O fim do último bastião da resistência de Mariupol

Autoridades ucranianas anunciaram a retirada de 264 militares da fábrica Azovstal, último foco de resistência de Mariupol.

Depois de semanas em que defenderam um dos últimos redutos de defesa da cidade ucraniana de Mariupol, durante a segunda-feira à noite, foi anunciada a retirada de 264 militares da fábrica Azovstal, depois de ter sido acordado um cessar-fogo com Moscovo. Contudo, o futuro dos combatentes ucranianos ainda é uma grande incógnita.

Estes soldados, 53 dos quais estão gravemente feridos e foram transferidos para um hospital, encontram-se em território controlado pela Rússia e, segundo a vice-ministra da defesa ucraniana, Hanna Maliar, poderão ser trocados por prisioneiros russos. “Esta foi a única opção”, disse Maliar, citada pelo Guardian.

No entanto, segundo algumas autoridades russas, existe a hipótese de os combatentes ucranianos continuarem detidos até serem julgados ou, inclusive, executados, escreve o jornal inglês, numa altura em que legisladores da Rússia estudam a hipótese de propor uma nova lei que pode inviabilizar trocas de prisioneiros de combatentes que o Kremlin considere serem “terroristas”.

“Eles são criminosos de guerra e devemos fazer tudo o que é possível para os levarmos à justiça”, disse o presidente da Duma russa, acusando os combatentes de serem “criminosos nazis”.

Apesar destas opiniões, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, garantiu que o Presidente da Rússia, Vladimir Putin, teria garantido que os combatentes que se renderam seriam tratados “de acordo com os padrões internacionais”.

A Ucrânia tentou um acordo que permitiria o regresso dos combatentes para áreas controladas pela Ucrânia ou a sua evacuação para um país neutro.

No entanto, como isso não aconteceu, as autoridades ucranianas anunciaram nas primeiras horas da terça-feira o fim da defesa da fábrica siderúrgica, uma dos maiores símbolos da resistência ucraniana, onde centenas de combatentes ucranianos, com membros do batalhão Azov, da Guarda Nacional, da polícia e das unidades de defesa territorial, assim como e vários civis, se encontravam escondidos desde que as tropas russas cercaram Mariupol no início de março.

A Rússia considerou a decisão de Azovstal como uma “rendição em massa”. Esta é uma das primeiras e mais importantes vitórias de Putin na guerra contra a Ucrânia. Agora, com Mariupol tomada esta conquista traz grandes vantagens a Moscovo uma vez que permite criar um corredor terrestre que liga a região de Donbass à Crimeia, permitindo que o Presidente russo controle uma grande parte do Leste da Ucrânia.

Mariupol é também o principal porto de Donbass onde se encontram as autoproclamadas repúblicas de Donetsk e Luhansk, alinhadas com o Kremlin.

No lado ucraniano, o exército disse que os soldados que defenderam a fábrica “realizaram a sua tarefa de combate”, tendo, inclusive, o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, “saudado” os combatentes através de um discurso em vídeo.

Zelensky salientou que “a Ucrânia precisa de heróis ucranianos vivos”. “Este é o nosso principal objetivo”, acrescentou, explicando que o trabalho prosseguia “para os fazer regressar a casa, um trabalho que requer delicadeza e tempo”, inclusive os que continuam barricados dentro de Azovstal, que, segundo peritos militares referidos pelo Politico, estarão entre os cem e os mil soldados.

De acordo com o exército ucraniano, a resistência na siderúrgica, que durou 82 dias, permitiu adiar a transferência de 20 mil soldados russos para outras áreas da Ucrânia, impedindo assim que Moscovo capturasse rapidamente a cidade de Zaporizhzhia, no sul. “Graças aos defensores de Mariupol, a Ucrânia ganhou um tempo vital para acumular reservas, reagrupar e mobilizar forças e receber ajuda dos aliados”, destacou o Ministério da Defesa, cita a AFP.

Ninguém esperava que a resistência ucraniana fosse mostrar tanta resiliência contra as forças russas, numa altura em que este confronto parece longe de estar acabado.

As negociações de paz entre a Ucrânia e a Rússia estão “suspensas” uma vez que Moscovo não demonstra qualquer “compreensão” da atual situação, afirmou esta terça-feira Mykhailo Podoliak, conselheiro do Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, e membro da delegação ucraniana.

“A Rússia não está a mostrar um elemento-chave: a compreensão (…) do que está a acontecer atualmente no mundo e o seu papel extremamente negativo”, referiu Podoliak, acrescentando que Moscovo “não entende que a guerra não está mais a decorrer de acordo com as suas regras, com o seu calendário ou com os seus planos”.

O chefe da diplomacia russa, Serguei Lavrov, acusou, no dia 25 de abril, a Ucrânia de “fingir” nas conversações, tendo assegurado posteriormente que Moscovo queria continuar com o processo negocial.

O vice-ministro russo, Andrei Rudenko, assegurou esta terça-feira à agência de notícias Interfax que não há qualquer negociação a decorrer atualmente entre a Rússia e a Ucrânia, afirmando que Kiev “abandonou de vez” o diálogo.