Os Santos Populares estão de volta

por Nélson Mateus e Alice Vieira

Querida avó,

Depois de dois anos de interregno, devido à pandemia, as Marchas Populares de Lisboa, e os arraiais, estão de volta.
O cancelamento das Festas de Lisboa, nos últimos dois anos, foi dos momentos mais tristes para os Lisboetas, e não só.

Já alguma vez alguém tinha imaginado a Avenida da Liberdade, e grande parte dos bairros lisboetas, confinados, num silêncio ensurdecedor, na noite de 12 para 13 de junho?

Como não podia deixar de ser, este teu neto que tanto te ama esteve no Altice Arena a ver em primeira mão os desfiles a que milhares de pessoas vão poder assistir na Avenida da Liberdade e, claro, através da RTP.

Não imaginas a emoção dos marchantes e dos padrinhos por voltarem a realizar uma coisa que os deixa tão felizes.

Apesar da competição, saudável, entre bairros, este é o momento em que todos voltam a estar juntos em torno da mais bela identidade bairrista que leva o nome de Lisboa pelo mundo fora.

Já há muito que os Bairros deram início à contagem decrescente para os seus arraiais.

Foi muito estranho nos últimos anos não nos ser possível celebrar o mês de Junho da forma a que estávamos habituados.

Sem marchas, sem arraiais, sem a famosa sardinha assada, sem os tronos de Santo António… sem os milhares de pessoas que se unem nestas celebrações de Santo António. Apesar de não ser o Santo Padroeiro da cidade de Lisboa, são estas festas que fazem com que Lisboa seja falada internacionalmente.

Todas as marchas irão cantar ‘Amália é Lisboa’ e, desta forma, homenagear a imortal Amália Rodrigues.

Não se pode falar de Marchas de Lisboa sem se falar da Marcha dos Mercados. Sabes que a Anita Guerreiro foi Madrinha desta marcha durante vários anos.

Já te disse que, para coincidir com as celebrações das Festas de Lisboa, vou inaugurar uma exposição sobre a vida e obra de Anita Guerreiro?

Em breve conto-te tudo.

Viva o Santo António.

Bjs

 

Querido neto,
Tu aqui a falares-me de coisas tão alegres – e eu de telemóvel na orelha a receber a notícia da morte de um grande amigo meu do tempo do Diário de Notícias…

Mas a vida é assim mesmo, coisas boas, coisas más, que se há-de fazer.

Desse meu amigo falarei mais tarde – agora vamos lá às marchas populares. Desde sempre que me lembro de estar entre aquele maralhal todo a assistir às marchas, mais tarde a entrevistar todos eles enquanto ensaiavam, e ainda mais tarde já com direito a ficar sentada na tribuna de honra, porque pertencia à Comissão de Toponímia da Câmara.

Ainda me lembro de haver a Marcha das Avenidas Novas, com todos de lambreta… (ainda te lembras do que era uma lambreta?). Mas não passou desse ano… O bairrismo por esses sítios era pouco.

Os padrinhos eram sempre gente conhecida – e abriam o desfile.

Uma vez convidaram-me para madrinha da Marcha da Voz do Operário. Era quase sempre a que abria os desfiles, composta por miúdos, e eu nesse ano tinha trabalhado muito com a escola deles.

Disse-lhes que ficava muito honrada mas nesse dia tinha duas escolas no Algarve.

Disseram que não fazia mal, eles iriam falar à mesma no meu nome.

Assim foi.

Pois tu não imaginas as pessoas que me telefonaram a dizer que me tinham visto a desfilar, e como eu ia bem, e como o meu vestido era bonito, e como estava bem penteada… As pessoas vêem mesmo aquilo que querem ver…

Para lá das marchas de cada bairro havia – e penso que ainda há – a Grande Marcha de Lisboa. E um ano eu, o José Mário Branco e mais outro autor de que não recordo o nome, fomos convidados a escrevê-la. Não me lembro de nada mas sei que nos deu muito trabalho, que era muito bonita e que se aguentou vários anos.

Nos últimos anos antes da pandemia já não assisti às marchas… Junho em muitas escolas fora de Lisboa, muito trabalho, idas ao estrangeiro… e lá se foi o Santo António…

Fica bem – e viva o Santo António!

Bjs