Novo aeroporto ainda sem destino

António Costa e Luís Montenegro reuniram-se, falaram sobre o novo aeroporto, mas, para já, sem decisão. Associações de turismo lembram que falta de solução é prejudicial para o país.

Por Sónia Peres Pinto e Daniela Soares Ferreira

As atenções estavam viradas para a reunião desta sexta-feira entre António Costa e Luís Montenegro para ver se era possível chegar a um consenso em torno do futuro do aeroporto de Lisboa. Depois de o primeiro-ministro ter recusado a solução de Pedro Nuno Santos e acenando com um acordo com o PSD, o encontro terminou sem solução à vista.

«Ficámos de voltar a falar sobre esse tema no futuro», foi assim que Costa resumiu a primeira reunião com o líder do PSD em São Bento. Já do lado social-democrata houve silêncio. «Sobre o aeroporto trocámos informações de que cada um dispõe e ficámos de voltar a falar brevemente sobre o tema. Luís Montenegro também está a fazer audições no PSD», disse o primeiro-ministro.

E deixou uma garantia: «Temos consciência da urgência de tomar uma decisão, mas não pode ser uma decisão apressada. É normal que o líder o PSD que entrou agora em funções queira recolher informação antes de avançar. Não procurámos chegar a um acordo. Informou-me do trabalho que está a fazer no PSD para ter posição mais consolidada sobre o assunto».

Recorde-se o que o novo líder da oposição já tinha afirmado que queria transmitir «em primeira mão» a posição do partido ao Governo, dizendo, no entanto, que a decisão cabe ao Governo. No entanto, o Governo de Passos Coelho defendeu a opção pela expansão da Portela e a construção de um aeroporto secundário na Base Aérea n.º 6 no Montijo. Solução que foi adotada também pelo primeiro Executivo de Costa, que em janeiro de 2019 assinou um acordo nesse sentido com a ANA, a concessionária, mas que acabou por cair por terra.

A CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, ainda esta sexta-feira, defendeu que qualquer decisão sobre a solução para o aeroporto de Lisboa será positiva para o país e para a indústria. «Penso que qualquer solução será positiva para a indústria e para Portugal», disse, acrescentando que «definitivamente gostaríamos de perceber como será o futuro», prometendo trabalhar «na implementação da decisão assim que a decisão for tomada». E disse ainda: «Confirmamos o nosso compromisso de fazer parte de qualquer solução e achamos que uma solução é importante para o país».

Uma posição que já tinha sido defendida por Francisco Calheiros, presidente da Confederação de Turismo de Portugal (CTP) ao defender que é preciso que seja tomada uma decisão o mais rápido possível e, caso contrário, e perante os atuais constrangimentos do aeroporto de Lisboa «a imagem de Lisboa poderá ficar comprometida». 

Aliás, de acordo com o último estudo avançado pela confederação, um adiamento da nova infraestrutura aeroportuária de Lisboa, corresponde a uma perda potencial de riqueza de 6,8 milhões de euros até 2027, de 27,7 mil empregos e de receita fiscal de 1,9 mil milhões de euros, no cenário mais otimista, que analisa a hipótese Portela +1, disponível em 2028.

‘Se não houvesse política, já havia aeroporto’

O Nascer do SOL tentou perceber qual a posição dos turismos sobre os atrasos e cancelamentos no aeroporto de Lisboa e sobre a nova localização. João Fernandes, presidente do Turismo do Algarve, recorda que em Faro não existiram cancelamentos significativos «até porque muitos destes atrasos e cancelamentos estão associados à TAP e a TAP, infelizmente, voa muito pouco para o principal destino turístico e nós não tivemos tanto esse impacto direto».

No entanto, existe o impacto que é a imagem do país. E, apesar de Faro não ter tido problemas de maior, «é importante lembrar que nós não vivemos isolados e, portanto, a realidade do aeroporto de Lisboa, que felizmente tem melhorado nas últimas semanas, não é pior do que aquela que temos em Schiphol, em Frankfurt, em Heathrow, em Madrid e em muitas outras realidades», diz João Fernandes, acrescentando que tem a ver «com o facto de as infraestruturas e os operadores aéreos terem sido talvez do setor no mundo mais afetado com a pandemia. Transportavam pessoas entre países, o que é natural que tenha sido mais afetado. Tiveram de fazer reduções drásticas de recursos humanos e agora a recuperação desses recursos humanos é muitíssimo mais exigente, sobretudo porque a retoma foi muito mais rápida do que os mais otimistas esperavam».

Mas lembra que o plano de contingência do ministério da Administração Interna «tem sido eficaz a retroceder este caos do aeroporto de Lisboa mas também a reforçar a capacidade do aeroporto de Faro, do Porto, dos Açores e da Madeira».

Por sua vez, Vítor Costa, diretor Geral da Associação Turismo de Lisboa e presidente da Entidade Regional do Turismo da Região de Lisboa, diz que o aeroporto de Lisboa «tem muitas deficiências que causam perturbação como já causou em anos anteriores também. Mas em cima disso temos uma situação que é internacional», lembrando que o mesmo aconteceu em aeroportos como o de Londres, Berlim ou Amesterdão.

«As situações misturam-se, sobrepõem-se mas não se pode dizer que é um problema português. A maior parte dos nossos turistas vem da Europa mas também têm mercados intercontinentais importantes mas os que veem da Europa vão para os outros locais e também sabem o que está a acontecer e não é um problema português ou de Lisboa e acho que isso não vai ter um impacto reputacional exatamente por não ser um problema só nosso. Mas é um problema».

E defende que o principal problema estrutural é em matéria de turismo. «O Aeroporto de Lisboa, segundo um estudo da Confederação do Turismo, 55% do turismo nacional vem pelo aeroporto de Lisboa. Esse é o principal problema que nós temos. Ele já devia ter sido resolvido. Não vale apenas agora chorar sobre leite derramado mas tem que se resolver o mais depressa possível», alerta, lembrando que existem tendências que ficaram da pandemia, como os nómadas digitais e que que Portugal e Lisboa são considerados um dos destinos mais interessantes para esse segmento.

Mas, para isso também é preciso as pessoas terem boas ligações aéreas. «É um dos fatores determinantes. O problema do aeroporto é o problema que nós temos no turismo», lembrando a análise da CTP em que fala das perdas por cada ano sem aeroporto. «Isso é, de facto uma urgência nacional», avança.

E, para Vítor Silva, presidente do Turismo do Alentejo, uma coisa é certa: o problema do aeroporto «é meramente político». E acrescenta: «Se não houvesse políticos, o problema do aeroporto já estava resolvido».

Na sua opinião, neste momento, há que construir alguma coisa que ajude a Portela. «E essa alguma coisa que ajude, durante algum tempo, só pode ser o Montijo? Não. Deem lá as voltas que quiserem, façam lá os estudos ambientais que quiserem, neste momento tem que se ter uma solução que pode ser provisória», diz, lembrando que, daqui a uns anos, o aeroporto do Montijo está debaixo de água. «Bem, nessa altura também o Terreiro do Paço está debaixo de água. Quando o aeroporto do Montijo estiver debaixo de água, a grande parte da baixa pombalina também está. É bom que as pessoas se apercebam disso. Mas esperamos que isso não aconteça». 

Ou seja, na sua opinião, o complemento  imediato só pode ser o Montijo mas a alternativa poderá ser outra. Beja? Não.

«Beja pode servir numa situação de emergência. Há charters a partir de lá. Mas o aeroporto de Beja só pode processar um avião por hora». Vítor Silva diz ainda que, para o aeroporto ser em Beja seria preciso construir um terminal, mas «também não há espaço para isso», sendo ainda necessária uma linha férrea. «O aeroporto de Beja tem outra vocação», defende.

Sobre os atrasos, Luís Pedro Martins, presidente do Turismo Porto e Norte diz que, «claramente» representam um problema e que «terá consequências a curto, médio e longo prazo, com menos turistas a viajarem para Portugal». E atira:

«Há muito que sabíamos que este problema nos ia cair nas mãos e agora está a acontecer. O aeroporto já provou este ano não ter capacidade para receber todos aqueles que o querem utilizar, todos os dias estamos a perder receitas».

Problemas que, no entender do responsável, «prejudicam fortemente a nossa imagem, pois nenhum turista gosta de ficar horas numa fila, nem ter voos cancelados». Avançando que «não existe uma segunda oportunidade para uma primeira boa impressão», no nosso caso, «tem-nos valido o facto de sermos um país fantástico,  ao qual alguns erros ainda são perdoados, mas isto é jogar um jogo perigoso, que põe em causa, a fidelização e a recomendação do destino».