Zelenski envia delegação para falar com Kremlin na Bielorrússia

Apesar de algum ceticismo por se encontrar num território aliado da Rússia, o Presidente da Ucrânia concordou em enviar uma delegação para a Bielorrússia para negociar com a Rússia o descalar do conflito armado.

O presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, confirmou que a sua delegação irá realizar uma reunião com as autoridades russas, na fronteira com a Bielorrússia, onde irão negociar sem pré-condições. Este anúncio foi revelado pouco depois do Kremlin ter afirmado que estavam prontos para “conversar” com a delegação ucraniana, que revelava algum ceticismo em encontrar-se neste território.

“O Presidente Zelenski pretendia que esta reunião acontecesse num território mais neutro”, explicou ao i a investigadora do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI-NOVA), Patrícia Daehnhardt. “Se agora concordou reunir uma delegação da Ucrânia junto à fronteira com a Bielorrússia, julgo que se trata de uma demonstração de um sinal por parte desta liberação, de estarem dispostos a negociar com a Rússia, os agressores, numa tentativa de evitar a escalar a situação e de terminar a situação de guerra, 

A Bielorrússia tem desempenhado um papel fundamental na invasão à Ucrânia. Segundo as autoridades ucranianas, as tropas russas invadiram a fronteira com a Bielorrússia com o apoio do governo bielorrusso e foram concentradas dezenas de milhares de tropas russas neste país antes de realizarem ataques em solo ucraniano.

“Se não houvesse ações agressivas por parte do vosso território, poderíamos conversar em Minsk, na vossa cidade”, disse Zelenski, dirigindo-se diretamente à Bielorrússia. “Quando eram neutros, poderíamos realizar as conversas em Minsk. É por isso que não estamos a falar em Minsk neste momento”

“Claro que queremos a paz e queremos nos encontrar. Queremos acabar com a guerra. Varsóvia, Bratislava, Istambul e Baku foram locais sugeridos pelas autoridades russas. Todas estas cidades são boas opções para nós, desde que não haja mísseis a voar deste país “, rematou o Presidente. 

Em 2015, a capital da Bielorrússia foi o palco onde as autoridades ucranianas e russas se reuniram para elaborar os Acordos de Minsk, que incluíam um frágil cessar-fogo em duas áreas da Ucrânia tomadas por separatistas pró-Rússia no ano anterior.

A investigadora da IPRI-NOVA apesar de afirmar que “não se sabe muito bem” o que pode acontecer depois da reunião entre estas duas frentes, acredita que, em termos políticos, é uma resposta “inesperada”. 

“O Presidente Putin terá sido apanhado desprevenido, não contando com uma reação tão assertiva, não apenas por parte da liderança da Ucrânia, com Zelenski a emergir como o líder da resistência admirado dentro e fora do seu país, mas também por parte do Ocidente”, referiu Patrícia Daehnhardt, no mesmo dia que a Ucrânia conseguiu resistir à ofensiva russa que tentou tomar Kharkiv, a segunda maior deste país.

A especialista referiu ainda a resposta assertiva da NATO, ao anunciar na sexta-feira o aumento das tropas nos seus países membros. “O Ocidente está muito unido, numa resposta conjunta, na aplicação de sanções para tentar contrariar a invasão da Rússia, mostrando que para além de ilegal e uma atrocidade, o Ocidente está unido contra a Rússia”.

A afirmação alemã Depois de mostrar uma resistência a enviar apoios à Ucrânia, o chanceler Olaf Scholz assumiu uma mudança de postura e revelou que iria fornecer a Kiev mil armas antitanques e 500 armas antiaéreas e munições, assim como um orçamento especial, especificamente dedicado à defesa, no valor de 100 mil milhões de euros para modernizar as tropas alemãs.

“O ataque russo à Ucrânia marca um ponto de viragem. Ameaça toda a nossa ordem pós-guerra”, justificou Scholz. “Nesta situação, é nosso dever fazer o nosso melhor para apoiar a Ucrânia na defesa contra o exército invasor de Vladimir Putin. A Alemanha apoia a Ucrânia”, rematou o chanceler, que já na terça-feira tinha anunciado que iria suspender a exportação de gás natural através do gasoduto Nord Stream 2.

Desde a anexação da Crimeia que os analistas aguardavam por uma mudança por parte da Alemanha em relação à sua política de segurança que, em relação à Rússia, “estava condicionada por interesses económicos e energéticos”, disse Patrícia Daehnhardt.

“A Alemanha assumiu uma mudança de paradigma da sua política externa e de segurança e defesa. Isto é um sinal muito claro para Putin e os oligarcas russos. É uma afirmação política, a Rússia deixa de ter a Alemanha como a grande interlocutora desde o fim da Guerra Fria”, elucida a especialista. Esta mudança é absolutamente significativa e muda o quadro não só da União Europeia, mas também da NATO, pois muda a posição da Alemanha nesta organização. 
Além da Alemanha, também Portugal ofereceu a sua ajuda à Ucrânia, enviando equipamento militar, nomeadamente espingardas G3, coletes, capacetes ou granadas, informou no sábado à noite o Ministério da Defesa Nacional.

Rússia procura ajuda de mercenários Apesar da aliança entre Rússia e Cazaquistão, o país da Ásia Central recusou enviar tropas para ajudar a atacar a Ucrânia e reconhecer Donetsk e Lugansk como Estados independentes, afirmou a NBC. O Conselho de Segurança Nacional agradeceu a posição do Cazaquistão. “Saudamos a recusa do Cazaquistão em enviar as suas forças para se juntar à guerra de Putin na Ucrânia”, disse em comunicado.

“Estamos perante uma liderança russa que, desesperadamente, tenta recuperar e reconstruir um império russo agregando pela via da força estados que, desde 1991, se tinham tornado soberanos”, afirmou Patrícia Daehnhardt. “Esta guerra ilegal está a demonstrar a outras repúblicas que a sua soberania não está garantida. Aquilo que o Presidente russo está a fazer à Ucrânia, pode fazer em países como a Arménia, Azerbaijão e às cinco repúblicas da Ásia Central”.

A especialista acredita que estas ações podem ser um abrir de olhos para várias antigas repúblicas da União Soviética uma vez que Putin “pretende é não respeitar as soberanias de estados independentes”.

E acrescenta: “A liderança do Cazaquistão está a notar que é a altura de discordar da exigência por parte do Kremlin e mostrar que a soberania do Cazaquistão deve ser preservada”, explica. “É uma decisão que tenta prevenir uma situação semelhante no futuro, uma vez que estamos a falar de um Presidente russo que não só desrespeita a soberania de antigas repúblicas da União Soviética, mas que também acredita que pode interferir em decisões de estados como a Suécia e a Finlândia no que diz respeito às suas opções em termos de alianças ou de neutralidade”.
Pico de radiação em Chernobyl Foi registado um pico de radiação perto da central nuclear de Chernobyl, apreendida pelas forças russas. As tropas invasoras assumiram o controle desta central nuclear, local do desastre nuclear, em 1986, na quinta-feira, e, na quinta-feira, foi detetado que os níveis de radiação aumentaram cerca de 20 vezes.
Segundo especialistas, este aumento é explicado pelos veículos militares pesados que agitaram o solo contaminado na zona de exclusão, onde as forças armadas ucranianas e russas disputaram este território. Contudo, acrescentam que outro grande desastre nuclear é “extremamente improvável”, afirmando que seria muito mais preocupante a hipótese de acontecer um combate próximo de outros reatores nucleares em funcionamento na Ucrânia.  “Chernobyl está dentro de um grande espaço desabitado”, disse o especialista em Política Nuclear, James Acton, citado pela BBC. “Os outros reatores da Ucrânia não estão isolados como Chernobyl”.