Putin: a explicação erótica

Quem pode resistir àquelas imagens em que Putin aparece em tronco nu, depilado e com uns óculos que parecem ter sido feitos na RDA? 

A invasão russa da Ucrânia está a ser condenada pela maioria das pessoas civilizadas. No entanto, há minoria ruidosa que, com maior ou menor sofisticação, apoia Putin e desvaloriza os seus crimes. A sua lógica assenta na equiparação da vítima ao agressor, no «compreender as motivações», no «sim, mas…». Por muitas imagens de horror que vejam, por mais testemunhos das atrocidades dos soldados russos que ouçam, não se comovem, nem se retratam. Putin é o seu herói.

Tal posição não surpreende ninguém quando vinda de gente ligada a partidos que apoiam ditaduras e sonham com o fim da democracia burguesa. Mas já se torna difícil de entender quando é subscrita por pessoas que sempre levantaram a voz contra a guerra e defenderam a liberdade. 

Ora só encontro uma explicação para este comportamento paradoxal: estes senhores e estas senhoras estão apaixonados por Putin. O que é perfeitamente compreensível, pois ele é um dos homens mais charmosos do mundo.

Quem pode resistir àquelas imagens em que Putin aparece em tronco nu, depilado e com uns óculos que parecem ter sido feitos na RDA? Quem pode resistir ao seu andar de pato marreco, à sua voz monocórdica e ao seu olhar glacial? Quem pode resistir às suas bochechas inchadas de botox e princípios de calvície? Quem pode, enfim, não desejar umas férias nas Maldivas com Putin?

Até eu, que sou heterossexual (enquanto for possível), quase não resisto quando vejo o homem sentado na sua mesa quilométrica a ameaçar o Ocidente. Paul Newman, Tom Cruise, Zezé Camarinha– que hipóteses poderiam ter estes galãs ao lado de Putin? Dizem que as mulheres russas são as mais bonitas do mundo, mas o que vale uma Svetlana com um metro e oitenta, loira de olhos azuis e corpo escultórico, ao lado do nosso pequeno Vladimir? Putin é realmente irresistível. Indirectamente, devido a paixões suicidas, já matou mais homens e mulheres não correspondidos do que outros civis durantes as suas guerras.

É portanto provável que uma vaga de paixão putiana esteja a assolar os corações de muitos comentadores e militares. Assim como eu uma vez sonhei com uma tenista russa, também eles poderão estar a ter sonhos com Putin. E ei-los a passear a cavalo com Putin pelas estepes, em tronco nu e com vontade de tirar o resto da roupa, rumo a um antigo Gulag onde se submeteriam à experiência de serem dominados pelo ditador rastejando às suas ordens pelo solo, levando umas palmadas no rabo e, para os mais ousados, chamando-lhe Padrinho.

Hoje, é normal casar apaixonadamente num dia e, no outro, querer mudar de sexo, desejar meter os vizinhos na cama ou enamorar-se por Homer Simpson. São experiências de autodescoberta da personalidade enriquecedoras do ser humano. E eles e elas, «num solitário andar por entre a gente», dão ais por Putin. 

Camões cantou ainda que «amor é fogo que arde sem se ver». E assim, mesmo sendo o homem tão gelado, queimam-se-lhes os dedos quando escrevem ternamente o seu nome em crónicas de justificação da barbárie.

Há, porém, um sério problema para estes apaixonados: Putin não os (as) ama. Je t’aime moi non plus. Por mais cartas românticas que escrevam nos jornais, o coração de Putin pertence a uma antiga ginasta russa e aos oligarcas. Temo, pois, que ante este amor não correspondido possa haver uma vaga de suicídios semelhante à dos seguidores do Templo do Povo na Guiana.