As traquinices de Marcelo

Ao dar posse a Costa, Marcelo foi muito claro. Meu caro, se está a pensar pirar-se para Bruxelas a meio do mandato pode tirar o cavalinho da chuva. Costa ouviu e anuiu com um candura comovente. Mas imaginemos que o primeiro-ministro respondia à Marcelo?

Marcelo Rebelo de Sousa anda com o gás todo e ninguém o consegue parar. E é disso que verdadeiramente gosta. De agitar, de intervir, de polemizar, de se sentir vivo. Quem pensou que o Presidente ia ficar fechado no Palácio de Belém depois da maioria absoluta enganou-se redondamente. Marcelo precisa de palco como de ar para respirar e, por isso, por vezes, nem deve medir bem as consequências dos seus atos.

A semana começou agitada quando Marcelo, no seu direito de cidadão, mas já não tanto na qualidade de chefe de Estado, atirou: «Não sou primeiro-ministro, sou Presidente da República, não sou eu que tenho de formar o Governo. Eu formaria certamente um Governo como primeiro-ministro noutra área política e com outras pessoas, mas não existe esse filme». A afirmação, calculo, não agradou a socialistas nem a sociais democratas, que o acusam de ter sido o maior aliado de António Costa nos dois governos anteriores. Mas Marcelo, qual menino Nelinho, gosta de traquinices e está-se a borrifar para o que pensem do que diz. Confesso que esta é das facetas do Presidente de que mais gosto. A sua liberdade de dizer e fazer o que lhe apetece, o que aos 73 anos ainda é mais louvável.

Continuando a navegar na onda ‘marceliana’, eis que chegamos à tomada de posse do Governo, onde o Presidente da República deu o segundo dos seus verdadeiros avisos nos seus mandatos – o primeiro foi quando anunciou que dissolvia o Parlamento se o Orçamento do Estado não fosse aprovado. Ao dar posse a Costa, Marcelo foi muito claro. Meu caro, se está a pensar pirar-se para Bruxelas a meio do mandato pode tirar o cavalinho da chuva. Costa ouviu e anuiu com um candura comovente. Mas imaginemos que o primeiro-ministro respondia à Marcelo? «Se eu fosse Presidente, com certeza que teria feito outro discurso». O que diria Marcelo? Não sei, mas sei que ficaria um clima insustentável e assistiríamos a anos de luta aberta entre os dois principais responsáveis políticos – o presidente da Assembleia de República só tem poder para chatear os deputados de quem não gosta.

Certo é que o ultimato de Marcelo, de que se Costa se for embora o Governo vai abaixo – o que, como é óbvio, deixou António Costa completamente agarrado à função – mexeu com muita gente. Os prováveis sucessores de Costa devem ter achado uma chatice terem de esperar quatro anos e meio para lutarem pela liderança do Partido Socialista. Penso mesmo que aqueles que ficaram mais chateados, além de Costa, terão sido Pedro Nuno Santos, Mariana Vieira da Silva e Fernando Medina. «Ora bolas, este chato lixou-nos a vida», podia ser um comentário ouvido entre os três hipotéticos sucessores…

Outra das polémicas da semana foi dada por Constança Urbano de Sousa, que acusou alguns senadores do PS de a terem pressionado para não alterar a Lei da Nacionalidade. Não estou num confessionário, mas confesso outra vez que sorri com a coragem da antiga ministra da Administração Interna. Foi-se embora da política mas não deixou de apontar um dos maiores podres da profissão: o compadrio – que existe em todos os partidos, como sabemos.

Duas notas finais – e que fique claro, além de não estar num confessionário também não estou na televisão. Parabéns para Carlos Carreiras que num brilhante artigo no jornal i disse do ainda líder do PSD: «Rui Rio foi o pior, o mais nocivo e mais incompetente presidente que o PSD algum dia teve na sua longa história democrática».

Por fim, e mesmo no fim, os meus parabéns ao artista Leonel Moura, que propôs à Câmara de Portimão fazer uma homenagem com uma pequena estatueta ao Vila – figura incontornável da gastronomia portuguesa. Parece que a Mexilhoeira Grande vai ter uma pequena estátua, oferecida por Leonel Mora, do grande Vila. Por causa disso e do meu grande amigo Marquitos, não vou deixar de beber dois gins. Um pelo que fez o Vila enquanto cá esteve e o outro pelo que já fez e fará enquanto cá estiver o grande Marquitos, que teve a melhor notícia da semana.

vitor.rainho@sol.pt