Depois do CDS, também o PP em Espanha corre o risco de implodir

Em Portugal, o Chega apagou os centristas da AR. Em Espanha, o Vox vai crescendo, com o maior partido da oposição em guerra interna.

Tempos difíceis aqueles que se vivem no espaço do centro-direita na Península Ibérica. No PSD arrasta-se o impasse para encontrar o sucessor de Rui Rio. No CDS, Nuno Melo apresentou-se como candidato à liderança, mas persistem as dúvidas sobre se o partido irá sobreviver. Aqui ao lado, em Espanha, uma luta fratricida pelo poder ameaça a implosão do PP.

O contexto político nos dois países vizinhos, ainda que com as suas diferenças, não oferecem margem para dúvida no que se refere ao atual estado desta ala ideológica. Tal como aconteceu em Portugal, com o Chega, a extrema-direita cresce em Espanha. Numa sondagem do El Español, publicada este domingo, o Vox, ultrapassava o Partido Popular (PP), garantindo 20,9% das intenções de voto, contra 20,1%.

A diferença, ainda que mínima, de quase um ponto percentual, é motivo de preocupação para o PP. Se há três meses as sondagens indicavam a conquista de 107 deputados, agora seriam apenas 82.

A explicar esta queda acentuada está uma guerra interna naquela que é a maior força da oposição em Espanha, e que tem como pano de fundo acusações de espionagem e de corrupção.

O verniz estalou na quinta-feira quando Isabel Ayuso, que há uns meses conquistava com uma maioria quase absoluta a governação da região autónoma de Madrid, convocou uma conferência de imprensa para uma declaração contra a direção do próprio partido. “Nunca pensei que a direção do meu partido fosse tão cruel”, disparou Ayuso, acusando os dirigentes populares de estarem a elaborar um dossiê contra si, implicando a sua família.

Alegou até uma tentativa de “fabricar” acusações de corrupção: “É muito doloroso que dirigentes do teu partido, em vez de te apoiarem, sejam aqueles que te querem destruir. Não pode haver nada mais grave do que acusar alguém da própria casa de corrupção. E fazê-lo sem provas metendo, pelo meio, a minha família, que nada tem a ver com política”.

Em causa está o seu irmão Tomás Díaz Ayuso, que intermediou um contrato de fornecimento de máscaras FFP2 e FFP3 a um dos hospitais de campanha que o governo madrilenho instalou durante a pandemia, em 2020. O contrato foi adjudicado, sem concurso público, pelo governo regional à empresa Priviet Sportive, SL, de um amigo de infância dos irmãos Díaz Ayuso.

A suspeita lançada pela direção do PP é que o irmão de Ayuso recebeu uma comissão de 280 mil euros enquanto intermediário da compra de 250 mil máscaras, pelo valor de 1,5 milhões de euros. A governante madrilena reconheceu o negócio, contudo corrigiu o valor para 55 mil euros, garantindo que tudo decorreu de forma legal, e que o irmão declarou ao fisco tudo quanto auferiu.

A teia adensou-se quando começaram a surgir na imprensa espanhola relatos de que altos funcionários do PP próximos do presidente do partido, Pablo Casado, e ligados ao município de Madrid, pediram a Ángel Carromero, braço direito do presidente da Câmara de Madrid, que vigiasse a governante, contratando detetives para corroborar as suspeitas. O escândalo acabou por levar à demissão do vereador Ángel Carromero.

Isabel Díaz Ayuso terá sido informada da “operação de espionagem”, como denomina, através de um ex-ministro de Mariano Rajoy, que, por sua vez, foi informado pelo próprio detetive. Na sua ótica, as acusações de que é alvo têm por base uma manobra política para a afastar da liderança do partido, à qual a própria pretende concorrer, tendo até defendido que o próximo congresso do PP seja feito o mais cedo possível, acusando a cúpula do partido de o quererem adiar e retirar a voz aos militantes.

O secretário-geral do PP, Teodoro García Egea, respondeu à declaração de Ayuso com o anúncio da abertura de um processo disciplinar à líder madrilena, devido às “acusações gravíssimas, quase criminosas” contra o líder e cúpula do partido, e que poderá resultar na sua expulsão do partido.

No meio desta guerra interna, além do Vox, o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE, centro-esquerda) vai esfregando as mãos, com Pedro Sánchez a garantir 25,9% dos votos e 106 deputados nas sondagens. Em Portugal, depois de conhecidos os resultados das legislativas, tanto analistas como políticos reconheceram que a ascensão do Chega e a indefinição do centro-direita pautada pelas disputas internas – entre Rio e Rangel no PSD e Francisco Rodrigues dos Santos e Nuno Melo no CDS – foram fatores determinantes para o PS conquistar a maioria absoluta.

Em Espanha, também a imprensa vai levantando o véu às consequências do pé de guerra entre Ayuso e Casado: “O dano mútuo é brutal e o eleitor do PP assiste incrédulo e até com desprezo a este episódio”, defende um editorial do conservador ABC.