Restaurantes recusam fechar mais cedo. “Seria catastrófico”, diz AHRESP

Ana Jacinto, secretária-geral da AHRESP garante que o setor está disponível para avançar com medidas para poupar energia, desde que isso não implique mexer nos horários de funcionamento, alegando problemas de tesouraria.

O tiro de partida foi dado pela Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) ao sugerir a redução dos horários extensivos de funcionamento no comércio e nos serviços. E apesar de não incluir diretamente a restauração defende que este deve ser um desígnio da maioria das atividades, deixando a porta aberta à restauração. Ao i, Carla Salsinha, presidente da União de Associações do Comércio e Serviços de Lisboa admitiu que os restaurantes poderão ter outros horários de funcionamento ou, até mesmo, fechar mais dias por semana, em nome da poupança de energia. 

Uma hipótese afastada por Ana Jacinto, secretária-geral da Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP). “Não nos podemos esquecer do que vivemos, viemos de dois anos difíceis, as empresas ainda não recuperaram. E, como tal, obviamente a conjuntura não é nada favorável a aplicar medidas que têm vindo a público, como a redução de horários ou a redução de funcionamento dos estabelecimentos”, diz ao nosso jornal. E não hesita: “Isso para nós é completamente inviável. Aliás, tivemos essa experiência durante a pandemia e viu-se no que deu, não estamos em condições para tomar medidas desse tipo”.

Ainda assim, a responsável admite que “é inegável que a procura neste momento é positiva do ponto de vista da hotelaria e de alguma restauração, em que as coisas estão-se a recompor”. Mas deixa um alerta: “Estamos a ser desafiados por uma série de contingências que não ajudam as empresas a terem margens de rentabilidade porque estamos a ser afetados pela inflação, pelos aumentos de preços, pelas subidas dos preços da energia e, mesmo com a subida da procura, não conseguimos repercutir os aumentos de preço de igual proporção e, como tal, as margens são muito mais reduzidas e vamos ver o que vai acontecer depois do verão”.

Esta hipótese de encerrar mais cedo já tinha recebido cartão vermelho por parte dos hipermercados e dos centros comerciais, tal como tinha sido avançado ontem pelo i. Para o diretor executivo da Associação de Centros Comerciais, Rodrigo Moita de Deus, “tudo o que seja tirar horas às lojas físicas representa transferir milhões para o comércio eletrónico”. Também o presidente da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED). Gonçalo Lobo Xavier, “ a redução de horários é uma ideia populista e não contribui para a redução do consumo”. 

Qual a solução? Para Ana Jacinto não há margem para dúvidas: “Há um grande caminho a percorrer para que haja programas de apoio à eficiência energética, seja gás, seja eletricidade”, considerando que “as empresas podem percorrer esse caminho se forem apoiadas”. E dá como exemplo, alguns projetos no passado que deram provas de utilidade/benefício.

“As propostas que devemos apontar e que o setor está disponível para acompanhar é no âmbito dos programas de eficiência energética que devem ser apoiados e implementados”, afastando de novo a hipótese de soluções como reduções de horário, o que no seu entender, “seria completamente catastrófico até porque a restauração funciona com horários alargados, não somos uma atividade que possa parar quando queremos”. 

A responsável lembra medidas como as que foram implementadas em 2017/2018, altura, em que estava disponível candidaturas relacionadas com temas para sistemas de refrigeração. “Nessa altura, quase a totalidade dos sistemas de refrigeração utilizavam motores elétrico convencionais, mas essa candidatura permitiu substituir esses motores pouco eficientes por outro tipo de motores mais eficientes, que se traduziram numa redução de consumos de energia”.

E face a esse cenário, Ana Jacinto garante que são medidas possíveis de implementar, “ao contrário de outras medidas que têm vindo a público porque afeta o funcionamento dos nossos estabelecimentos”. 

Para já, a AHRESP ainda não foi chamada ao Governo para apresentar propostas para reduzir o consumo de energia, apesar de estar disponível para responder a esse apelo. Mas volta a deixar o recado: “Não é a reduzir os nossos horários de funcionamento que ajudamos o país a poupar energia porque criamos outro tipo de problemas, outro tipo de constrangimentos e não nos podemos esquecer que estamos numa conjuntura difícil”.

E acrescenta: “É inegável o aumento do turismo, é inegável que estamos num momento positivo, mas também contamos com algumas adversidades e com uns desafios enormes que não nos permitem crescer aquilo que devíamos estar a crescer e depois acaba o verão e lá vêm os constrangimentos da sazonalidade e as dificuldades das empresas em se aguentarem porque não tiveram a tesouraria suficiente porque as margens estão muito esmagadas e muito reduzidas”.

Mas apesar de todos estes entraves, Ana Jacinto faz um balanço positivo do verão, reconhecendo, no entanto, que os incêndios em alguns territórios estão a ser muito preocupantes porque estão a afastar os turistas e há regiões que estão a ser muito afetadas, como é o caso da zona centro.

“Isso tem um impacto negativo, mas globalmente é evidente que o ano turístico está a ser positivo, mesmo com este constrangimento de as nossas margens não estarem a ser tão famosas quanto desejaríamos, porque apesar de ter havido um aumento de preços, não era possível não o fazer, não conseguiu compensar os custos porque as margens são sempre menores”. 

Poupança de energia. Outras medidas

A Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), a par da redução dos horários de funcionamento dos estabelecimentos, assim como desligar as luzes das mostras das lojas, mostrou-se também disponível para discutir outras medidas com o Governo com vista a contribuir para o Plano de Poupança de Energia.

Mobilidade, transportes e frotas

•  Apoio à renovação de frotas e incentivo ao abate de viaturas menos consumidoras de recursos. “Infelizmente e, ao contrário do que tem acontecido em muitos países europeus, não tem havido qualquer sensibilidade para a problemática, sendo esta uma oportunidade para se estudar formas de apoio a estes setores”, diz a confederação.

Formação e qualificação

•  Com o objetivo de promover a formação qualificada das empresas e colaboradores na área da sustentabilidade, criar módulos de muita curta duração que auxiliem as empresas no objetivo de adotar comportamentos mais sustentáveis. Em paralelo, a CCP defende que devem ser flexibilizadas as regras relativas a formação financiada de forma a poderem ser incluídos módulos sobre estes temas, nas ações a iniciar após o verão.

Informação e sensibilização 

•  Lançamento de campanhas de sensibilização que orientem quer empresários, quer consumidores, para este esforço coletivo.

•  A confederação defende ainda que seria importante que algumas entidades públicas, nomeadamente as entidades reguladoras, dispusessem de páginas online com informação relativa às melhores práticas ambientais nas empresas, podendo esta informação ser construída com o contributo das estruturaras associativas representativas dos vários setores.