O czar russo e a nova URSS

Imagino a angústia dos habitantes dos antigos países de Leste que viveram sufocados pela tirania soviética. Sonharem com tal pesadelo não os deve deixar dormir.

Já se sabe que quando há dois lados da barricada, cada um tenta defender a sua dama como pode. No caso da invasão da Rússia à Ucrânia, muitos estavam absolutamente convictos que o ditador Putin não iria mandar avançar as suas tropas, mas que os americanos iam ‘enfiar’ à força a Ucrânia na NATO. Como se viu, o novo czar russo, talvez com o consentimento da China, deu o seu acordo à invasão, marimbando-se para um povo soberano, a Ucrânia, que continua de fora da Aliança Atlântica. As explicações para o engano chegaram a ser patéticas. Enfim, cada um acredita no que quer.

A verdade é que o antigo homem do KGB, facto que muitos querem apagar do seu currículo, é um homem lunático que meteu na cabeça que quer refazer parte do império soviético, não olhando a meios para o conseguir. E é triste ver um partido dito democrático, o PCP, apoiar o crime hediondo cometido pelas tropas russas, mas para os inquilinos da Soeiro Pereira Gomes a esperança de reerguer o Muro de Berlim nunca desapareceu. Acreditam que um mundo sem liberdade é melhor para os cidadãos, pois estes não se devem saber governar… 

Curiosamente, as avantesmas das redes sociais ficaram muito indignadas com uma capa do i que fazia uma fotomontagem com Putin no lugar de Lenine, com a bandeira da antiga União Soviética por trás. A sua avidez de desculparem o indesculpável – apesar de cada um poder pensar o que muito bem entender – fê-los cegar ao ponto de não perceberem que a bandeira era da antiga União Soviética. 

Apesar das imagens que nos chegam da Ucrânia, confesso que não percebo o que é feito do armamento que os ocidentais enviaram para o país agora invadido. Será que Putin irá ficar com tal armamento, à semelhança do que sucedeu no Afeganistão?

Deixando de lado as questões políticas, interrogo-me sobre o que se irá passar nos próximos dias. Será que se vai reviver os horrores da guerra na antiga Jugoslávia, onde vizinhos e amigos se matavam uns aos outros só porque uns eram sérvios e outros bósnios e por aí fora? Tantos anos depois eram poucos os que acreditavam que tal cenário se poderia repetir na Europa, mas Putin fez-nos ver que a monstruosidade humana não tem limites. E será que o Presidente russo já pensa atacar outros países das proximidades?

Imagino a angústia dos habitantes dos antigos países de Leste que viveram sufocados pela tirania soviética. Sonharem com tal pesadelo não os deve deixar dormir.

Já quem ficará na história deste conflito são os treze guardas costeiros que depois de ameaçados pela armada russa os mandaram para a outra parte, acabando por ser mortos na ilha conhecida como das Serpentes. A coragem nestas situações, por vezes, é impressionante. Preferiram morrer a ficar nas mãos do ditador russo. 

Desde o início do conflito que as televisões têm enchido, e bem, pois é inevitável, as suas emissões com relatos e comentários sobre a guerra que voltou a assolar o velho continente. Mas, como me dizia um amigo com a sua ironia habitual, só faltava ver o homem que deixou acontecer o assalto aos paióis de Tancos a comentar a guerra na Ucrânia. A vida tem mesmo destas ironias.

P. S. As autoridades desportivas, que tantas vezes compactuam com regimes ditatoriais, desta vez foram rápidas a responder ao ataque russo: mudaram a final da Liga dos Campeões, que estava marcada para S. Petersburgo, para Paris. Também o circo da Fórmula 1 já anunciou o cancelamento do grande prémio que estava previsto acontecer na Rússia. Bons exemplos que esperemos que sejam seguidos por muitos mais.

P. S. 2. Por que será que a China tem estado tão calada? Quererá dizer com o silêncio que a invasão de Taiwan será uma questão de dias ou meses? Certo é que a Europa irá assistir a um agravamento do custo de vida o que será mais uma razão para se repensar a história das deslocalizações e afins. Um continente tão dependente de estados não democráticos não pode acabar bem.    

vitor.rainho@sol.pt