A aterragem complicada de Pedro Nuno Santos

Marcelo diz que Costa é responsável pelas escolhas “mais felizes ou menos felizes”. Costa, até ver, segura-o, afirmando que “ministro não agiu de má-fé”, depois de Pedro Nuno Santos ter assumido “a inteira responsabilidade” pelos “erros de comunicação”. 

Entre anúncios de aeroporto, revogação da decisão, mal entendidos e “erro grave”, Pedro Nuno Santos tremeu mas continua, para já, em funções. O i já tinha avançado antes de António Costa chegar a Portugal que o governante iria manter-se como ministro da Habitação e das Infraestruturas, depois de ter aceitado as suas explicações sobre a polémica publicação do despacho sobre o novo aeroporto. Mas agora Marcelo Rebelo de Sousa aparece a baralhar as contas.

O Presidente da República, que mostrou desde o início o seu desagrado por não ter conhecimento da solução, ontem à noite não hesitou: “É o primeiro-ministro que escolhe os seus colaboradores e é responsável por isso”, dando a António Costa a responsabilidade pela sua continuidade no Governo.

Quanto ao futuro, o chefe de Estado pede uma decisão rápida, consensual e fazível. “Os portugueses esperam que seja uma decisão relativamente rápida, porque é uma matéria que é discutida há uma eternidade; que seja uma decisão consensual, porque é uma solução para décadas e não há um Governo que dure décadas; e que seja consistente do ponto de vista técnico, política, económico e do Direito, para levar a sério. Para que seja possível esta decisão, está mandatado o Governo, por voto dos portugueses”, disse no seu curto discurso. 

Pedro Nuno Santos acabou por assumir, ao início da tarde de ontem, “a inteira responsabilidade” pelos “erros de comunicação”, reconheceu que existiram “falhas”, que “tiveram consequências e causaram esta situação”, levando-o a garantir: “Penalizo-me profundamente”, disse em conferência de imprensa, sem direito a perguntas.

Por outro lado, sublinhou que o erro “obviamente não mancha o trabalho longo, em conjunto com o primeiro-ministro, a caminhada que fizemos em conjunto para conseguirmos a liderança do PS, sob a sua liderança construirmos uma solução política inovadora na qual poucos acreditavam”, referindo que “este trabalho com o primeiro-ministro tem anos, é uma relação profissional e de amizade que obviamente não é manchada por um momento infeliz”, acrescentou.
Pouco mais tarde foi a vez de António Costa reagir, garantindo que “obviamente foi cometido um erro grave”, mas que “felizmente já foi corrigido”.

E apesar de Pedro Nuno Santos ser apontado como um dos sucessores de Costa a secretário-geral do PS, o primeiro-ministro deixou claro que o governante “não agiu de má fé e que teve a humildade de corrigir os erros”, garantindo que a confiança está totalmente restabelecida”.

E quanto à futura solução ou futuras localizações do aeroporto, Costa não hesita: a solução não está fechada, pedindo abertura aos sociais-democratas, argumentando que “soluções técnicas há muitas”. “Não vamos trabalhar só sobre uma solução. Estamos de espírito aberto. Não sou do Partido de Alcochete, do Montijo, de Alverca, de Sintra”. E foi mais longe garantindo que será o primeiro-ministro que definirá o caminho: “Quem define a orientação do Governo é o primeiro-ministro”, tendo desdramatizado a crise interna no Governo. “Está tudo reposto e nos devidos carris”.

Verniz estalou Pedro Nuno Santos chamou quarta-feira de manhã os autarcas das regiões abrangidas pelo aeroporto do Montijo para comunicar a decisão e à tarde com os diretores de comunicação social. O i sabe que Pedro Nuno Santos já tinha divulgado o seu plano a António Costa, mas quis antecipar a divulgação deste plano, por estarmos em vésperas de congresso do PSD, uma vez que, o governante entendeu que a falta de decisões e impasses de projetos iriam marcar o discurso do novo líder do partido, Luís Montenegro. “O ministro entendeu que ia ser o bobo do congresso do PSD e decidiu antecipar-se”, contou ao i fonte socialista.

A nova solução aeroportuária para Lisboa passava pela construção de um novo aeroporto no Montijo até 2026 e por encerrar o aeroporto Humberto Delgado, quando estivesse concluído o de Alcochete, em 2035. E atribuiu ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil a elaboração do Plano de Ampliação da Capacidade Aeroportuária da Região de Lisboa e respetiva avaliação ambiental estratégica, o estudo da construção do aeroporto do Montijo, enquanto infraestrutura de transição, e do novo aeroporto no Campo de Tiro de Alcochete. Nas várias entrevistas que deu entretanto foi categórico: “Já chega, já chega! O país anda há anos a discutir o aeroporto. Já é tempo de mais. Há uma decisão tomada e vamos avançar”.

Ainda antes de haver uma reação de Costa foi publicado em Diário da República um despacho assinado pelo secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Santos Mendes, sobre a “definição de procedimentos relativos ao desenvolvimento da avaliação ambiental estratégica do Plano de Ampliação da Capacidade Aeroportuária da Região de Lisboa”.

Um anúncio que não caiu bem ao primeiro-ministro que, esta quinta-feira, revogou o mesmo despacho. Em comunicado, António Costa reafirmou “que a solução tem de ser negociada e consensualizada com a oposição, em particular com o principal partido da oposição e, em circunstância alguma, sem a devida informação previa ao Presidente da República”. E acrescentou: “Compete ao primeiro-ministro garantir a unidade, credibilidade e colegialidade da ação governativa. O primeiro-ministro procederá, assim que seja possível, à audição do líder do PSD que iniciará funções este fim de semana para definir o procedimento adequado a uma decisão nacional, política, técnica , ambiental e economicamente sustentada”.

Situação fragilizada Esta polémica, de acordo com Paula Espírito Santo, especialista em ciência política, vai tornar Pedro Nuno Santos mais frágil. “Assistimos a uma desarticulação, a uma desautorização do primeiro-ministro e, de certa forma, um membro do Governo deixa de ter uma confiança política por parte de António Costa por ser desautorizado”, diz ao i. E mesmo mantendo-se em funções, admite que o ministro irá ver o seu poder político diminuído e as suas “decisões, a partir de momento, passam a ser muito mais descortinadas e com menos capacidade de vingar pontos de vista políticos junto dos seus parceiros e de todos aqueles com quem tem de negociar”.

Já quando questionada sobre o potencial interesse de Pedro Nuno Santos a vir a suceder a António Costa diz apenas: “Eventualmente poderia mostrar o seu interesse no discurso desta legislatura de acordo com o seu desempenho, mas não me parece perante o que aconteceu agora, que tenha o apoio legitimado por parte do primeiro-ministro”.