Depp vs Heard: Quando o amor vira pesadelo

A polémica já se arrasta desde 2016, mas foi no mês passado que começou o julgamento civil que opõe o ator Johnny Depp à sua ex-mulher e atriz Amber Heard.

As revelações têm sido surpreendentes, as gravações chocantes e a história cada vez mais triste. Das acusações de maus-tratos e de violência doméstica a detalhes dos acontecimentos, Johnny Depp e Amber Heard, que se conheceram durante as filmagens do filme O Diário a Rum, em 2011, tem tido problemas desde o divórcio, em 2016.

O começo do litígio

A ‘guerra’ começou depois da publicação de um artigo de opinião que Heard escreveu para o Washington Post, no qual alegou ter sido vítima de violência doméstica, numa coluna do jornal norte-americano. No texto, a atriz não menciona o nome do abusador em questão. Contudo, o espaço temporal a que se refere corresponde ao período no qual teve uma relação com Johnny Depp. Segundo o The Guardian, nessa altura, o artista processou a ex-mulher, já que, segundo o mesmo, o artigo «prejudicou a sua reputação e carreira», tendo sido afastado pela Disney de um dos seus papéis mais emblemáticos, o Jack Sparrow, da trilogia Piratas das Caraíbas.

Nas sessões realizadas até agora, a equipa de advogados de Heard defende que o ator conhecido pelos filmes de Tim Burton, foi um «parceiro abusivo, viciado em drogas e álcool».  Por sua vez, segundo os advogados de Depp, o cenário era inverso e, por isso, apresentam as alegações de violência doméstica de Amber Heard como uma «farsa», «uma estratégia calculada para arruinar a reputação do ator». Depp acusa assim a atriz de difamação e pede 47 milhões de euros de indemnização, garantindo que «nunca bateu na ex-mulher». Já a atriz processou-o de volta, com um pedido de indemnização de cerca de 84 milhões de euros. «Eu não merecia isto, nem os meus filhos, nem todas as pessoas que acreditaram em mim ao longo de todos estes anos. A verdade é a única coisa que me interessa. Hoje é realmente a minha primeira oportunidade para falar sobre este caso na sua total integridade», referiu o ator no primeiro dia de julgamento que decorreu no dia 19 de abril.

O casal, que deu o nó em 2015, separou-se 15 meses depois com uma ordem de restrição para colocar um travão «nas agressões físicas e verbais do ator, acentuadas pelos seus problemas com drogas e álcool». Apesar disso, na altura, num comunicado conjunto que enviaram à imprensa após o fim do casamento, reconheceram ter tido uma «relação apaixonada e volátil em determinadas ocasiões, mas sempre marcada pelo amor». De acordo com Depp, o relacionamento começou bastante bem e Heard «era boa demais para ser verdade». Mas rapidamente o paradigma mudou e começaram as discussões violentas entre o casal. Segundo o mesmo, foi Amber quem o submeteu a constantes «abusos físicos e psicológicos» como socos, chapadas e empurrões. «Parecia puro ódio contra mim», alegou.

 

As testemunhas

 Ao longo destes dias o júri ouviu provas apresentadas pelo antigo terapeuta do ex-casal, que descreveu como ambos se envolveram em «abusos mútuos». Debbie Lloyd, uma enfermeira que foi contratada para tratar da toxicodependência de Depp e que assistiu ao casamento do casal, também testemunhou que, por vezes, Amber discutia com o ex-marido enquanto o ator recebia tratamento médico. Keenan Wyatt, um técnico de som que trabalhou com o artista em quase todos os seus filmes desde os anos 90, garantiu nunca o ter visto a abusar verbal ou fisicamente de ninguém, nem dos dois filhos nem da ex-mulher, Vanessa Paradis. Por sua vez, Kate James, que trabalhava como assistente pessoal de Heard, retratou a atriz como uma pessoa «instável», que chegou a cuspir-lhe na cara após uma discussão e se comportou de forma «verbalmente abusiva»’ com a sua equipa. Isaac Baruch, amigo de infância de Depp, foi também chamado a depor na primeira semana. Baruch afirmou nunca ter presenciado nenhum tipo de violência doméstica vindo de qualquer membro da relação. Questionado sobre uma discussão que o casal teve a 21 de maio de 2016, o homem afirmou que Heard foi ao seu encontro no dia seguinte, dizendo-lhe que Depp tinha sido violento, tendo-lhe atirado com um telemóvel e agredindo-a: «Eu estava a olhar para Amber e não via nada… Não vi um corte, uma negra, inchaço. Apenas a cara de Amber», lembrou o amigo do casal que frisou que, nesse encontro, a atriz «não estava a utilizar maquilhagem».

 

As acusações contra Amber

O ator tem descrito vários episódios violentos de Amber Heard, às vezes «em frente aos filhos». «Podia começar com um chamada, com um empurrão… Podia começar com um comando de televisão, ou um copo de vinho na minha cabeça», exemplificou. Segundo o seu relato, para se defender dessas «explosões de raiva», o artista chegava a trancar-se no quarto ou casa de banho. Depp disse que durante uma discussão, um mês após o casamento – em março de 2015 – Heard lhe atirou uma garrafa de vodka. Felizmente falhou e acertou na parede. A segunda garrafa, porém, maior, acertou-lhe na mão, decepando-lhe a ponta do dedo médio da mão direita. «Não senti nenhum tipo de dor no início», admitiu. «Senti calor e como se algo estivesse a pingar pela minha mão abaixo». Contudo, após olhar para a mão, o artista percebeu que «estava a olhar diretamente para o meu osso». Ainda assim, segundo o tribunal, nos registos hospitalares não aparece qualquer referência a uma garrafa, tendo o ator afirmado ao médico que havia entalado o dedo numa porta. «Menti porque não queria revelar que tinha sido a Sr.ª Heard que me tinha atirado uma garrafa de vodka e me tinha tirado o dedo. Não queria arranjar-lhe problemas», explicou.

Em tribunal, foi passada uma gravação áudio em que se pode ouvir a atriz a admitir uma agressão contra Depp. «Tu disseste-me para o fazer. Tu disseste-me: ‘Faz isso!’», afirma Heard na gravação. «Deste-me um murro», responde Depp. «Desculpa se não te bati na cara com um estalo ‘em condições’. Eu estava a bater-te, não a dar-te murros. Não levaste um murro!», admite Heard.

Um dos momentos mais comentados sobre a relação do casal é o episódio em que Amber Heard terá defecado na cama do casal, no lado em que dormia regularmente o ator. No tribunal, o artista recordou ainda a sua reação ao ver uma fotografia de “matéria fecal humana” na sua cama. O incidente terá acontecido após uma discussão pelo facto de ter chegado mais de uma hora atrasado ao 30º aniversário da mulher no dia 21 de abril de 2016, numa das suas casas em Los Angeles. Depp explicou que tinha estado numa reunião com os seus consultores financeiros devido a uma “quantidade excessiva de dinheiro que tinha desaparecido”. Que foi avisando, ao longo do dia, que provavelmente se atrasaria. Em resposta, a atriz pediu-lhe «para preparar vinho e canábis para a festa». Durante a festa, explicou, pouco falaram e no final, depois de uma discussão com agressões físicas à mistura, o ator decidiu ir para Hollywood Hills. Dias depois, ao saber que Heard ia com os amigos para o festival de Coachella, pensou que seria o «momento perfeito para regressar à casa e trazer os seus pertences». No entanto, o seu guarda-costas, Sean Beatt defendeu ser uma má ideia, mostrando-lhe uma fotografia enviada pela sua governanta: «Era uma fotografia da cama, a nossa cama. E do meu lado da cama havia matéria fecal humana», contou. Segundo o relato de Depp, a atriz terá tentado culpar os cães do ator, Pistol e Boo, pelo incidente. Apesar disso, Johnny Depp acredita que essa não passa de uma explicação «absurda»: «Eles são Yorkies [Yorkshire Terrier] miniatura. Pesam cerca de 4 quilos cada um. Eu vivi com eles, agarrei nos seus dejetos. Não foram os cães!», defendeu, sublinhando que acredita que Amber Heard ou um dos seus amigos «defecaram na sua cama naquele dia».

Outro dos momentos ‘altos’ do julgamento até agora foi a forma como o ator abordou o famoso tema das drogas e álcool, revelando que cresceu com «uma mãe abusadora com os mesmos vícios», atribuindo-lhe a culpa. O artista explicou que, com 11 anos, começou por tomar os comprimidos da mãe, «para se acalmar», acrescentando que, ao crescer, «nunca tomou nenhum tipo de droga ou álcool para se divertir», mas sim com o objetivo de «relaxar». Na sala de audiência Depp adiantou ainda que, após ter tido o seu dedo cortado na discussão com Amber Heard, em 2015, jurou «nunca mais se drogar com opioides, independentemente de quão desconfortável ou dorido estivesse», e que manteve essa promessa.

 

As acusações contra Depp

No dia 4 de maio, última quarta-feira, deu-se o 13.º dia de julgamento. Começaram então a ser ouvidas as testemunhas chamadas pela defesa da atriz, sendo a primeira Dawn Hughes, especialista em violência interpessoal, que afirmou que, em consequência da «violência íntima pelo parceiro, o senhor Depp», a atriz desenvolveu stress pós-traumático, rejeitando assim a alegação de que a atriz teria fingido os sintomas de stress pós-traumático, como alegou a dada altura, a especialista da defesa de Johnny Depp, Shannon Curry. A especialista revelou ainda em tribunal que as mensagens trocadas entre o ex-casal podem ser consideradas como uma prova de abuso emocional, de como Johnny Depp «sofria de ciúmes doentios e tentava controlar a ex-mulher quando esta não estava com ele». Segundo Hughes, a maioria dos episódios de violência e de violência sexual aconteciam quando Depp vivia «momentos de raiva movidos a álcool e drogas»: «Quando o senhor Depp estava alcoolizado ou drogado, atirava-a para a cama, rasgava-lhe as roupas e tentava ter sexo com ela. Contudo, os episódios mais graves, conta, passaram-se na Austrália, onde Amber Heard foi sujeita «aos piores episódios de violência sexual pelo marido»: «Foi espancada, estrangulada e penetrada com uma garrafa enquanto o marido gritava: ‘Vou-te matar, odeio-te, odeio-te’», descreveu Hughes.

Johnny Depp terminou o seu testemunho defendendo que é ele a vítima de violência doméstica na relação, tendo sido divulgada outra gravação áudio em que se ouve Heard a dizer ao ex-marido: «Conta ao mundo Johhny, diz-lhes: ‘Eu, Johnny Depp, um homem, sou vítima de violência doméstica, e vê quantas pessoas vão acreditar em ti ou ficar do teu lado!». Contudo, ao que parece, o caminho ainda será longo, já que o julgamento está agendado para, pelo menos, seis semanas de duração. «Não importa o resultado final deste julgamento, quando as acusações sobre mim foram feitas, quando isso aconteceu, eu já perdi!», desabafou Depp no segundo dia em que foi chamado a depor.