A Generosidade num momento de emergência social e humanitária

Os tempos que vivemos são propícios para centrar o pensamento no que realmente importa e regressar ao fundamental: olhar para o Outro com uma atitude de reciprocidade, abertura genuína e cultivar uma generosidade verdadeira.

por Hélia Bracons
Diretora da Licenciatura em Serviço SocialUniversidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias

Neste difícil tempo repleto de inseguranças, medos, incertezas e imprevisibilidade, novos desafios e posicionamentos são precisos e é necessário enxergar o mundo e o Outro com outros olhos e sentimentos, para auscultar as suas necessidades e dificuldades, mas também permitir que o sofrimento e a inquietude, nos leve a olhar para dentro de cada um de nós. Como diz Tolentino Mendonça, espantemo-nos com o que se passa à nossa volta, pois é aí que tudo pode começar. O espanto permite um olhar aberto, longo e profundo ao que causa admiração, estranheza, surpresa e assombro.

O momento que vivenciamos, como as situações de catástrofe, crise social, ambiental e humanitária, faz com que se multipliquem as iniciativas de ajuda, mas leva-nos, também, a questionar os princípios e valores da nossa essência, da nossa existência e da nossa atividade profissional. Também aqui devemos estar atentos e agir em verdade com os princípios éticos da profissão. O Serviço Social é uma profissão que faz a diferença na vida das pessoas, diria mesmo que salva vidas, na medida em que contribui, para a prevenção e resolução de problemas sociais concretos, permitindo uma melhor qualidade de vida das pessoas, grupos e comunidades. E fá-lo, não só com base em conhecimentos e competências próprias, mas pela capacidade de compreensão, empatia e dedicação que promove sistematicamente, em nome dos direitos humanos, o respeito pela diferença e a justiça social.

Na situação de crise em que nos encontramos, o panorama social transforma-se diariamente, os problemas sociais apresentam novos contornos, a pobreza e as desigualdades sociais sofrem agravamento, e os assistentes sociais são chamados a recriar ou readaptar os seus modos de agir, com criatividade e ousadia, através de novos procedimentos, ao nível do planeamento e avaliação e, ao nível do contacto, relação, proximidade e confiança com as pessoas com quem interagem.

Sendo as catástrofes acontecimentos repentinos, o maior desafio do assistente social neste tipo de intervenção é precisamente o agir imediato na mobilização dos recursos existentes para que as pessoas consigam, acima de tudo, sobreviver com dignidade, o que engloba o trabalho interdisciplinar, a partilha e entreajuda profissional, a colaboração e a cooperação com os vários organismos e instituições, o ousar construir propostas de intervenção inovadoras, a articulação premente com a comunidade e atuar com eficácia e eficiência num cuto espaço de tempo, para perceber as necessidades com exatidão para uma atuação com maior impacto.

Acredito que, um dos pilares fundamentais numa crise de emergência social é, sem dúvida, o humanismo. Colocar a tónica no Outro, em prol do seu bem-estar e felicidade, significa permitir fazer um certo despojamento do nosso Eu e deixarmo-nos encantar pela descoberta do mistério que o Outro é, de forma gratuita e genuína, tornando-nos próximos, sem receios e preconceitos. Aqui reside, a verdadeira essência da generosidade que por si só, já se constitui um grande desafio e um verdadeiro ato de coragem, humanidade e humildade.