Vera Kolodzig. ‘Gosto de fazer yoga mas também de ir para o Lux’

Aos 37 anos, Vera Kolodzig apresenta-se como uma comunicadora que desde criança sabe bem o que quer. Além de representar e apresentar, tem o seu podcast e a plataforma Kológica, onde ensina formas mais positivas de ver a vida. Atualmente vemo-la pelo país a conhecer comidas e lugares em ‘Missão 100% Português’

Em pequena já gostava de fazer teatrinhos para a família. Aos 14 anos, apontando ao sonho de se tornar atriz, começou a trabalhar para juntar dinheiro para ir para Londres fazer a sua formação. Quando regressou a Portugal era uma pessoa «mais feliz». Fez cinema e teatro, mas diz que foi nas novelas que mais se realizou.

Como soubeste que o teu futuro passava pela comunicação?

Enquanto miúda, não me lembro de querer ser outra coisa que não atriz, tanto que comecei com seis anos a fazer anúncios. Depois tive a sorte de ser escolhida para uma novela e de começar a trabalhar profissionalmente, fui-me formar em Londres, em teatro. O que eu não sabia era como é que tudo isso me ia trazer onde eu estou agora. Durante o meu trabalho como atriz sempre fui muito resistente ao status da celebridade, queria muito ser uma artista, não queria a consequência – que, na verdade, é uma consequência muito bonita – de ficar com aquela exposição pública muito grande. Eu queria muito ser uma artista mas ter a minha vida privada. Depois, chegou a um ponto em que eu percebi que podia usar isso de uma forma positiva e que, se calhar, podia passar uma mensagem que eu achasse importante. Há quem se foque em mensagens políticas, há quem se foque noutro tipo de conceitos e, para mim, foi muito importante este conceito do desenvolvimento pessoal, porque comecei a fazer terapia e, de facto, aquilo mudou a minha vida e comecei a ter muita vontade de falar sobre isso e de desmistificar o preconceito que sinto que havia com isso. Em relação às redes sociais, algo a que eu também era resistente no início, pensei: ‘Porque não usar isto de uma forma boa?’. E, de facto, as redes sociais têm esta vantagem que é o contacto direto com o público, é a forma mais fidedigna, não há boatos das revistas, do ‘diz que disse’. Foi assim que comecei a perceber que podia usar esta exposição que eu tinha de uma forma mais positiva. Dava por mim em jantares de amigas a falar de coisas que aprendia, de livros que lia, de podcasts que ouvia, de terapias que experimentei e pensei: ‘Porque não fazer eu um podcast a falar sobre isto e entrevistar todas estas pessoas que me inspiram?’. Foi assim que começou o meu projeto, a Kológica. Descobri uma outra voz e foi engraçado porque também coincidiu com o ano em que eu fui convidada para apresentar o programa da RTP1 Missão 100% Português, em que eu me sinto muito em casa porque adoro fazer aquilo. E, no início, fiquei surpreendida de me quererem para apresentar porque, como atriz, eu comunico com uma máscara. E foi engraçado porque foi nessa altura que me comecei a sentir mais eu e mais integrada naquilo que eu sou, sendo que fui chamada para apresentar um programa em que sou eu e não estou a representar. Sinto que fui encontrando a minha voz e que sou muito feliz a fazer aquilo que faço.

Foste estudar para fora aos 18 anos. Sempre foi um sonho teu estudar no estrangeiro ou foi uma oportunidade que surgiu e agarraste-a?

Sempre foi um sonho meu. Queria muito saber como era viver outras vidas e ter outras experiências e isso é uma das coisas que a representação nos traz, a oportunidade de experimentar outras peles. Já fiz personagens tão diferentes: a Zé do Espírito Indomável, que andava lá no meio do campo, a Maria no Clube, uma prostituta… Sempre tive muto interesse noutras vidas, noutras culturas e em saber que aprendizagens posso tirar daí. E, na altura, tinha a crença de que o teatro em Portugal era uma porcaria e que em Londres é que era bom. Eu trabalhei muito para ir. Comecei a trabalhar com 14 anos e eu não queria nada chumbar nenhum ano porque eu queria mesmo ir para Londres aos 18 anos e juntei o meu dinheiro para conseguir ir e foi uma experiência incrível. Foi muito duro a nível pessoal e emocional, de repente deparei-me com pessoas com uma cultura muito diferente, as relações são muito diferentes, eu sentia que as pessoas eram muito frias, não me encaixei tão bem logo a partida E, quando viajo, não sou muito de fazer as férias do resort, gosto de ir ver a cultura local e conhecer as pessoas, gosto muito dessas experiências e acho que nos trazem uma visão do mundo mais ampla.

Já em pequena sentias que eras uma pessoa de palco ou eras mais tímida e de ficares no teu canto?

É uma boa pergunta porque era um bocadinho das duas: tinha um lado tímido e inseguro e não era muito segura de mim enquanto criança mas ao mesmo tempo era escolhida para fazer de cigarra na Cigarra e a Formiga. Portanto, sim, sempre gostei de fazer teatrinhos para a minha família, que é muito giro e que eu agora vejo o Mateus (filho) a fazer também. Gostava muito de fazer teatrinhos mas ao mesmo tempo não tinha muita confiança. Tinha um pouco dos dois. Não era bem aquela criança super integrada nos grupos e que faz o que os outros todos fazem, sempre fui um bocadinho diferente mas ao mesmo tempo também tinha esse lado de querer representar. Aliás, lembro-me perfeitamente de um casting que fiz quando era miúda para um anúncio e que nós tínhamos de dançar, estavam as crianças todas em fila e quando a câmara passasse à nossa frente nós tínhamos de dançar. Lembro-me de estarem as miúdas todas ao meu lado a dançar imenso, todas espevitadas e eu estava tímida e quando a câmara passou à minha frente eu dancei mas depois parei logo.

O que achas que aprendeste em Londres que não aprenderias cá?

Não só a nível académico como também pessoal. Aprendi imensa coisa, por exemplo a nível da gestão do dinheiro: eu vivia com um budget muito reduzido, sendo que fui viver para um país onde os custos são muito mais elevados do que cá. Ganhar essa independência foi muito importante, ter de gerir o meu dinheiro, cozinhar para mim, ter de tratar da minha casa, foram coisas muito importantes. A nível académico também foi maravilhoso porque tive professores incríveis e as disciplinas que tive a nível de representação foram maravilhosas porque não se segue nenhum método único. No meu primeiro ano do curso de teatro tinha cinco encenadores diferentes e cada um tinha o seu método e a junção destes todos permitiu-me criar o meu próprio método. Depois a nível pessoal também foi uma grande aprendizagem. Eu aprendi a falhar, que foi muito importante, eu não gostava nada de falhar, queria fazer sempre tudo bem, era muito exigente comigo e com os outros também, queria que as coisas fossem todas perfeitinhas e em Londres aprendi que falhar nos faz crescer e que está tudo bem com falhar. Isso foi das maiores aprendizagens do curso, que não temos de fazer tudo perfeito e que falhar faz parte do crescer, assim como passar vergonhas. 

Pensaste em ficar lá?

Achava que queria isso quando fui para lá só que também aprendi muito a apreciar a qualidade de vida que tinha cá. Temos mar, temos sol, temos comida ótima, temos relações humanas incríveis. Uma coisa que me chocava imenso era a parte da competição. Eu estava numa escola de teatro onde é normal as pessoas serem competitivas e especialmente num país onde são ‘sete cães a um osso’, ainda mais do que cá. E pensei: ‘Eu já trabalho profissionalmente em Portugal, já faço novelas e sou amiga das pessoas com quem trabalho’. Tenho muitas amigas atrizes e às vezes estamos todas a competir para o mesmo e ficamos felizes umas pelas outras, se não fica uma, fica a outra, já me aconteceu várias vezes isso. E a mim fazia-me imensa confusão aquela parte do secretismo porque eu pensava no que é que me iria fazer mais feliz e apercebi-me que, se calhar, podiam ser as relações humanas. Além disso, eu tinha lá um encenador a quem eu dizia que queria ficar lá e ele aconselhava-me a não o fazer. E eu tinha muito aquela coisa de querer falar com um sotaque perfeito, por exemplo, e um dia um professor meu disse-me para eu começar a trabalhar o meu sotaque português porque era aquilo que me ia distinguir de toda a gente ali, era o que me tornava especial. E ele disse-me também que eu tinha imensa sorte por ter já uma carreira estabelecida em Portugal e quase que me disse de forma direta para eu não ficar lá. E, de facto, voltei e voltei mais feliz. Aprendi mesmo a apreciar aquilo que tenho cá.

Qual foi a reação da tua família quando disseste que querias ir estudar para fora?

Eles já estavam à espera porque eu já falava naquilo há muito tempo. Na verdade, quando comecei a trabalhar, o meu objetivo era juntar dinheiro para conseguir ir por isso não havia grande coisa que eles pudessem fazer para me impedir de ir uma vez que fui com o meu dinheiro. Depois pedi um apoio à comunidade europeia com as propinas e foi tudo muito natural. Eu também tenho pai alemão, por isso, com que moral é que ele me iria impedir de viajar? Sempre fui muito apoiada. O meu pai sempre quis mais que eu não fosse, porque dizia que eu já tinha uma carreira cá e que tinha de ficar cá e ficar famosa e era muito engraçado porque ele dizia tudo isto com um sotaque alemão. E eu respondia que eu não queria ser famosa, que queria era ser artista e ir aprender. Eu cheguei a recusar trabalhos nessa altura, acho que uma série e uma novela, para poder ficar em Londres e o meu pai perguntava-me: ‘Mas como é que tu estás a recusar trabalhos?’, mas o que eu estava a fazer em Londres era mesmo importante para mim. Mas isso foram coisas normais, nunca me tentou impedir de ir e nunca houve uma reação avessa, eu sempre tive bastante liberdade nas minhas escolhas. 

De todos os projetos que fizeste qual foi aquele com que ficaste com um carinho especial?

A primeira coisa que me vem à cabeça é o Espírito Indomável. Foi super importante, foi maravilhoso porque era a personagem mais diferente de mim que tive de fazer. Fiz um trabalho de pesquisa que me deu mesmo outras perspetivas. Começámos a gravar a novela no Brasil, o que foi uma experiência maravilhosa. Conheci o Diogo, que é o pai do meu filho e por isso também é um grande marco. Mas depois também tive outros projetos muito importantes. O Jardins Proibidos tem obviamente um lugar especial porque foi o primeiro. A Prisioneira foi a última novela que eu fiz, em 2019, e em que eu fazia de muçulmana, uma personagem super diferente de mim. Gosto muito desta descoberta de outras formas de pensar. Na Prisioneira aprendi imenso a nível pessoal porque achava que a nível artístico as novelas não eram boas e que queria fazer cinema e, neste caso, artisticamente a Prisioneira podia não ser o melhor produto a nível de ficção mas a nível pessoal trouxe-me tantas coisas boas. Para já, aprendi sobre uma cultura completamente diferente, fiquei com uma relação espetacular com as pessoas que conheci, como a Rita Ribeiro e a Sofia Aparício porque nós tínhamos um núcleo super forte e éramos mesmo muito felizes a fazer aquilo. A novela ensinou-me a ser feliz naquilo que faço e não a ser feliz por causa daquilo que faço. Ou seja, não tem de ser a novela, o produto em si, que me faz feliz, mas a forma como eu encaro aquilo. E foi uma grande aprendizagem a nível pessoal porque aprendi imenso a abstrair-me, a deixar de me queixar, que é uma coisa que acontece muito em novelas, a relacionar-me com os desafios do dia-a-dia muito melhor. Quando há uma tensão, por exemplo, porque um membro da equipa teve uma falha, podemos comunicar aquilo de forma saudável e não ficar só ali a reclamar. Portanto, a nível pessoal foi um projeto que me trouxe imenso mesmo.

E já não sentes aquilo que referiste em relação às novelas versus cinema?

Em termos de não ser um tão bom conteúdo. A verdade é que eu tinha esse preconceito comigo mesma em relação a fazer novelas mas é um trabalho maravilhoso, em que conhecemos pessoas e é super gratificante porque as pessoas conhecem-nos na rua e reconhecem o nosso trabalho. Como produto, é entretenimento, é uma coisa com a qual as pessoas se relacionam, são problemas mundanos que são expostos e com os quais as pessoas se relacionam. O público pode emocionar-se a ver uma cena de novela, por exemplo. Eu acho que isso também importante, apesar de ter tido esse preconceito e de achar que não era artístico o suficiente. Depois fui fazer cinema e também não me preencheu assim tanto. E admito que pensava o mesmo com o teatro: ‘Ai, o teatro é que é e quero ir para o Nacional fazer teatro’. Fui fazer um espetáculo ao teatro do Porto e também, apesar de ter gostado muito do processo, não era aquele espetáculo de que me orgulhasse e dissesse ‘Isto é que é o suprassumo da arte’. Por isso, aprendi a relativizar essas coisas. Obviamente que uma novela não é comparável com cinema e que não posso comparar o trabalho de um ator em novela com o trabalho de um ator em cinema. Eu acho muito injusto às vezes julgar-se a qualidade do ator por uma novela. Existem imensos bons atores que são bons a fazer cinema e teatro e não conseguem fazer novelas. É preciso estar disposto às vulnerabilidades e a fazer aquele ritmo e a ser filmado de uma forma que se calhar não vai ser a mais bonita. Portanto, acho que cada coisa tem de ser apreciada por aquilo que é mas, sim, eu já o fiz e já tive esse julgamento.

Estás a participar no Clube, da SIC. Qual tem sido o feedback?

Fiz a terceira temporada no ano passado e, entretanto, o feedback tem sido muito bom. É engraçado porque eu acho que ninguém estava nada a espera de me ver naqueles trajes. Como eu, nas novelas, durante muito tempo, fiz sempre a protagonista, a boazinha, de repente eu estar a fazer uma companheira de luxo e cenas de sexo e tudo isso foi muito surpreendente para muita gente. Recebi mensagens de pessoas a dizer que nem me reconheceram, isso, para mim, é o maior elogio porque significa que estou a fazer bem o meu trabalho e, na verdade, demorei 20 anos a ter essa oportunidade, o que leva a crer que não tem só que ver com o meu talento enquanto atriz, mas também com aquilo que surge. Adorei fazer, foi uma experiência, também a nível pessoal, fui fazer imensa pesquisa e conhecer a vida daquelas mulheres, fiquei com um respeito enorme. A nível artístico foi um gosto trabalhar com a Patrícia Sequeira, ter uma realizadora mulher que é maravilhosa e tem uma linguagem muito própria. O feedback tem sido muito bom, acho que as pessoas também gostaram e fico muito contente. Acho que foi um projeto mesmo único, que nunca tinha sido feito nada do género em Portugal e tenho imenso orgulho de ter feito parte disto.

Foi de facto um projeto pioneiro em Portugal. Achas que teve a recetividade desejada?

Acho que sim, que foi surpreendente, ninguém estava à espera. Foi super arrojado. Acho que aquilo é bonito porque trabalha muito o erotismo e ser erótico não é ser vulgar ou ordinário ou sexual, vai muito mais fundo que isso. Não é uma série sobre sexo e sobre acompanhantes de luxo. É uma série sobre seres humanos, sobre pessoas reais, dilemas reais, negócios obscuros e uma série de coisas que na verdade existem. E admiro imenso o trabalho da Patrícia porque sinto que ela conseguiu expor isso de uma forma correta. E acho que o público gostou muito.

Já fizeste teatro, novela, cinema, representação. Achas que é importante trabalhar em várias áreas ou gostavas de te focar só numa?

Eu não consigo focar-me numa só. Ainda por cima agora com o podcast, agora tenho esta plataforma online. Acho que nós não somos só uma coisa nem temos de fazer só uma coisa. Quer dizer, há quem goste muito disso, mas eu gosto mais de ter vários conhecimentos, de explorar várias coisas e depende também da fase da vida em que estou. Neste momento estou muito focada no desenvolvimento pessoal, quero muito isto e não sei onde vou estar daqui a uns tempos. É deixar fluir, ver o que acontece e fazer o que nos faz feliz no momento em que nos faz feliz. Portanto, acho que não tenho de me focar só numa coisa. E a experiência da apresentação e mesmo esta parte da comunicação que estou a explorar com o podcast, entrevistar pessoas, adoro isto, sinto-me super na minha essência quando estou a fazer isto. E no programa Missão 100% Português sinto-me mesmo em casa porque se baseia em conhecer e falar com pessoas, entrevistá-las e viajar, é tudo o que eu mais gosto de fazer. É maravilhoso. E, na verdade, as coisas complementam-se. Agora vou fazer um retiro, o primeiro retiro Kológica, num local que conheci no 100% Português. Foi um dos sítios onde nós fomos, conheci o dono, falei com ele e disse que adorava fazer um retiro ali. Por isso, as coisas interligam-se todas e comunicam umas com as outras, neste momento estou super feliz a fazer o programa. 

Como concilias o teu trabalho com esta vida mais calma, em que priorizas o conhecimento pessoal?

É assim, tudo com equilíbrio, mesmo o equilíbrio. Eu gosto muito de fazer yoga mas também gosto muito de ir ao Lux. Percebi que as rotinas são muito importantes e nos podem dar imensa liberdade, o que parece um contra senso. Às vezes as pessoas pensam: ‘Estou presa na rotina’. Mas eu acredito que é o contrário, às vezes a rotina pode ser uma liberdade enorme, comecei a criar rotinas para mim, nomeadamente a minha manhã é super importante, o facto de ter tempo para mim. Isso dá-me mais liberdade para conseguir enfrentar os desafios de forma mais tranquila. A organização para mim é super importante, por exemplo, fazer listas, especialmente quando temos um trabalho que não é tão fixo. E também estar atenta aos sinais que o meu corpo dá. Quando durmo menos sinto que o meu corpo dá sinais, quando começo a sentir uma dor nas costas, ou seja o que for. Rotinas, organização e estar atento aos sinais: são as melhores formas para conseguir conciliar as coisas todas. E depois, claro, tenho uma prioridade enorme na minha vida que é o meu filho e o tempo com ele é precioso.

Tu és vegana e começaste a ser vegetariana na altura da gravidez por causa de uma aposta. Além disso, disseste que, mesmo antes, já não comias muita carne. Era porque não gostavas ou por consciência ambiental?

Eu não comia muita carne porque sempre gostei imenso de vegetais e peixe e queijo, adorava queijo, tanto que eu achava que nunca na vida ia ser vegana porque adorava queijo. Depois o Diogo, com quem eu estava na altura, fez uma aposta para deixar de comer carne e eu acompanhei-o. Eu estava grávida e pensei ‘se me apetecer, eu como’, mas nunca me apeteceu. Mas nessa altura comia peixe, ovos e queijo. Depois mais lá para a frente, em 2019, penso eu, tive um problema gástrico, uma bactéria no estômago e recorri ao meu homeopata e ele disse que o queijo era super ácido e que eu não devia comer enquanto estava a tratar a bactéria, deixando depois assim de comer queijo. Depois juntei-me com o Rúben, que era vegano e cozinheiro ainda por cima, por isso tentei. E sim, para mim sempre foi mais a questão ambiental do que propriamente a questão dos direitos dos animais, que claro que respeito imenso, mas, tal como eu costumo dizer, sou vegana, mas não fundamentalista. Eu sou incapaz de ir a uma aldeia, ter com uma senhora que cria os seus porcos e as suas galinhas e os mata para comer e dizer que ela não pode matar os seus animais. Na verdade, o que ela está a fazer é sustentável, ela cria os seus animais e come os seus animais, não está a ir a uma grande empresa, que tem um grande impacto ambiental. E tem muito que ver com a alimentação saudável também. Comecei a perceber que é importante comermos os alimentos sazonais e biológicos e a verdade é que, às vezes, ser vegan não é nada saudável. Se formos ao supermercado e virmos os congelados vegetarianos, aquilo é mais processado do que um peixinho acabado de ser pescado. Nesse caso, se calhar é mais ecológico estar a comer um peixe do que estar a comer um congelado vegano. Para mim é essa a questão do equilíbrio, entre a saúde, o impacto ambiental e entre a dieta vegetal, que é uma dieta à qual eu dou prioridade.

Sentes que as pessoas têm cada vez mais essa consciência, quer no que toca ao que põem para dentro do corpo como também em relação ao impacto que causam no planeta?

Acho que cada vez mais isso sente-se. Cada vez mais se vê mais pessoas a falar sobre veganismo, sobre ser vegetariano, sobre impacto ambiental. Mesmo as grandes empresas agora estão a perceber que têm de se virar para isso. Claro que também existe muito greenwash mas é importante apreciar o facto de as empresas grandes já começarem a ter mais consciência deste impacto. Por isso, sim, eu acho que estamos a caminhar para um futuro mais positivo. Acho que as pessoas estão cada vez mais conscientes disso – e é a tal coisa, é importante não ser fundamentalista. Eu sou vegan e às vezes estou a jantar à frente do João Paulo Rodrigues [com quem apresenta a Missão 100% Português] e ele pede um naco de carne e diz que até se sente culpado. Não há motivo por que se sentir culpado, eu não sou aquela vegan que está sentada à mesa e diz: ‘Ai, nem consigo olhar’ quando alguém pede carne. Cada um faz as suas escolhas e acho que também podemos liderar pelo exemplo e não por estar a tentar impor um determinado tipo de visão. 

Em 2020 criaste o teu podcast, Kológica, onde falas, resumidamente, de maneiras mais positivas de encarar a vida. Como surgiu a ideia de criar um podcast?

Dava por mim só a ter conversas sobre os podcasts que ouvia e os conceitos que descobria sobre relacionamentos e sobre sexo e prazer e a falar do que aprendi na terapia. Foi num jantar em que eu estava com a Inês Eusébio, que hoje em dia é minha parceira na plataforma, e lembro-me que lhe disse: ‘Ó Inês, eu estava aqui a pensar, e porque não fazer um podcast?’. E ela aconselhou-me a ir em frente. Foi assim que eu comecei, eu estava nos Monólogos da Vagina com a Carla Andrino, que é uma pessoa que me inspira imenso e eu já tinha a ideia de a entrevistar porque acho que ela tem uma visão do mundo super importante e tem uma história maravilhosa, e foi ela a minha primeira convidada, tanto que até comecei a gravar o podcast em casa dela porque o marido dela é compositor e tem um estúdio. A partir daí foi simplesmente surgindo. Já tinha uma lista de pessoas que queria entrevistar e lembro-me que achei que ia dar para três meses. Mas não param, eu conheço uma pessoa que me apresenta outra e depois aprendo sobre um tema e recebo mensagens de pessoas dizem que seria interessante eu abordar determinado tema e, pronto, é uma coisa que me preenche imenso. Depois comecei a ser convidada para dar aulas noutras plataformas, comecei a ser convidada para palestras, estava também a fazer imensos cursos online e comecei a perceber que isto do online tinha imenso potencial. E este projeto surgiu já como uma coisa para expandir, eu não queria só uma plataforma de cursos online, queria também fazer eventos presenciais, fazer retiros, eventualmente ter uma loja online e é um processo sempre em crescimento e a ideia é que vá fluindo. 

Já falaste de imensos temas e com imensas pessoas no teu podcast. Do que ainda não falaste e gostarias de falar ou não encontraste a pessoa certa para falar, por exemplo?

Inteligência emocional é um tema de que eu quero muito falar. Já tenho uma lista gigante de convidados com quem quero falar. Interessa-me muito esta parte das terapias, que terapias existem e o que é que as pessoas usam para se curar. Às tantas as coisas também vão chegando até mim porque eu falo num tema e alguém me manda uma mensagem a perguntar se já ouvi falar de outro tema. Mas quero muito falar de inteligência emocional, mais especificamente, psicologia, espiritualidade, que acho que é um tema também bastante interessante e que, se calhar, durante um tempo, havia um pouco do tabu de se falar sobre isso.

Achas que ainda existe um tabu relativamente às terapias não convencionais?

Acho que cada pessoa tem direito à sua opinião e há muito esta coisa de não acreditar no que a ciência não prova. E depois há muitas coisas que são pseudociências. Wim Hof, o criador do método Wim Hof, relacionado com a exposição ao frio, quis ser estudado pela ciência para poder comprovar os benefícios daquilo e muitas vezes quando vamos ver a definição de alguma destas terapias diz pseudociência, ou porque não há estudos suficientes ou porque não são reconhecidos. A naturopatia, por exemplo, se nós formos pensar nisso, é a medicina mais antiga, no antigamente as pessoas já usavam as plantas para se curar, depois é que vieram as farmacêuticas. Claro que às vezes há um bocadinho esses conflitos mas eu acho que não temos de estar contra nada, apesar de as pessoas terem todo o direito de questionar. Estou-me um bocado nas tintas, acredito naquilo que acredito e normalmente as coisas de que falo no podcast vêm da minha experiência pessoal. Portanto, não estou a dizer que aquilo é o suprassumo e que vai resultar para toda a gente, estou a dizer que, na minha experiência pessoal, resultou. Acho que cada um encontra o seu próprio equilíbrio. A minha naturopata tem imensos pacientes oncológicos, são pessoas que estão a fazer tratamentos para o cancro e, em paralelo, estão a usar a naturopatia para não ter um impacto tão grande na saúde. Acho que as duas coisas se podem complementar, não temos de estar contra uma coisa e outra. Se existe algum tabu? Sim, às vezes acham que somos malucos. 

As pessoas que te acompanhavam inicialmente faziam-no pelos projetos em que participavas enquanto atriz. Sentes que agora também já tens uma comunidade de pessoas que te segue por causa do teu podcast e da tua forma de ver o mundo?

Sinto e isso é a coisa mais gratificante do mundo. No ano passado fui à feira do livro e veio um casalinho ter comigo e dizer que adorava o meu podcast e eu fiquei: ‘Não acredito que estou a ser reconhecida pelo meu podcast, isto é a melhor coisa do mundo!’. Há pessoas que me seguem no podcast e nem sabem que eu trabalhava como atriz. E também é muito bom o facto de eu conseguir despertar o público que alcanço enquanto atriz para estes assuntos, tudo é bom, acho que se complementa. 

E que projetos tens para o futuro? Vais focar-te mais no lado da representação e da apresentação ou do crescimento pessoal e do podcast?

Vou deixar fluir. Neste momento estou a gravar a quarta temporada da Missão 100% Português, estreou dia 4 de junho. Quero muito focar-me na Kológica, estou agora a fazer os primeiros projetos presenciais e de 9 a 12 de junho tenho o primeiro retiro Kológica, dedicado a ferramentas para lidar com a ansiedade, juntei o yoga e a medicina alternativa. Quero continuar a fazer cursos online, tenho muitas ideias para a plataforma. Quanto à representação, é o que surgir, estou disponível.