Por que os países de Leste crescem mais que Portugal

Aqueles que desgostam do sucesso português, apontam muitas vezes a carga fiscal como fator decisivo para o Leste crescer mais. Contudo, a análise dos factos não acompanha totalmente essa conclusão. Comecemos pela comparação da carga fiscal.

por Carlos Pereira
Economista e vice-Presidente do grupo parlamentar do PS

Apesar do nosso país ter atingido um feito extraordinário neste século ao convergir quatro anos seguidos e ter a perspetiva de retomar o crescimento do PIB, acima da média da UE, já este ano, a agenda sobre o crescimento económico tem sido dominada por outro facto: Portugal foi ultrapassado por quatro países que entraram em 2004 na UE!

Aqueles que desgostam do sucesso português, apontam muitas vezes a carga fiscal como fator decisivo para o Leste crescer mais. Contudo, a análise dos factos não acompanha totalmente essa conclusão. Comecemos pela comparação da carga fiscal. Os países de Leste entre 2008 e 2020 tiveram uma carga fiscal média de 33% e Portugal de 36%. Dos países que ultrapassaram Portugal podemos apontar o seguinte: Estónia e Lituânia tiveram 33% e 30% de carga fiscal média e a Hungria e a Polónia, apresentam carga fiscal média dos últimos 13 anos de 38% e 34% do PIB respetivamente. Portanto a primeira conclusão é que não houve nenhum choque fiscal que justifique o maior crescimento desses países.

Há, na verdade, outros fatores mais decisivos. Proponho adicionar às questões fiscais a análise comparativa de três outros elementos para compreender o que está em causa. Em primeiro lugar, as qualificações, em segundo lugar o investimento, com atenção ao investimento público e finalmente o peso da divida pública no PIB.

Quanto às qualificações o ponto de partida de Portugal face aos países de Leste é clarificador: Portugal em 2008 tinha 19,9 % de população com ensino superior. Os países que ultrapassaram Portugal tinham, nessa altura, 26%, 34,1%, 25,5% e 20,3% respetivamente a Lituânia a Estónia a Hungria e a Polónia. Todos mais bem preparados que Portugal quando entrou na UE que tinha taxas próximas de 10%. Consciente desta importância o país tem escolhido a educação como tema central e os resultados têm aparecido. Desde 2016 foram muito significativos. A taxa de escolaridade de população residente entre 30 e 34 anos subiu para 41% em 2021; a população empregada com ensino superior aumentou 13% entre 2020 e 2021; o número de diplomados cresceu, pelo quarto ano consecutivo, atingindo um máximo anual de 86 mil.

Um outro fator de comparação, e porventura um dos mais decisivos para o crescimento é o investimento. Há dados muito positivos nos últimos anos, mas importa concentrar alguma atenção na análise comparativa do Investimento Público (IP) desde 2008 e observando, em concreto, os países que nos ultrapassaram. A média do IP em Portugal entre 2008 e 2020 foi de 2,7% do PIB. Na Lituânia foi de 3,9%; na Estónia foi de 5,4%; na Hungria foi de 4,6% e na Polónia de 4,6%. Com esta diferença de capacidade de investir é natural que o PIB dos países de leste acelere mais que o de Portugal. Não há milagres de investimento público. Há países com capacidade para impor taxas de investimento público robustas e há Portugal que com um peso da divida no PIB muito grande não tem margem para ir mais longe. Portugal tem, em média dos últimos 13 anos, um peso da dívida de 117% do PIB, que compara com uma média de 36,4% na Lituânia ou de 9,1% na Estónia; de 75,5% na Hungria ou mesmo de 51,9% na Polónia. Neste contexto, a capacidade de investimento público de Portugal está muito concentrada nos fundos europeus. Este facto deve ser suficiente para sublinhar a importância decisiva do país ter ‘contas certas’! Não é um capricho, é um imperativo estrutural para obter maiores taxas de crescimento económico.