CGD. “O Estado não pode assobiar para o lado e dizer que não se pode meter na gestão do banco público”

O presidente do sindicato dos trabalhadores do grupo CGD (STEC), Pedro Messias, dá cartão vermelho à administração liderada por Paulo Macedo ao entender que está a aplicar as mesmas regras da banca privada, mas aí também culpa o Estado por não colocar limites. Em causa está o encerramento de mais 23 balcões já este mês…

O STEC denunciou o encerramento de mais 23 balcões da Caixa Geral de Depósitos, durante este mês de agosto. O sindicato foi apanhado desprevenido?

Estes encerramentos já vão muito além do que estava previsto no plano de recapitalização da Caixa. O plano e, tal como a própria administração disse, foi cumprido com êxito, quer ao nível da redução do quadro de pessoal, quer ao nível de agências. O que está a ser feito agora é apenas aplicar num banco público diretrizes ou matrizes da banca privada. É contra isto que nos estamos a insurgir porque não sabemos as razões porque é que estas 23 agências estão a ser encerradas. Não sabemos se é por motivos financeiros ou se é por outros motivos, a administração lá terá as suas razões de o fazer. Mas concretamente não sabemos o seu motivo de encerramento.

As zonas afetadas serão essencialmente em Lisboa e Porto…

Em relação a estas 23 agências sim, mas o nosso receio é saber quantas mais poderão estar na agenda. Poderão invocar motivos ligados à rentabilidade e, ainda que seja ao nível urbano, ou seja, fundamentalmente em Lisboa e no Porto, a verdade é que não sabemos se tem mais alguns encerramentos no plano. E qual é a razão? Daí termos dito que estão a aplicar no banco público as matrizes da banca privada. 

A aplicação por parte do banco púbico das regras dos privados já é visível quando a Caixa apresentou os resultados referentes ao primeiro semestre. Em que um dos casos mais emblemáticos diz respeito ao aumento das comissões…

Sempre defendemos que a Caixa Geral de Depósitos, como banco público, deve e tem como obrigação apresentar lucros. Todos sabemos que os prejuízos que foram apresentados pela Caixa foram mais de índole política do que financeiro, até porque isso foi denunciado. Agora não entendemos qual é a razoabilidade desta decisão, principalmente quando a Caixa está a dar lucros. Está-se a colocar no mercado tal e qual como se fosse um banco privado. Entendemos que a Caixa tem obrigações, como banco público, de ter um comportamento completamente diferente, até porque não é lógico com aqueles lucros que apresentaram e onde até suplantaram todos os outros bancos privados estar a encerrar estas agências. Qual é a razoabilidade da decisão? É para ter ainda mais lucros? 

E quando continua a entregar dividendos ao Estado…

Claro, tanto que o Estado está a esfregar as mãos de contente. No entanto, também entendemos que o Estado tem de ter uma palavra a dizer. O Estado é o acionista único e o Governo como executante do Estado tem de ter responsabilidade, tem de apresentar responsabilidades ao país e às populações que vão ficar sem agências. Até se pode dizer que estes encerramentos estão a ser feitos ao nível das áreas metropolitanas, mas por exemplo, dentro das áreas metropolitanas há zonas que não estão no centro de Lisboa. É o caso, por exemplo, de Mem Martins, Pragal, etc. Qual é a razão da Caixa estar a sair de onde os outros bancos estão? 

A CGD está a apostar nos encerramentos em Lisboa e Porto porque já fechou os balcões no interior?

A questão continua a colocar-se. Será que as zonas interiores também estão no mesmo panorama? Será que se não forem rentáveis fecham? Fica aqui a dúvida, porque se a lógica é que se o balcão não é rentável então fecha-se, então tememos que o mesmo seja aplicado ao nível do interior. Na nossa ótica, a Caixa não deve estar no mercado do lucro pelo lucro. Para isso é que existe a banca privada. A Caixa tem uma função de banco público e tem uma função fundamental de coesão territorial e de coesão social. E essa coesão territorial e social só existe perante a sua presença junto dessas populações mais distantes. É precisamente para que não se sintam afastadas e abandonadas. Essa é uma das obrigações da Caixa Geral de Depósitos, assim como fundamentar o negócio que a privada não quer porque não é rentável – tudo bem porque tem os seus objetivos – mas a Caixa tem como obrigação injetar dinheiro na economia e pode fazê-lo através de empresas que são mais pequenas com três, quatro, cinco ou seis trabalhadores. É essa a sua função. 

Dar crédito a empresas que não têm acesso junto dos bancos concorrentes?

Exatamente, porque os outros bancos não lhes dão crédito porque entendem que é um negócio que não lhes interessa e é aí que, na nossa ótica, tem de ser a Caixa a atuar.

Teve informação do encerramento destes 23 balcões por parte da administração?

Tivemos acesso a essa informação de forma oficiosa. A administração não nos informou de absolutamente nada. Na verdade não tem essa obrigação legal, mas apesar de termos sabido de forma oficiosa não falhámos em nada.

Está a pensar em falar com a administração?

Não sei. Oficialmente não nos convocaram para dar essa informação, mas também estamos num período de férias. Mas é certo que as abordagens que temos tido com a administração têm sido muito poucas, temos é falado com alguns quadros intermédios. Aliás, tivemos uma reunião com esses quadros intermédios há cerca de um mês, onde perguntámos se estavam previstos fechos de agências e não nos disseram nada em relação a estes encerramentos.

Acha que há falta de sensibilidade por parte da administração liderada por Paulo Macedo em desempenhar as funções que estão previstas para um banco público?

A questão coloca-se de outra forma. Penso que seja difícil para quem tenha uma carreira na banca privada – como aconteceu com António Domingues que acabou por sair pelas razões que se soube – que desempenhe as suas funções de forma profissional, que tenha as suas competências, tanto que foi escolhido para exercer esse cargo, deixar de desempenhar essas competências que desenvolveu na banca privada. Vem para o banco público fazer o quê? Só pode vir fazer aquilo que sempre fez e que passa por aplicar os métodos que aplicava na banca privada. O mesmo acontece com Paulo Macedo. Se sempre esteve na banca privada vem para a Caixa fazer o quê? Vem fazer aquilo que sabe fazer melhor, aplicar o que fazia na banca privada e que lhe dava bons resultados. Não podemos espremer limões e esperar que apareça uma laranjada, como se costuma dizer. Aqui é a mesma coisa. Pomos uma pessoa da banca privada, cuja carreira foi feita na banca privada, fez tudo na banca privada, incluindo os méritos que lhe são reconhecidos, enquanto profissional competente então vem fazer o quê para um banco público? Aprender o que é um banco público? Não me parece lógico, foi escolhido precisamente porque tinha mérito. A questão que defendemos, enquanto sindicato, é que o Governo tem toda a legitimidade de fazer o que fez, mas devia dizer ao gestor que ‘os métodos que pode aplicar serão estes, mas sendo um banco público há limites até onde pode ir’. Mas isso é uma competência do Estado e este deve ter realmente uma palavra a dizer sobre isso. O Estado não pode assobiar para o lado e depois dizer que não se pode meter na gestão no banco. Isso não é verdade. O Estado é o único acionista da Caixa Geral de Depósitos. E mesmo que o Estado não se queira meter na sua gestão deve pedir justificações e deveria fazer uma carta de missão a pôr alguns limites. E face a isso, o que poderia acontecer é que o executante – neste caso Paulo Macedo – tenha toda a legitimidade de dizer ‘querem que faça isso, mas aquele local não vai dar lucro” e aí a responsabilidade é do Estado que deveria assumir: ‘Sabemos disso, mas assume-se que não se fecha aquilo’. Não me parece que seja isso que esteja a acontecer.

Tem falado na saída de mais de três mil trabalhadores nos últimos 10 anos…

Esse número já inclui também os trabalhadores que foram abrangidos pelo plano de recapitalização. O que está a acontecer em relação a esta matéria é que encerrando alguns bancos vamos assistir a um acréscimo de clientes para outros balcões e o que temos constatado é que a maior parte dos balcões já tem défices de trabalhadores. Se existe um aumento de fluxo de clientes e já estamos a assistir a isso por não haver trabalhadores suficientes nos balcões é que vamos assistir a uma perda da qualidade do serviço a ser prestado ao público. Se estamos a fechar agências então as agências mais próximas vão ser alvo de um aumento ainda maior de clientes e se o sistema já não está a funcionar bem então tememos que se vá degradar ainda mais o serviço que atualmente é prestado. Ninguém gosta de ouvir dizer que a Caixa Geral de Depósitos não está a prestar um bom serviço, como é lógico. Mas também é certo que estamos a assistir a um aumento do fluxo, os trabalhadores estão exauridos em determinados locais e é evidente que esta pressão tem de rebentar por algum lado. 

E estes trabalhadores destes 23 balcões vão ser recolocados? 

Queremos acreditar que sejam recolocados, claro que não irão todos para a mesma agência. Era o que faltava que a Caixa não tivesse garantido o posto de trabalho, mas por aquilo que já tivemos contacto ninguém vai sair. Vão ser recolocados em outras agências e desta forma o posto de trabalho destes trabalhadores está garantido.