19, bloqueou a fronteira entre o Canadá e os Estados Unidos. E o Executivo de Joe Biden também já está farto, apelando ao Governo de Justin Trudeau que utilize os seus poderes federais para acabar com a paralisação.

O protesto já ganhou proporções internacionais, tendo inspirado réplicas em França, Austrália e Nova Zelândia. Com os acessos entre o Canadá e os estados americanos do Michigan, Dakota do Norte e Montana cortados, o Governo canadiano prometeu reagir, sabendo como os seus vizinhos estão furiosos com o bloqueio de uma das suas mais movimentadas artérias comerciais, vital para a indústria automóvel sediada em Detroit.

«Se os manifestantes não partirem, terá de haver um caminho para seguir em frente», explicou Drew Dilkens, presidente da Câmara de Windsor, no Ontário, que faz fronteira com Detroit, em declarações à CNN. «Se isso significa retirá-los fisicamente, estamos preparados para o fazer», avisou, ressalvando que a sua prioridade é conseguir o fim desta crise pacificamente. «Tais ações podem inflamar a situação e certamente fazer com que mais pessoas venham para cá juntar-se ao protesto. E não queremos arriscar conflito adicional».

«O plano é garantir que a polícia tem todos os recursos de que precisa», acrescentou o ministro da Segurança Pública canadiano, Marco Mendicino. «A nossa principal prioridade é garantir que estes bloqueios ilegais acabam», rematou. 

A questão é que, enquanto os Estados Unidos pedem que se resolva a situação, os americanos têm tido um papel crucial nos protestos. Uma estimativa do canal canadiano CTV indica que, dos pelo menos 8 milhões de dólares (equivalente a mais de 7 milhões de euros) que o ‘comboio da liberdade’ conseguiu angariar, boa parte, talvez a maioria, é oriunda do lado sul da fronteira. Esse dinheiro entrou no Canadá através do GiveSendGo, um site de doações cristão. Mas todas essas contas seriam congeladas por ordem de um tribunal, após uma ação judicial do chefe do Executivo do Ontário, Doug Ford.

Aliás, vários dirigentes republicanos têm saído publicamente em defesa do ‘comboio da liberdade’, apesar dos seus impactos na economia americana. 

«Os camionistas canadianos estão a erguer-se não só pela liberdade dos canadianos, mas pela liberdade dos americanos», declarou perante a imprensa o senador Ted Cruz, esta quarta-feira. «É uma onda orgânica vinda do povo», concluiu. Já a governadora do Michigan, a democrata Gretchen Whitmer, somando-se aos apelos a que as autoridades canadianas quebrem o bloqueio. «Isto é inaceitável», frisou Whitmer. «Está a afetar salários e linhas de produção». 

Agora, o receio das autoridades é que réplicas do «comboio da liberdade» comecem a surgir nos EUA. Ainda esta semana o Departamento de Segurança Interna alertou agências policiais que camionistas podiam «potencialmente bloquear estradas em grandes cidades metropolitanas», avançou a Associated Press. Esse ‘comboio da liberdade’ americano poderia arrancar do sul da Califórnia já este fim-de-semana, bloqueando o tráfego rodoviário durante o Super Bowl – a final da NFL, a liga de futebol americano, que é talvez o evento desportivo mais antecipado do país – e chegando a Washington em março, a tempo do discurso do estado da nação.

Mesmo a capital do Canadá continua um caos. Ainda esta quinta-feira camionistas conduziram lentamente em redor do aeroporto internacional de Ottawa, numa tentativa de afetar o seu funcionamento. E as autoridades canadianas continuam a recomendar que os residentes evitem viagens não essenciais ao centro da cidade, num momento em que os serviços de emergência estão a ser inundados de chamadas falsas. 

«Estão a vir dos EUA», denunciou Peter Sloly, chefe da polícia de Ottawa. «Não exclusivamente, mas são significativamente de números americanos».