Moreira da Silva junta rioístas e passistas na corrida contra Luís Montenegro

O diretor da OCDE reúne passistas e rioístas numa candidatura contra Luís Montenegro, que parte em vantagem na corrida à liderança dos sociais-democratas.

Na hora da verdade, Jorge Moreira da Silva chega-se à frente e vai mesmo a jogo para disputar com Luís Montenegro as eleições que vão decidir o sucessor de Rui Rio. Resguardado em silêncio desde o desastre laranja nas legislativas de 30 de janeiro, era um dos nomes que ia gerando nas últimas semanas movimentações de bastidores, sendo um dos mais apontados como certos na corrida pelo aparelho partidário. Ao que o Nascer do SOL apurou, o antigo delfim de Passos Coelho vai avançar com uma candidatura para ser uma verdadeira «alternativa» ao ex-líder parlamentar de … Passos Coelho.

Ainda sem abrir totalmente o jogo, confidenciando as suas intenções apenas àqueles que lhe são mais próximos, reservou para dia 14 de abril uma declaração pública sobre esta matéria, justificando que até essa data estará concentrado «enquanto diretor da Cooperação para o Desenvolvimento na OCDE».

Apesar de Montenegro levar já semanas de vantagem somando apoios, Moreira da Silva não é uma alternativa a subestimar: convence setores ligados ao passismo, outros tantos que orbitam em torno de Marcelo Rebelo de Sousa e tem ligações a uma parte relevante do rioísmo que não cairá para Montenegro. E, portanto, apresentar-se-á como uma solução de unidade num PSD em convalescença.

«Moreira da Silva aparece como um homem mais arejado do que Montenegro, que continua a ter uma componente forte de aparelho», apontam fontes sociais-democratas ao Nascer do SOL, acreditando que o antigo ministro foi agora puxado para a linha da frente por Passos Coelho, depois deste alegadamente ter ficado ‘aborrecido’ com Montenegro nas últimas diretas, por este ter feito ‘jogo duplo’, não  apoiando Rangel e ficando mais do lado da ala de Rui Rio.

«Jorge Moreira da Silva não faz nada sem Passos Coelho lhe dizer aos ouvidos», atira um influente social-democrata, apesar de reconhecer que o ex-primeiro-ministro não irá tomar partido entre os dois candidatos, por ambos serem próximos dele. «São os dois descendentes do passismo», resume.

Segundo as mesmas fontes,  Montenegro revelou fragilidades na apresentação da candidatura nesta semana: «As pessoas que aparecem ao lado dele são as mesmas que andam a tentar conquistar o partido ao longo dos últimos quatro anos. É mais do mesmo e o partido não gosta daquela gente, são uma espécie de abutres que andam à espera que as coisas corram mal para depois conquistarem o poder.» 

Já Moreira da Silva aparece como alguém «antissistema e antiaparelho». Sendo que não falta quem o acuse de falta de ‘tração’ e de ‘carisma’, que fazem com que tenha poucas ‘tropas’ no partido.

Para já, não lhe são conhecidos apoios, tendo ainda a máquina muito escondida, com o compromisso com a OCDE a impedi-lo de abrir o jogo. Mas consta internamente que já começou a movimentar-se para fazer contactos e com uma «dinâmica muito forte». E o  que se vai ouvindo dentro do partido é que «há muita gente entusiasmada com uma segunda candidatura que acaba por ser de alguém que quer algo novo para o partido e tem uma solução».

Seja quem for o futuro líder dos sociais-democratas, tem perante si as piores circunstâncias possíveis para recuperar o tempo perdido por Rui Rio nos últimos quatro anos. Se António Costa ficar à frente do Governo até 2026, quem vier agora a ser eleito terá mais quatro anos e seis meses de oposição a uma maioria absoluta, o que desde logo não é animador. Essa foi  até uma das condicionantes para Moreira da Silva não se atravessar logo na corrida à São Caetano. A outra foi a expansiva lista de nomes que se perfilavam como candidatos, uma vez que, a entrar na corrida, Moreira da Silva só o faria caso o antigo líder parlamentar não tivesse opositor. O que veio a confirmar-se na última semana.

Com Paulo Rangel, Miguel Pinto Luz, Carlos Moedas e Ribau Esteves de fora, o ex-ministro do Ambiente é agora o único candidato igualmente blindado capaz de entusiasmar as hostes sociais-democratas que não se reveem em Montenegro.

A corrida à presidência do PSD tem afunilado nas últimas semanas, tendo começado em praticamente seis candidaturas por sugestão, ou por iniciativa própria, resultando agora neste duelo entre Moreira da Silva e Montenegro (a não ser que surja um terceiro candidato inesperado nas próximas semanas – mais precisamente até 18 de maio, data limite para a oficialização das candidaturas).

Ribau Esteves, que desistiu da corrida esta semana por não ter conseguido estruturar «uma equipa de combate» para ganhar as diretas de 28 de maio, já fez saber que não irá apoiar  Montenegro, mas não descartou a hipótese de apoiar Moreira da Silva. «Temos afinidades de gestão política há muitos anos e, portanto, pensarei sobre essa matéria com mais diálogo com ele, como já tive nestas duas semanas e, portanto, é seguramente uma hipótese que ponderarei», afirmou o autarca de Aveiro.

Outros, como Poiares Maduro, que também chegou a ponderar avançar contra Montenegro, estarão em reflexão sobre o apoio público a uma candidatura, mas é provável que algumas dessas vozes surjam a apoiar Moreira da Silva, admitem fontes sociais-democratas ao Nascer do SOL.

Porta aberta para 2024

Apesar de serem os dois passistas na sua natureza, Moreira da Silva quererá tirar proveito da aproximação de Montenegro a Rio, que começou nas últimas diretas e se confirmou na campanha para as legislativas.

Mas há mais um trunfo. Tal como lembrou o Presidente da República, no discurso de tomada de posse do novo Governo, o cenário de eleições antecipadas caso o primeiro-ministro ceda à sua tentação europeia, poderá abrir um novo rumo político. Neste cenário, sabe o Nascer do SOL, Moreira da Silva deverá apresentar-se como candidato já com ambições para ser primeiro-ministro, tal como o fez Montenegro na sua declaração desta semana.

Estando à frente da Plataforma para o Crescimento Sustentável, que fundou em 2011 – demarcando-se então da linha de austeridade de Vítor Gaspar –,  representa também um caminho de novos horizontes, com uma agenda ligada ao ambiente e à modernidade, sendo nesse campo que poderá dar prova viva das suas capacidades.

Montenegro despreocupado 

Esta será também a primeira candidatura de Moreira da Silva à presidência dos sociais-democratas, ao contrário de Montenegro, que vai disputar o cargo pela segunda vez, depois de não ter tido êxito contra Rui Rio.

Nas últimas diretas, em novembro do ano passado, o antigo ministro ainda ponderou avançar contra o eurodeputado Paulo Rangel, mas acabou por não o fazer depois de o ainda presidente do PSD, Rui Rio, ter confirmado a sua recandidatura.

Além de liderar o secretariado do Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da OCDE,  Moreira da Silva conta com vasto currículo – que é apontado como um ponto a favor da sua candidatura.

Foi líder da Juventude Social-Democrata (entre 1995 e 1998), deputado, eurodeputado, e primeiro vice-presidente do PSD, durante a liderança de Pedro Passos Coelho, tendo ficado no seu Governo à frente das pastas do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia.

Além de reunir experiência governativa, foi conselheiro das Nações Unidas para a inovação financeira e questões relacionadas com as alterações climáticas e conselheiro do Presidente Cavaco Silva.

Nas hostes de Luís Montenegro, a reação à candidatura de Moreira da Silva não foi de preocupação de maior, ou pelo menos não foi evidenciada.

Os montenegristas estão a preparar a campanha interna já há meses e o aparelho está mobilizado e operacional.
Aliás, Luís Montenegro escolheu o momento para apresentação da sua candidatura, desde logo apresentando os nomes dos seus principais colaboradores e apoiantes nesta campanha.