Euro-2022. As senhoras que avancem

Começou na quarta-feira a fase final do Campeonato da Europa, em Inglaterra. Portugal entra em campo hoje (17h) face à Suíça.

A Rússia, graças à sua intempestiva invasão da Ucrânia que meteu meia Europa numa camisa de onze varas e outra meia a assobiar para o lado, por mais que as televisões continuem a invadir-nos as salas com imagens de bombardeamentos, destruição e morte, na sua habitual exploração dos mais baixos sentimentos em relação à desgraça alheia, continua a dar brindes no desporto, expulsas que estão as suas representações das competições internacionais. Desta vez, foi Portugal a beneficiar do lugar que ficou em aberto na fase final do Campeonato da Europa de Futebol Feminino que teve início na passada quarta-feira, com a vitória da anfitriã Inglaterra sobre a Áustria (1-0), em Old Trafford, e inicia hoje a sua participação defrontando a Suíça pelas 17h de Lisboa (e de Londres, já agora), na Leigh Sports Village, também em Manchester. 

Não seria de esperar outra coisa: o Grupo C reservou para as jogadoras portuguesas berbicachos bastante bicudos, como são o caso da Holanda, a campeã em título (venceu a Dinamarca por 4-2 na final do torneio de 2017, disputado precisamente na Holanda, e finalista do último Mundial – perdeu por 0-2 frente aos Estados Unidos), e a Suécia (vencedora em 1984 e finalista em 1987, 1995 e 2001, somando-lhe uma final perdida do Mundial, em 2003, contra a Alemanha). Sobram as suíças que, tal como nós, estão pela segunda vez na fase final desta competição, o adversário de hoje, provavelmente aquele que poderá permitir alguma alegria suplementar, mesmo sabendo que em homens, por exemplo, a Suíça costuma dar-nos cabo da moleirinha com ainda recentemente aconteceu no jogo da Liga das Nações.

A evolução do futebol feminino tem sido notória. De tal forma que já este ano se bateu o recorde de assistências num jogo, o Barcelona-Real Madrid, em Camp Nou, que atraiu nada menos do que 91.553 espetadores, deixando para trás a final do Mundial de 1999, em Pequim, entre a seleção da casa e os Estados Unidos – 90.195, e nestas contas, como sabemos, nunca entram os borlistas que são mais que muitos. Esta é a segunda edição do torneio com uma fase final aberta a 16 equipas, bem longe, por exemplo, do que aconteceu em 1984, na primeira edição, em que só houve meias finais e final (a tal vitória da Suécia, no caso face à Inglaterra).

O poder alemão!
É natural que a Inglaterra surja nesta prova que organiza com ambições de fazer melhor do que o segundo lugar de 1984 e 2009 e que os terceiro de 1995 e os quartos de 1987 e 2017). Ainda por cima quando, há cinco anos (teriam sido quatro não fora a maldição universal da covid) esteve decididamente na luta pelo título quase até ao fim. A questão é que, quando falamos de Europeus femininos, é impossível esquecer o terrível poder da Alemanha. Ora tubérculos, que surpresa!, dirão os que têm a paciência de me ler. Não serei a contrariá-los. Com oito títulos conquistados (1989, 1991, 1995, 1997, 2001, 2005, 2009 e 2013), cinco dos quais consecutivos (só a partir de 2001 é que o Euro passou a disputar-se de quatro em quatro anos, até aí era de dois em dois), como não colocar as alemãs no topo da lista das apostas, logo em Inglaterra onde as apostas são um entretenimento nacional? Não há maneira. 

Há cinco anos, na Holanda, Portugal estreou-se numa fase final e ainda todos nos lembramos da festa que foi. Finalmente, as nossas senhoras (salvo seja, e com todo o respeito!) entravam no grupo das melhores do continente. À custa de um play-off – esta mania não cabe só na cabeça dos homens – viriam também (o ranking aqui dá ordens) num grupo complicado, com Inglaterra, Espanha e Escócia. O jogo histórico e inicial foi contra a Espanha, e também não poderia haver melhor adversário, convenhamos. No estádio De Vijverberg, em Doetinchem, uma natural derrota por 0-2 não deslustrou nem encantou. Era o que era e, vendo bem, é o que continua a ser. Ainda teremos de dar um passo de botas de sete léguas para nos podermos misturar com os melhores dos melhores, ou com as melhores das melhores, que vem mais a propósito. Uma vitória frente à Escócia salvou a presença lusitana – 2-1, golos de Carolina Mendes e Ana Leite. Finalmente, a despedida: face à Inglaterra – derrota por 1-2 e novo golo de Carolina Mendes.

É uma nova página em branco que se abre perante as portuguesas. Ninguém pode exigir-lhes mais do que a dignidade que tiveram na altura. Mas também, por outro lado, não há quem lhes possa travar o sonho de irem ainda mais longe do que as suas predecessoras. Francis Neto, o selecionador, comprova isso mesmo: «Já vimos equipas a empatarem os jogos todos na fase de grupos e a serem campeãs, felizmente. Tudo pode acontecer num Campeonato da Europa e cá estaremos para dar o nosso melhor e lutar até ao fim. Aquilo que podemos pensar, e é isso que passámos às jogadoras, é que queremos fazer melhor do que fizemos no último Campeonato da Europa». Hoje é o dia de cumprir essa vontade.