Cap d’Agde. A capital dos naturistas e dos swingers no sul de França

Sem tabus e completamente a nu para quem quiser ver, Cap d’Agde recebe desde os anos 70 os turistas mais ousados do mundo. Seja nos clubes de swingers, nas festas da espuma, na praia ou no supermercado, aqui ninguém usa roupas. 

As praias do sul de França são destino turístico por excelência, mas na pequena estância balnear de Cap d’Agde não é o mar nem a areia que atrai os turistas. A quase 70 quilómetros de Montpellier, é ali que se vislumbra o maior resort naturista do mundo, onde a vida pode ser feita totalmente a nu: ir ao supermercado, beber uma cerveja na esplanada, passear junto à praia, ou frequentar uma discoteca.

Trata-se de uma cidade em pleno funcionamento para quem se sente mais livre e confortável despido. A Village Naturiste, como é conhecida, é devidamente vedada e acessível apenas através de dois portões, um para peões e outro para veículos, controlados por seguranças. Apesar de não ser obrigatório ser hóspede, não está aberta a visitantes ocasionais. A entrada é livre para os turistas com alojamento pago no recinto do resort. Quem vier apenas de passagem tem de pagar a entrada, cujo passe diário custa oito euros por pessoa.

Passando os portões, o nudismo é o grande chamariz das massas, para heterossexuais, gays, bissexuais, bonitos e feios, jovens, milfs, peludos ou depilados, tatuados ou com piercings. Em pleno verão na Europa, cerca de 50 mil turistas invadem a cidade. Este ano, depois de um período de grande restrição devido à pandemia, são sobretudo italianos e espanhóis que procuram libertar-se das roupas e dos preconceitos, como relata Fabrizio Roncone no Corriere della Sera. É um local que “une puro exibicionismo e sadomasoquismo, alegria, curiosidade e perversão, decadência, solidão abismal e transgressões contagiosas”, resume.

Desde a década de 1990 que Cap d’Agde ganhou uma reputação como um oásis para os libertários e swingers – adeptos de troca de casais. Apesar de ser uma estância balnear reúne quase todas as infraestruturas que se encontram na vida urbana: um banco, uma farmácia, lavandarias, um correio, vários supermercados, cabeleireiros, boutiques de roupa, restaurantes, discotecas, um cinema e até lojas de BDSM. Curiosamente, os funcionários dos mais variados serviços atendem totalmente vestidos a grande maioria que se exibe despida em todos estes espaços.
Não há outro lugar no mundo que se assemelhe a Cap d’Agde. A maioria dos resorts naturistas são retiros afastados das áreas urbanas. Por exemplo, em Munique, na Alemanha, a população pode circular nua desde que seja nas seis áreas designadas para esse efeito, que se inserem em parques e jardins isolados. Em São Francisco, nos Estados Unidos, até 2012, a nudez em público era totalmente legal e banal, mas acabou por ser banida por culpa do mau comportamento de quem alinhava nesta prática.

Contrariamente aos retiros naturistas que atualmente existem, Cap d’Agde é na sua génese urbana. Há cerca de 70 anos, era uma paisagem pontuada por pequenas casas de praia, cujo areal era já frequentado por um grupo reduzido de naturistas. Junto às praias, estava o terreno dos irmãos Oltra, moradores locais, que viram nesse fenómeno uma oportunidade de negócio.

Em 1956 deram uso ao terreno criando ali um parque de campismo naturista, que décadas mais tarde seria fator determinante para a explosão desta prática na região, impulsionada pelo plano de expansão do Governo francês para alavancar o turismo na região de Languedoc-Roussillon na década de 70. Atualmente, o mesmo local dá lugar ao Centro Naturista René Oltra, um alojamento de quatro estrelas.
Terá sido precisamente um dos irmãos Oltra a convencer as autoridades francesas a incluir nos planos de desenvolvimento da região um resort exclusivamente naturista em Cap d’Agde, tendo recebido essa designação oficial em 1973.

Com regras muito próprias, este não é um local onde os voyeuristas sejam bem recebidos. É estritamente desaconselhado tirar fotografias ou fazer vídeos e o uso de roupas dá direito a olhares de reprovação. Também é da etiqueta do resort que nas esplanadas, por uma questão de higiene, se use uma toalha ou outro tipo de roupa que evite o contacto direto com as cadeiras.

Há ainda restrições que procuram evitar excessos. Por todo o resort estão espalhados cartazes que alertam para multas pesadas aplicadas a quem praticar atos sexuais em público. 

Esta foi uma necessidade a partir dos anos 90, quando os swingers chegaram em grande número a Cap d’Agde, superando em número os naturistas tradicionalmente mais castos, que preferem não misturar o direito de se passearem como vieram ao mundo com as fantasias dos libertários sexuais. Uma das praias do resort foi batizada de Baía dos Porcos precisamente pela realização de orgias a céu aberto. Essa transição de paraíso nudista para capital do sexo não tardou em abrir uma rivalidade entre os dois grupos e foram essas atividades mais arriscadas e ilegais que levaram a que fosse necessário reforçar o policiamento. Contudo, Cap D’Agde passou a depender economicamente dos swingers. 

“Os swingers mantêm tudo a funcionar. Têm outra energia, atraem muitos curiosos” explicava um comerciante do resort ao “The Guardian”, em 2015. 

Entre as atrações, além de se contarem clubes de swing, bares e discotecas, as festas de espuma são dos eventos a não perder em Cap d’Agde. Com DJs e música, os turistas obrigatoriamente despidos aventuram-se pela espuma branca que cobre uma enorme piscina. “Umas férias em Ibiza parecem bastante inofensivas comparadas com estas festas”, descreve um guia online sobre Cap D’Agde.

Se durante o dia a nudez é quase obrigatória, com o cair da noite é possível ver roupas mais exóticas e carnavalescas, sobretudo no que se refere às mulheres. “É o triunfo de sandálias com salto e tiras, brincos fálicos e espartilhos com estampado de leopardo”, conta também Fabrizio Roncone para o Corriere della Sera, dando nota ainda de homens puxados por coleiras, casais de drag queens e uma explosão de cores que vão do batom azul claro às unhas pintadas de prateado.