Pela Paz Contra a Criminalização do Pensamento – uma ajudinha

Lutar contra tanques de guerra e mísseis é duro, mas enfrentar ambientes tóxicos é muito pior. O sofrimento dos que se sentam no sofá a assistir às mentiras e deturpações sobre a guerra na Ucrânia sem poderem fazer nada não pode ser comparado  com o sofrimento dos que nada podem fazer ante a destruição das…

por João Cerqueira

A propósito da invasão da Ucrânia pela Rússia, vinte personalidades assinaram uma carta publicada no Expresso onde denunciam um ambiente tóxico de intimidação a todos os que não partilham do «pensamento único».

De facto, desde que começou a invasão da Ucrânia nunca mais nenhum dos signatários foi visto nas televisões, falou na rádio ou escreveu nos jornais. Cortaram-lhes o pio. Com enorme coragem, o Expresso lá lhes publicou a carta – mas irá decerto sofrer as tais retaliações. Quanto aos bravos signatários, foram forçados à clandestinidade, resistindo heroicamente às forças tóxicas que os perseguem. Houve quem comparasse o seu exemplo de coragem ao dos dirigentes ucranianos que recusaram a rendição. Porém, não podemos colocar ambos ao mesmo nível. Porque enquanto Zelensky e os seus ministros contam com o apoio da NATO e da propaganda ocidental, os signatários estão sós e abandonados.

Lutar contra tanques de guerra e mísseis é duro, mas enfrentar ambientes tóxicos é muito pior. O sofrimento dos que se sentam no sofá a assistir às mentiras e deturpações sobre a guerra na Ucrânia sem poderem fazer nada não pode ser comparado  com o sofrimento dos que nada podem fazer ante a destruição das suas casas, a morte e a mutilação dos seus familiares. 

A certa altura da carta, dizem: «a forma maniqueísta de olhar a realidade, a opção da propaganda em detrimento do conhecimento, assentam na tentação de uma deriva totalitária, num ambiente público de crescente intolerância, censura e perseguição ao outro que ousa pensar diferente.» Nesta parte, julgava que se estavam a referir à Rússia de Putin, à Coreia do Norte ou a Cuba. Mas, lá está, «pensar exige esforço». Neste caso, esforço e algo mais. O regime totalitário, propagandista e persecutório de que falam é a própria União Europeia e, claro, Portugal.

Depois afirmam: «a denúncia vigorosa da guerra não é́ incompatível com a necessidade de procurar entender a natureza do conflito, as interpretações que ele suscita, e de como se chegou a esta situação». Todavia, o povinho das «opiniões irrelevantes e banais» não percebe patavina do conflito e precisa que lhe expliquem o que se passa. Ora eles querem explicar – e querem que a televisão do Putin também explique – mas, obviamente, não os deixam.

Há momentos na vida de um ser humano em que é preciso escolher entre os princípios e o conforto material. E assim, eu, sem máscara de gás para enfrentar o ambiente tóxico que nos envolve, sinto que é minha obrigação ajudá-los. Por isso, mesmo correndo riscos de me acontecer o mesmo que a eles – não voltar a escrever uma linha – vou dar-lhes voz. Calaram-nos, mas a mim ninguém me cala.

E o que os signatários queriam explicar sobre a «natureza do conflito» e o chegar a «esta situação», era isto: o principal culpado desta guerra brutal, da destruição de um país e do genocídio dos seus habitantes é a NATO. Foram as políticas belicistas da NATO que forçaram a Rússia a defender-se invadindo a Ucrânia. As mesmas políticas soezes que já antes a tinham obrigado a invadir a Geórgia, a Crimeia e o Donbass.  Desde o tempo de Estaline, a Rússia tem lutado activamente pela paz e exterminado belicistas. E luta com tamanha tenacidade contra a «globalização da guerra» e a «escalada armamentista» que não hesita em ameaçar usar armas nucleares.

Destruído o mundo, a paz seria eterna.

Caros signatários, eu também recuso «alinhar com os que colocaram de quarentena a faculdade de pensar e perseguem todos os que recusam a lógica da confrontação». Mas na sociedade em que vivemos, lacaia dos interesses imperialistas e do capitalismo global, essa liberdade que exaltais está condenada. Vede o recente massacre de Bucha com valas comuns, cadáveres com as mãos presas atrás das costas, mulheres violadas e outros horrores. Então não é perfeitamente lógico que possam ter sido os próprios ucranianos a cometer tal massacre? Aliás, a televisão do Putin já o demonstrou. Mas nas nossas televisões prevalece «o pensamento acéfalo», não há «cidadania exigente», não se combatem «os estereótipos» e, como tal, foram os russos.

Assim, caros signatários, como eu também me sinto marginalizado pelo jornalismo tóxico, proponho que nos exilemos na Rússia, essa pátria da liberdade de informação e da luta pela paz, onde só os cidadãos sem espírito crítico são presos, só os jornalistas abelhudos são atirados pela janela e só alguns provocadores são envenenados. E pelo caminho passamos pela Ucrânia, tomamos um café em Chernobil e entrevistamos os comandantes da paz russos para acabar com a desinformação.

Ar puro, por fim.

Vós, os que pensais com clareza, os que nunca mudais de princípios, os que tendes coragem para avançar para a paz, mereceis melhor. E eu, ainda que não atinja o vosso patamar, também.